Já estava na rua há algum tempo, já sofri todo tipo de humilhação, as pessoas me tratavam com desdém e, por ser ainda jovem, me olhavam com preconceito, julgando-me um preguiçoso, pois mesmo cheio de forças, preferia pedir a trabalhar. Ninguém queria saber que já fui criança ou um jovem sonhador que, assim como a maioria, queria ter sucesso e não viver de favor.
Martinha foi uma das poucas pessoas a me olhar diferente, lembro-me da primeira vez que chegou com sopa e um cobertor quente. Apesar de ter um sorriso iluminado, eu percebi seus olhos cansados, assim como meu falecido pai os tinha. Observei suas mãos calejadas e me lembrei de minha mainha trabalhando na casa de farinha. Chorei ao me lembrar dos dois, chorei ao ser tratado decentemente e, diante do meu choro, Martinha me abraçou e eu desabei ao me sentir gente novamente. Aquele primeiro contato foi o marco do meu dia, pude conversar com alguém e contar sobre minha vida. Não é qualquer um que consegue ficar perto de nós e aguentar o nosso cheiro.
Existem, sim, os que desviam o olhar por desprezo, pois se sentem superiores a quem está passando dificuldade. Existem aqueles que não olham para não se sentirem mal diante da impotência de nada fazer. Às vezes, esmola não é tudo, um sorriso amigo e um bom ouvido são de graça e nos ajudam a superar a nossa desgraça.
Martinha era diferente, assim que me deixou mais calmo, foi oferecer carinho a outro indigente. O que não faltava em cidades grandes eram mendigos e convalescentes, todos esperando um pão e um tratamento decente. Martinha era meu anjo e, por saber que ela era assim com todos e não apenas comigo, me apaixonei perdidamente. Nunca diria isso a ela, contentava-me em admirá-la de longe, só desejava que fosse feliz e bem tratada como merecia.
Nem sempre eu a via, às vezes por causa do seu trabalho, às vezes porque ela saía, mas me contentava com a lembrança do sorriso que à noite me fazia companhia. Depois de sua primeira visita, minha vida não foi mais a mesma, até as noites frias passaram a ter certa beleza. Envolto em seu cobertor, eu me sentia amado, mesmo não sendo como queria. Assim passaram-se os meses, eu sofrendo de amor, mas feliz ao menos por ela existir.
Apesar do que as pessoas pensam, nós não ficamos parados no ponto esperando a sorte chegar, tentamos todos os dias, seja um trabalho ou um trocado, nós corremos atrás. Aquela noite, depois de voltar para casa, cansado e desanimado, eu não encontrei os meus cobertores. Nós respeitamos o território um do outro, com certeza foi alguém de outro bairro que os levou. Justo naquela noite fria e que anunciava chuva. Não tinha jeito, não podia me lamentar, restava apenas viver e esperar pelo dia seguinte para tentar resolver. Peguei algumas caixas de papelão, estiquei-as no chão e me cobri com alguns jornais. Aquela noite eu não teria os macios cobertores da minha amada.
Acordei com a chuva forte, tremia de frio e o jornal estava ensopado. Chuva de açoite não respeitava morador de rua. Limitei-me a encostar na parede e abaixei a cabeça entre os joelhos, assim a chuva não machucava o meu rosto. Tremi de frio por longos minutos, até que senti uma proteção sobre mim. Levantei o olhar e vi Martinha. Ela estava linda, de salto, toda maquiada e com uma roupa que não combinava com um tempo tão frio.
- Vamos, Júlio, levanta daí, senão vai pegar um resfriado. - Estendeu-me uma das mãos, enquanto segurava o guarda-chuva sobre nós.
Levantei-me sem graça, ela colocou uma das mãos sobre meus ombros e me guiou até uma pequena casa que ficava em uma vila transversal a uma das ruas principais daquele bairro. Alguma coisa ali me lembrava da roça onde cresci. As casas eram todas pequenas, mas tinham flores e hortaliças plantadas nos passeios. A casa de Martinha era vermelha com janelas brancas, tudo bem simples, mas com muito capricho. Mesmo debaixo de chuva, algumas pessoas colocavam as caras nas janelas e logo depois se recolhiam.
Assim que ela abriu a porta, eu tremi, emocionado. Não me lembrava de ter entrado numa casa desde que fui parar nas ruas. Já limpei algumas, mas só a varanda, a área de serviço e a dos cachorros, nunca entrei numa casa, de fato. As pessoas tinham medo de serem estupradas, assaltadas ou sei lá o quê. Num mundo sem leis e cheio de bandidos, eu não as culpava, mas esse criminoso também poderia ser o vendedor, a faxineira ou até mesmo o entregador de gás. Mas eles não moravam na rua e nem comiam do lixo, tinham credibilidade.
- Tudo bem, pode entrar, vamos! - Martinha tinha uma sensibilidade imensa.
Eu entrei, ela fechou a porta e encaminhou-me para o banheiro. Comecei a chorar, não era possível que uma pessoa confiasse em mim daquele jeito. Ela me abraçou por trás, ficou assim por longos minutos, até eu parar de soluçar. Depois, praticamente me empurrou para o banho. Tirou minhas roupas, puxou a cortina e ligou o chuveiro no quente.
- Júlio, pode ficar à vontade, tá? - Soltou os meus cabelos. - Aqui tem xampu, condicionador, sabonete. Pode usar tudo, a quantidade que precisar, sem cerimônia.
Assim que ela saiu, tomei um banho muito demorado, usei quase todo o seu xampu, meu cabelo realmente precisava. Penteei os cabelos e prendi com um elástico, estava sem dinheiro para cortá-los, estava sem dinheiro até para comer! Achei uma tesoura e aparei a barba, não iria usar a sua lâmina, porque aí já seria abuso. Enquanto me aparava, senti um cheiro delicioso. Meu estômago roncou. Vesti as roupas às pressas, não era mal-educado, mas só quem vive nas ruas sabe o valor de uma comida, ainda mais quentinha.
Ela bateu à porta assim que acabei, nem esperou eu responder e entrou. Ficou parada, me olhando como se nunca tivesse me visto, depois falou rápido:
- Oxe, tire essas roupas molhadas, senão vai gripar! Aqui ó, trouxe roupa limpa pra você.
Saiu com a mesma rapidez com que entrou. Peguei as peças e fiquei olhando, aquilo não era roupa decente para ficar na frente de uma moça. Uma camiseta e uma samba canção, só. Vesti meio a contragosto, não estava à vontade, mas era enxuta e cheirosa, bem melhor do que a minha.
- Vamos, Júlio, a sopa vai esfriar desse jeito!
Saí logo do banheiro antes que ela me arrancasse de lá. Antes de alcançar a cozinha, já sentia o aroma que tomava conta de tudo. Sentei na cadeira que ela me indicou e tomei a sopa numa velocidade não muito educada. Ela não pareceu ofendida, simplesmente encheu outro prato e eu tomei esse com mais calma, saboreando cada tempero. Comi o pão, tomei o suco. Um verdadeiro jantar de rei.
- Sua comida é muito gostosa! - elogiei, com sinceridade.
- Sou merendeira de escola, cozinho para um batalhão, tive que aprender na marra. - E abriu o sorriso mais lindo do mundo. - Obrigada!
Quando acabamos, lavei os pratos contra a vontade dela, no mesmo momento que ela colocava minhas roupas na máquina.
- Como vou pra casa desse jeito? - Apontei para as peças que usava.
- Oxe, e quem disse que você vai sair debaixo desse dilúvio? Vai dormir aqui, hoje. - Olhou-me, mandona. - Amanhã a gente resolve as coisas.
- Eu não quero abusar, Martinha, já está sendo boa demais comigo.
- O quê? Um prato de sopa não me faz uma pessoa melhor que as outras, não - respondeu, sem graça. - Já, já, ajeito o sofá pra você.
Como se não bastasse tudo o que já havia feito, ela me deu uma escova de dentes e um fio dental. Quando saí do banheiro, o sofá estava forrado e com travesseiros e um cobertor à minha espera.
- Como já disse, fique à vontade - falou, entrando no banheiro. - Vou tomar um banho e me preparar para dormir que já está muito tarde.
Martinha foi para o banho e eu, para o sofá. Pouco tempo depois, ela apareceu e deixou o cheiro de sabonete no ar. Seus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo, alguns cachinhos caindo na nuca e uma camisola verde que desenhava suas belas e fartas curvas. Eu era mendigo, mas era homem. Aquilo me deixou eriçado. Ela foi até mim, debruçou-se e me deu um abraço de boa noite. Eu levantei para corresponder, mas me arrependi quando a vi se afastar diante de minha evidente ereção.
- Me desculpe, Martinha, eu não sou um tarado - falei, já me encaminhando para a área de serviço e puxando minhas roupas do varal. - Eu tô indo, desculpas mais uma vez.
Martinha puxou as roupas da minha mão e colocou-as de volta onde estavam.
- Olha, você é homem, eu sou mulher e nós dois, pelo jeito, gostamos da fruta um do outro.
- Você não tá com raiva ou medo de mim?
- Hum-hum! Agora vai dormir, vai!
Ela trancou a área de serviço e foi para o quarto. Fiquei deitado no sofá, o cansaço tomou conta de meu corpo, sentia minhas pálpebras pesadas. Estava prestes a pegar no sono quando Martinha saiu do quarto para a cozinha e voltou com um copo de água.
- Não tá sentindo calor, Júlio?
Eu balancei a cabeça em sinal negativo, na verdade, eu estava sentindo frio. Tremia muito, mesmo debaixo da coberta. Ela colocou a mão em minha testa para ver se eu estava com febre.
- Você está bem, sem febre nenhuma, deve ser a chuva lá fora. - Embrenhou-se debaixo de minhas cobertas. - Venha aqui que eu vou te aquecer, venha.
Martinha me abraçou e um calor começou a surgir entre minhas pernas, ela não se importou, pelo contrário, começou a me acariciar. Eu não queria ser desrespeitoso, principalmente com quem tanto me ajudou, mas aquilo era demais para mim. Eu sentei no sofá, puxando-a para o meu colo. Ela rebolou em meu quadril, pedindo que eu a penetrasse. Não fazia sexo há mais de dois anos e aquela mulher merecia algo bem feito, mas eu sentia que não demoraria a gozar.
Arranquei sua camisola e pude ver e sentir aquele corpão maravilhoso. Coloquei um dos seios em minha boca e percebi a firmeza de sua excitação. Ela jogava a cabeça para trás, mostrando-se bem à vontade e louca para que eu a preenchesse. Beijei sua boca carnuda enquanto segurava a sua nuca, desci minhas mãos pelas suas costas macias até chegar à sua bunda redonda e firme, levantei-a e me encaixei em suas entranhas. Ela gemeu, excitada, e começamos a nos unir, freneticamente. Nossos sexos se chocavam com uma ânsia desenfreada. Deitei-a no sofá sem nos desencaixarmos um minuto sequer. Penetrei-a cada vez mais fundo, enquanto olhava em seus olhos brilhantes. Eu era um homem apaixonado e estava dentro de uma mulher vibrante e linda sob todos os aspectos. Não aguentei, fechei meus olhos e explodi em um gozo maravilhoso. Só parei quando Martinha me perguntou se estava tudo bem.
- Júlio! Júlio! Acorda!