Seu mundo ideal.
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Capítulo 3 Seu mundo ideal.

Parei perto da mesa que estava com as comidas e tirei meu celular da

bolsa para mandar uma mensagem para Aninha, uma das minhas únicas duas

amigas da época de escola, para saber se ela já estava vindo. Não queria ficar

ali sozinha. Mariana, a terceira integrante do nosso trio, estava fazendo um

intercâmbio e, para a própria sorte, não tinha como comparecer aqui hoje.

Depois que a escola acabou, nossa amizade permaneceu. Infelizmente não

tínhamos mais tanto contato quanto antigamente devido a vida corrida de

cada uma. Mas sempre que possível, a gente marcava de sair para fofocar e

matar as saudades.

― Maya, querida, que bom que você veio. ― uma voz irritantemente falsa

soou atrás de mim. Eu sabia quem era mesmo antes de me virar para ver o

rosto da pessoa.

― Oi... ― respondi secamente. Uma mensagem de Aninha apareceu na

tela dizendo que estava atrasada. Como sempre.

― Sou eu, Lívia Motta, lembra? ― como se eu pudesse esquecer. ― Uau,

você está tão diferente. Seu cabelo está... bem cuidado. E você não usa mais

aqueles óculos também, né? Você tinha uma carinha de nerd fofa com eles.

― nerd fofa? Ela vivia me chamando de fracassada de quatro olhos. Que

falsa!

― E você está... a mesma Lívia de sempre.

― Ah, obrigada, querida. ― não tinha sido um elogio. ― Mas olha, eu já

estou até com algumas rugas na testa. ― ela disse apontando para o próprio

rosto. Eu não poderia me importar menos. ― Me conta o que você anda

fazendo? Nunca mais ouvi falar de você.

― Eu me formei em Artes Cênicas e segui carreira de atriz. Eu estou

dan...

― Atriz, hein? Engraçado, nunca te vi na TV. Mas também essa rotina de

médica, sabe como é. Muito puxada. Fica difícil eu ter tempo para assistir

novelas, filmes, essas coisas fúteis.

― Eu não acho que a arte seja futilidade. Você teve uma fase que queria

ser atriz também, né? Por que você desistiu mesmo?

― Ah, eu não quis dizer isso. Eu... ― mas antes que ela inventasse uma

desculpa qualquer para não responder a minha pergunta, que eu sabia que

tinha a irritado, um homem alto, forte e muito bonito se aproximou de nós

duas.

― Sua bebida, meu amor. ― ele lhe entregou um copo e deu um beijo de

leve nos seus lábios. ― Acho que não nos conhecemos, eu sou o Pedro. ― o

homem disse estendendo a mão para que eu apertasse. Droga, ele ainda era

simpático. Ela não merecia esse cara. Ou melhor, ele não merecia alguém

como ela. Uma bruxa.

― Sou a Maya.

― Mais uma de suas amigas de infância? ― ele perguntou para Lívia.

― Não exatamente...― Respondi.

― O Pedro é o meu namorado. ― ela me interrompeu. ― Ele é

anestesista. Estamos juntos desde a faculdade, né Pedrinho? ― ele assentiu.

― E você, Maya? Está namorando?

Eu tenho muito orgulho do que eu me tornei. Me formei em uma das

melhores universidades do Brasil, trabalho com o que eu amo e consigo me

sustentar muito bem sozinha, mesmo a arte sendo tão desvalorizada. O fato

de não ter um namorado nunca me incomodou. Quer dizer, eu já namorei

antes. Porém, nesse momento, eu estava passando por uma fase de

autoconhecimento. Pelo menos era o que eu dizia para as pessoas. Mas,

naquele momento, totalmente tomada pela raiva e, talvez, pela inveja, o que

saiu da minha boca foi outra coisa.

― Claro que sim. Ele ficou tão arrasado que não poderia vir hoje. Mas,

sabe como é, trabalho...

― Que pena. Eu adoraria conhecer o sortudo que roubou o coração da

nossa Maya. Nunca vi você com um namorado na nossa época de escola. Eu

o conheço?

― Não. ― respondi, mais rápido do que deveria. Alguém, por favor,

me tira daqui!

― Eu quero ver uma foto dele. Cadê?

Ai. Meu. Deus. Eu estava tão ferrada, por que tive que abrir minha

boca? O que eu responderia para ela? De repente, uma ideia maravilhosa

surgiu na minha cabeça. Certamente vinda direto dos céus. Não tinha como

dar errado. Peguei meu celular da bolsa e entrei no Instagram do Ramiro. O

irmão dele não morava no Rio há anos, não tinha como os dois se

conhecerem. Era o plano perfeito. Ele tinha vindo para o Rio alguns meses

atrás, nas férias, e Ramiro tinha feito vários stories com ele dos passeios que

fizeram. Obrigada Ramiro por ser adepto da exposição nas redes sociais. Fui

até o destaque nomeado "Férias" e comecei a passar as fotos até achar uma

dos dois juntos. Coloquei meu dedo na tela para pausar na foto que eu queria.

― Esse é ele. O da direita. ― apontei mostrando a tela do celular para

ela.

― Ai, nem dá pra ver direito. Me dá isso aqui. ― Lìvia tomou o

celular da minha mão. Abusada.

― Nossa, Maya! Você se deu bem. Como você conseguiu conhecer

alguém como ele? ― o tom da sua voz era de incredulidade. Eu não achava

o irmão de Ramiro tão bonito assim, mas...

― Esse não é aquele lutador de MMA? Arthur Birkman? Já assisti

algumas lutas dele. O cara é foda! ― Pedro comentou olhando a tela do

aparelho. Espera. O QUÊ? Puxei o celular da mão de Lívia. Ah, não! Parece

que tinha como dar errado sim. Aquela definitivamente não era a foto que eu

tinha selecionado para mostrar a ela. Mas, na hora que ela pegou o celular da

minha mão, acidentalmente pulou de um story para o outro. A foto que

aparecia na tela era de um Ramiro muito feliz ao lado de ninguém mais

ninguém menos que o gostoso do Arthur em uma das lutas que ele assistiu

com o irmão nas férias. ― Como vocês se conheceram?

― A gente... ― eu era atriz. Eu tive aulas de improviso. Eu

conseguiria me sair bem dessa. ― O Ramiro, meu colega de quarto,

apresentou nós dois. Ele trabalha no meio esportivo. Marketing de empresas

de esporte, sabe como é. Você é fã de MMA? ― ai meu Deus, Maya. Cala

sua boca!

― Eu sou um cara mais do futebol, mas tenho amigos que curtem

MMA e, algumas vezes, nos reunimos para assistir algumas lutas na casa de

um deles. É nossa versão de reencontro de amigos do ensino médio. ― ele

disse rindo.

― Eu tive uma ideia! ― Lívia exclamou. ― Por que a gente não

marca de jantar todo mundo junto lá em casa um dia desses? Eu vou adorar

reviver nossas lembranças da época de escola, Maya.

― Eu posso chamar meus amigos também. ― Pedro parecia

realmente animado. ― Eles vão adorar conhecer The Wolf pessoalmente.

― Não sei, Lívia. A agenda do Arthur é muito complicada, com os

treinos e tudo mais.

― Ah, para com isso. Até parece que ele não vai querer satisfazer os

desejos da namoradinha. Bom, eu tenho seu número de telefone salvo. Você

conversa com ele e a gente marca uma data. Vou te mandar uma mensagem

durante a semana.

― Já avisei no grupo de WhatsApp dos meus amigos. Eles estão

empolgados! Esse jantar vai ser topzera. ― Pedro disse.

Eu estava muito, muito ferrada.

― Ah, olha. A Aninha chegou. Ela deve estar me procurando. Vou lá

falar com ela. Nos vemos no nosso jantar então. ― me despedi correndo

antes de falar mais alguma coisa da qual eu me arrependesse depois. Lívia

nunca deixaria aquele assunto morrer. Ela iria querer de todas as formas

conhecer meu namorado. Ainda mais agora sabendo que ele é famoso. E eu

queria muito, muito mesmo, esfregar meu namorado gostoso na cara dela.

Então, fiz a única coisa que me cabia fazer naquele momento. Abri o

Instagram do Arthur e comecei a lotar a sua caixa de mensagem.

@mayamoura: Oi, Arthur! Eu sou a Maya. Vc quer ser meu

namorado fake?

@mayamoura: Me nota pfvr, eu to desesperada!!!!!!!!!

@mayamoura: Eu meio que disse pra minha rival da época escola

que a gnt namorava e agora ela e o Pedro querem fazer um jantar pra

nós dois (e uns amigos do Pedro rsrs)

@mayamoura: O Pedro é o namorado dela, ele é anestesista e mto

lindo

@mayamoura: Eu não poderia ficar por baixo, me entende? Eu

odeio aquela vaca!

@mayamoura: Vc deve tá me achando bem doida, mas eu não sou

@mayamoura: Talvez só um pouco

@mayamoura: PELO AMOR DE DEUS ME NOTA EU PRECISO

DA SUA AJUDA!!!

ARTHUR

― PORRA, ARTHUR, DE NOVO? ― Henrique entrou na academia onde

eu treinava por 7 horas por dia, todos os dias, na preparação da minha estreia

no UFC. ― Sua sorte é que eu sei que se te der um soco, quem vai sair

perdendo é a minha mão!

― Calma, brother. Eu não sei do que você tá falando. ― respondi, me

afastando do saco de pancada onde eu treinava alguns socos e chutes.

― EU TÔ FALANDO DESSA MERDA AQUI! ― ele esticou o celular

na minha direção. Na tela, uma página de fofoca do Instagram mostrava uma

foto minha de duas noites atrás com duas mulheres nos meus braços.

― Não tem nada demais nessa foto. As duas estavam comigo por livre e

espontânea vontade...

― E A PORRA DESSE PRINT, BIRKMAN? ― Henrique gritou mais

uma vez. Peguei o celular de novo e vi o print da noite anterior quando uma

das garotas da foto tinha entrado em contato comigo pelo WhatsApp

perguntando se iríamos nos ver de novo.

― Quê? Eu fui simpático E sincero. "Poxa, gatinha, apesar de ter gostado

da nossa noite de ontem, eu não durmo com a mesma garota duas vezes pra

não dar a ela falsas esperanças. Mas foi bom te conhecer". Viu só? ―

Henrique bufou do meu lado.

― Você agora está no foco, Arthur, porra. Você é o campeão mais rápido

da história do TUF e as todas expectativas da sua estreia estão lá no alto. A

divulgação dessas fotos e desses prints já me fizeram ter que aturar duas

horas de vídeo chamada com o representante da Whey Suplementos e da

Everlast. DUAS HORAS!

Eu me senti culpado. Duas horas de vídeo chamada com o representante

chato pra porra da Whey Suplementos era o mesmo que tortura. O cara era

um mané. Ele reclamou da foto que postei como publicidade dizendo que "o

foco estava muito em mim e não no produto". O Instagram era meu, caralho.

As pessoas entravam ali porque queriam me ver, pra ver foto de shake de

suplemento elas pesquisariam no google, porra. Ele precisou dar o braço a

torcer quando minha foto bateu 150 mil likes em algumas horas. Os homens

curtiam porque queriam ser como eu e as mulheres porque obviamente

queriam sentar na minha cara.

― Aparecendo em Instagram de fofoca, Birkman? Que nível baixo. ― o

filho da puta do Renan implicou, do outro lado da academia.

― Controla a inveja, parceiro. ― retruquei. Eu odiava que Henrique

precisava aturar esse boçal. A nova agora era que na verdade ele não era um

lutador ruim, ele só demorou a descobrir que era um boxeador e precisava

investir mais para as próximas olimpíadas. Olimpíada é o caralho.

― Arthur, foca aqui. Ignora o babaca do Renan. ― Henrique pediu.

― Porra, Henrique, o que você quer que eu faça? Já vazou, não tenho o

que fazer.

― Quero que você tente ser menos imbecil. Sei que é difícil, mas se

esforce, pelo menos.

― Sua sorte é que você é meu empresário e meu amigo, se não fosse por

isso, já teria te arrebentado pelo tanto que você me irrita às vezes. ―

Henrique riu e se aproximou mais. Ele abaixou a voz e falou para que só eu

ouvisse:

― Eu recebi um contato de dentro do Plurishow. ― ergui meu olhar,

assustado. Agora ele começava a falar a minha língua. Plurishow era um

canal à cabo focado em esportes, com os maiores apresentadores esportivos

do país. ― Eles estão desenhando um projeto de quadro pro Esporte da Vez,

o programa principal de sábado.

― Eu sei o que é Esporte da Vez, porra. Desembucha logo. ― interrompi,

ansioso.

― A ideia deles é um quadro chamado "No Octógono", pra comentar as

lutas de MMA. Eles querem dois apresentadores fixos e alguns convidados

variáveis. ― eu engoli em seco. ― Eles entraram em contato comigo para

sondar se você teria interesse.

― Você respondeu que sim, né? Sim pra caralho? ― perguntei, quase

desesperado com a oportunidade. Henrique assentiu.

― Claro. Mas o quadro estrearia só daqui há uns 3 meses. Eles disseram

que vão te observar até lá.

― Fodeu. ― respondi simplesmente.

― Agora você entendeu porque não pode ficar aparecendo em Instagram

de fofoca todo dia? ― fiz que sim com a cabeça.

― Vou fazer o possível.

― Você tem sua estreia no UFC em um mês. E vai ser aqui no Rio. Foca

nisso e chega de mulher toda noite, Arthur.

― Aí você está começando a pedir demais, Henrique.

― Pelo amor de Deus, tenta só ser mais discreto, por favor.

― Isso eu posso fazer. ― sorri e me concentrei em voltar a socar

imaginando a cara do Renan naquele saco de pancadas.

            
            

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