- Como faço para contratar esse lado de forma exclusiva, assim você
não precisa ver o pau de mais ninguém além do meu? - Se inclinou atrás de
mim e beijou meu pescoço.
- O único pau que eu vejo com interesse é o seu. Esse aí é
profissional.
- Profissional minha...
- Arthur! - Cortei e ele só estalou a língua. - Esse homem é um
narcisista, acabou de me fazer retirar os pelos dele por photoshop e me tirou
do sério. Ele tem zero atrativo. - Beijei seu queixo enquanto ele abaixava a
tampa do meu notebook. - Já encerrou seu expediente?
- Finalizei as partes mais chatas, agora só preciso monitorar uma
questão até às dez da noite. E você? Tenho tempo o suficiente para fazer uma
massagem!
- Sem ciúme do pau alheio? - provoquei e ele bufou.
- Com muito ciúme do pau alheio. - Sorriu torto. - Vem, vamos
tirar um tempo antes do próximo round de trabalho.
Não esperava ter que ficar. Foi uma surpresa a tempestade de neve.
Não que tivesse olhado a previsão do tempo para os dias seguintes, no fogo
e empolgação de vê-lo, ignorei todos os contras de viver em um país que
nevava no fim do ano. Meu voo foi cancelado e sem previsão de
remarcação.
O tempo estava feio, não dava para ver nada do lado de fora e a
televisão mostrava o caos que a neve causou na cidade inteira e onde mais
estava naquele nível. Aquele friozinho dava uma preguiça tão grande que eu
não quis levantar mais depois que fomos para a cama, mas o acompanhei no
preparo do jantar. Arthur fez espaguete com o pacote de almôndegas
congeladas que compramos. Assou com molho e queijo, serviu um vinho
delicioso e comemos no chão da sala, assistindo filme.
- Eu amo massas e isso aqui está delicioso. - Soltei um gemido com
o queijo gostoso que ralou e colocou por cima. - Muito bom.
- Não se compara ao café que preparou. Amanhã eu quero de novo.
- Finalizou seu prato e pegou a taça de vinho, esticando as pernas na frente.
- Acho que você deve ficar aqui até o final da semana.
- Acho que está sendo presunçoso. - Mordi um pedaço da minha
carne.
- Acho que se o seu voo não for remarcado até quarta-feira, deveria
estender sua viagem até domingo. Não vai custar muito. - Terminei de
comer, deixando meu prato em cima da mesinha e ele me abraçou por trás.
- Fica comigo...
Soltei uma risada.
- Você é um manhoso quando quer algo. - Ergui meu rosto e lhe dei
um beijo.
- Sou manhoso, insistente e não vou parar até... conseguir. Fica
comigo.
Virei meu rosto um pouco e sorri.
- Eu vou ficar com você. - Garanti e ganhei um lindo sorriso de
volta.
Arthur não fazia ideia do quanto eu realmente queria ficar com ele.
Estava sendo uma menina sonhadora, que imaginava algo a longo prazo e,
para acalmar as batidas do meu coração e principalmente as borboletas
apaixonadas, decidi viver um momento de cada vez. Ele fechou os braços ao
meu redor, criando um casulo quentinho e eu não podia imaginar uma
maneira mais gostosa de começar a semana.
O tempo melhorou apenas dois dias depois e Arthur me fez ficar até o
domingo, disponibilizando seu jatinho para me levar de volta para Atlanta.
Ele tinha um jatinho. Mais CEO que isso só mesmo Christian Grey!
Inclusive, vimos o filme juntos e ele riu do começo ao fim. O senso de
humor dele me deixava maluca.
Nos despedimos aos beijos, com a promessa de que ele chegaria
sábado à noite, porque precisaria trabalhar cedo e ficaria até a segunda de
manhã. Seria apenas um dia, mas era muito melhor do que só vê-lo na outra
semana.
Voltei para casa e para minha rotina feliz. Até meu pai percebeu que eu
estava alegre, apaixonada, ele até me chamou de fofa. Arthur e eu nos
falávamos todos os dias. Não sabia se um dia chegaríamos ao nível de
compartilhar o nosso relacionamento com amigos e familiares, por enquanto,
estávamos em uma bolha e não queríamos sair dela. Antes de dormir,
ficávamos por chamada de vídeo até pegar no sono.
Eu também estava muito feliz porque tive trabalhos todos os dias da
semana, incluindo o nascimento de um bebê que me deixou muito
emocionada em fazer parte de um momento tão mágico. Tive um prazer
sobrenatural em editar as fotos, até comprei um mimo para os pais, que me
escolheram perante muitas empresas que eram melhores equipadas para
acompanhar um parto.
Se continuasse naquele ritmo, poderia abrir um escritório fora do meu
apartamento. Era arriscado no meu faturamento assumir um segundo aluguel,
mas queria tanto, que pensei em pedir para meu pai comprar o local que eu
vivia, porém, declinei logo que clareei meus pensamentos. Podia conseguir
sem a ajuda de ninguém.
Aproveitei que tinha dinheiro o suficiente para trocar meu telefone, fui
à loja e saí de lá com o novo aparelho, feliz como uma criança. Memória não
era o suficiente para mim, mas quinhentos gigabytes de espaço era um sonho
realizado. Voltei para casa bem tarde, depois de andar no shopping para
fazer umas compras necessárias, meus braços estavam lotados.
- Srta. Avelar? Chegou uma encomenda para você e eu recebi porque
o entregador insistiu muito. - Meu vizinho abriu a porta. Ele era bonito e
nunca o tinha visto antes.
- Você é novo aqui?
- Me mudei há duas semanas. - Abriu um sorriso.
- Seja bem-vindo e muito obrigada. - Apontei para a caixa e ele me
entregou.
Entrei em casa e do meu celular antigo, mandei mensagem para Érica.
Antes, ela faria uma festa sobre um vizinho gato, percebi que nem eu estava
alardeando muito. Só precisava comentar. Fechei a porta com um chute e
esperei o sinal de que ela havia trancado digitalmente, colocando a caixa na
mesa. Rasguei o papel em cima e precisei de estilete para rasgar o último
embrulho.
Minha irmã me mandou roupas íntimas e camisolas.
"Desfile com minha nova coleção na frente do seu boy gringo. Com
amor, sua irmãzinha favorita".
- Vaquinha. Ela sabe que é a favorita porque só tem ela... -
murmurei olhando as coisas e eram lindas. - Quando ela cresceu e passou a
criar tantas coisas? A garota não para. - Continuei falando sozinha.
Lavei algumas peças que gostaria de usar quando Arthur chegasse. Nos
dias que passei em sua casa, fiquei toda zoneada. Arrumada e bonitinha só
nos primeiros dias, com a intimidade da convivência forçada, meus cabelos
ficaram embolados no alto e usei as camisas dele porque não havia levado
roupa o suficiente.
Elaborei um cardápio por alto, para fazer compras e dei uma olhada
nos meus e-mails enquanto beliscava uns biscoitos. Eu cresci entre biscoito
e bolacha, meu irmão mais velho morria comigo, era uma guerra na mesa, na
ida para escola e cookies eram... cookies. Simples e sem problemas. Ele
podia ser de mil maneiras e receitas que seriam apenas cookies.
- O que está fazendo? - Érica me ligou.
- Respondendo e-mails. E você?
- Assistindo ao canal de fofoca.
- Eu dispenso, obrigada - resmunguei. Levou muito tempo, mas eu
não olhava nenhum canal de mídia. Nada. Não pegava revistas que falavam
dos famosos, inclusive rasgava a parte do jornal que era sobre esse tema.
Fui muito agredida pela imprensa, com coisas que saíam da minha mãe, mas,
houve um tempo que as fofocas do meu pai eram em maior quantidade.
Quando ele se envolveu com política, foi investigado por corrupção e
lavagem de dinheiro junto com meu tio. Foi um pesadelo. Sempre saía notas
me relacionando como a filha fora do casamento. Era horrível. No final,
papai provou sua quase inocência, não foi preso, meu tio sim e foi um
escândalo na família. Desde então, ler sobre minha família nos machucava
muito. A internet podia ser muito cruel também.
- Sei que você não gosta, por isso não te chamei para assistir.
Carick está em uma reunião por vídeo com seu homem e só queria te dizer
que a voz dele dá tesão.
- Você pode quase cutucar as estrelas, mas eu vou te quebrar ao meio
se ficar falando do meu... - parei de falar, limpei a garganta. - Do Arthur
assim.
Ele não era meu namorado. Nós deixamos claro um para o outro que
queríamos ficar juntos a longo prazo e que estávamos naquilo de cabeça, só
não demos rótulos e não falamos mais sobre nossa família. Eu passaria as
festas de fim de ano no Brasil, emendaria no aniversário do meu pai e depois
voltaria. Ele ia ficar com a mãe, irmão e sobrinha. Era muito cedo para
qualquer envolvimento familiar.
Érica me conhecia o suficiente para não insistir sobre rótulos, até
porque, ela e Carick foram morar juntos sem sequer ter uma definição. O
importante era o dia a dia, a companhia, conversa e mesmo nas noites que eu
estava exausta, Arthur foi doce, carinhoso e até bem safado, me fazendo rir
com suas pérolas e sentir saudade do seu corpo me aquecendo.
Como eu podia estar tão apaixonada assim?
No sábado, acordei cedo e arrumei o apartamento. Era a primeira vez
dele na minha casa e ao contrário da dele, não era grande e extremamente
luxuosa. Era agradável e bem confortável. Decorei cada cantinho no prazer
de deixar minha casa do meu jeito.
Deixei as luzes principais apagadas, acendi velas aromáticas, com as
luzes amarelas da cozinha acesas. Preparei salmão com acompanhamentos.
Infelizmente, ele não poderia provar o quão incrível era minha moqueca.
Fiz meu cabelo, usei um conjunto de lingerie vermelho e um roupão de
cetim azul escuro com renda. Quando me mandou mensagem informando que
o avião havia pousado e chegaria logo, disparei pela casa ajeitando o que
faltava. Mandei o código para liberar sua entrada e assim, subisse direto.
A batida na porta soou alguns minutos depois. O safado estava mais
adiantado do que previ. Abri a porta e parei sensualmente.
- Sr. Gostoso?
Ele soltou sua bagagem e me agarrou.
- Olá, minha Srta. Mais Bonita. - Me deu um beijo. Ah, como
estava com saudades!
Fechamos a porta e o puxei para o sofá.
- Você tem três opções, o que vai querer primeiro? Tour, jantar ou
eu?
Arthur sorriu bem maldoso, me puxando pelo laço do roupão.
- Sempre você em primeiro lugar.
Com mais um beijo, começamos a nossa noite maravilhosa. Acordei
assustada com um barulho no apartamento de cima e ergui meu rosto. Arthur
ainda dormia pesado, nu da cintura para cima, o braço no rosto e o outro, me
segurando. Meu estômago roncou de fome, porque comi pouco no jantar,
bebi mais vinho que meu peso suportava e ao dizer "vamos transar a noite
toda" para Arthur, ele levou no sentido real da palavra.
Olhei a hora e percebi que não tínhamos dormido muito. Devo ter
apagado antes de tomar banho, estava nojenta. Saí da cama de fininho, entrei
no chuveiro e reconheci o que não deveria reconhecer nas minhas partes
íntimas. Tentei me lembrar se tínhamos usado camisinhas, mas como estava
alterada pelo álcool, não lembrava direito.
- Merda.
Terminei meu banho com meu telefone vibrando, corri para o quarto,
desliguei a chamada e me vesti, saindo com cuidado para não acordá-lo.
Érica esqueceu que Arthur estava comigo e queria companhia para aula extra
de pilates. Tirei as coisas de café da manhã, pensando que ovos e torrada era
tudo que meu estômago podia suportar depois de tanto vinho. Sentia falta de
pão na chapa com café da padaria, mas isso era algo que não encontrava em
Atlanta, mesmo com tantos brasileiros.
Arthur saiu do quarto quando o cheiro da comida ficou forte no
apartamento. Ele estava de cueca e nada mais, não disfarcei meu olhar por
seu corpo. Alto e gostoso, eu não me importava em escalar e montar.
- Bom dia, baby. - Parou atrás de mim e beijou o topo da minha
cabeça. - Acordou muito cedo considerando a hora que fomos dormir.
- Estava bêbada e agora, com fome.
- Faz tempo que não bebo como bebi ontem. - Bocejou e pegou a
espátula, assumindo os bacons na minha chapa. - No entanto... acho que não
usamos camisinha.
- Eu também acho. - Não tive coragem de virar.
- Sinto muito. - Me abraçou apertado.
- Não tenho nada, não sou como essas mocinhas dos livros que anda
com um exame no bolso e imagino que você também não. - Olhei em seus
olhos e ele parecia bem, sem surtar.
- Sempre me previno, foi um descuido e peço desculpas. Eu sei que
não tenho nada porque a minha empresa pede esse tipo de exame e como não
faz muito tempo...
- Tudo bem. Eu acredito em você. - Dei-lhe um beijo.
- Você toma anticoncepcional?
- Sim... religiosamente. Sinto muita cólica menstrual, não tenho
nenhum problema, só meu fluxo que é longo e intenso, então, optei por
hormônios por mais que muita gente seja contra.
- Entendi. Estamos bem?
- Estamos ótimos. - Sorri.
Nosso café foi uma delícia e depois, ficamos no sofá. Ele me mostrou
uma foto da sua sobrinha brincando no quintal da casa de sua mãe, curiosa,
perguntei se tinha mais fotos da família. Ele mostrou a mãe, era uma senhora
muito bonita, conservada, bem mais velha que a minha mãe e madrasta.
- Esse é meu pai, madrasta e minha irmã. Quase não tenho fotos do
meu irmão porque ele foge delas como o diabo foge da cruz. - Entreguei a
ele um porta-retrato que ficava atrás do sofá.
- Você parece com seu pai, mesmo ele sendo alto e loiro. Ele é
brasileiro?
- De origem alemã. Martins Avelar é um sobrenome recente, o nome
da minha bisavó é complicado demais de pronunciar.
Arthur sorriu, me entregando a foto.
- Tem mais fotos da sua família?
Por alto, mostrei alguns primos pelo instagram, nos álbuns de família
do meu primo e ele achou a minha avó materna uma senhora linda e
conservada.
- Não tem muitas fotos com sua mãe?
- Na verdade, eu quase não a vejo e quando estamos juntas,
raramente tiramos fotos. Ela é muito ocupada. - Abri a gaveta do móvel
aparador próximo ao sofá e peguei uma foto que ficava ali. Guardei depois
que passei a me sentir desconfortável com ela pendurada na parede. - Essa
é minha mãe, fantasiada de madrinha de bateria, no último ano que desfilou.
Ela ainda é destaque na sua escola de samba. Ao lado dela, o marido. Ele
faleceu há dois anos.
Arthur pegou a foto e sua expressão mudou. Ele tirou minha perna de
seu colo e ficou em pé como um raio.
- Tudo bem?
- Você disse que esse homem é seu padrasto?
- Sim. Ele faleceu de infarto. Foi bem delicado porque o mundo
estava no auge do desespero da pandemia. Ele era fumante e diabético, não
resistiu - comentei e ele estava tremendo. - Arthur... o que houve?
Ele me olhou com raiva.
- Você não me falou que sua mãe era mulher do meu pai!
Me afastei um pouco.