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Alex
― Está tudo bem mesmo? – Ricardo perguntou ainda olhando na direção por onde a garota sumiu.
Olhei para o meu segurança, e amigo, e respondi:
― Sim. Era só uma fã. Um pouco estranha, mas apenas uma fã. – me sentia chateado por ter sido tão frio com alguém que apenas me admirava. Tudo por culpa de Gabriela que não perdia uma oportunidade de me atormentar. Se ela não tivesse me deixado tão transtornado as minhas preces seriam suficientes para acalmar o meu coração.
― Estranha mesmo. Parecia um bichinho do mato assustado diante de pessoas da cidade. – Ricardo se mostrou um pouco arrependido de ser tão bruto com ela. Já estava acostumado a ter que usar um pouco de força para afastar fãs mais afoitas, pois em alguns casos elas vinham para cima de mim com tanto desespero que eu até saia ferido.
― Deve ser alguém que nunca saiu dessa cidadezinha. Sem contar que você assusta qualquer um. – ri observando o quanto meu amigo poderia se assemelhar a um gigante.
― Nem tanto. Em muitos casos sou mais encantador que assustador. – ele brincou.
- E eu não sei? Acompanho as notícias sobre as suas conquistas "deus de ébano". – rimos ao mesmo tempo.
Ricardo era quase um sócia do The Rock. Parecia que só de entrar na academia já criava músculos.
― Mas por que veio? Não devia estar com Gabriela? – questionei ao lembrar que Gabriela disse que precisaria dele durante todo o dia, já que partiríamos ao entardecer.
― A patroa quer falar com você urgente. – frisou a palavra patroa como sempre fazia. Gabriela exigia que os funcionários a chamassem assim e alguns rebeldes, como Ricardo, tinham dificuldade de obedecer tal exigência. Faziam a vontade dela, mas sem deixar de mostrar o quanto não gostavam.
― Ultimamente ela tem disponibilizado mais dias para me irritar. – comentei seguindo em direção a pousada onde estavam o pessoal da filmagem.
O estranho encontro com a fã maluca ficou de lado assim que o nome Gabriela foi citado. Depois de passar os últimos dias ouvindo-a reclamar sobre não termos filhos acabei indo várias vezes a pequena capela orar por um milagre. Era a única coisa que parecia poder salvar o nosso casamento. Nenhum dos métodos que os médicos indicavam parecia surtir efeito. Inclusive já tinha ouvido, com todas as letras, de alguns deles; para não insistir e adotar porque sou estéril.
O nome da doença que me persegue é Azoospermia não obstrutiva.
Às vezes me pego questionando se fui muito azarado em me apaixonar e casar com uma das poucas modelos, que conhecia, que queria desesperadamente um filho.
Mal cheguei perto de Gabriela e já percebi o seu mal humor.
― Onde você estava? – questionou baixo, mas de forma autoritária. Se tinha uma coisa que ela odiava era escândalo.
Gabriela estava com vinte e nove anos, porém para ela parecia que estava chegando aos sessenta. Constantemente se desesperava; não só para ter um filho, mas para conseguir dinheiro, temendo que sua beleza fosse levada pelo tempo e não conseguisse mais trabalho.
O que era uma bobagem, pois Gabriela era o tipo de artista que mesmo idosa chamaria a atenção dos empregadores do mundo da moda. Ela tinha o tipo de beleza clássica que a acompanharia por muitos anos. Seus cabelos loiros, seus olhos azuis, sua pele e corpo bem cuidados, seus traços perfeitos; tudo nela era lindo. Exceto a sua personalidade; comecei a descobrir isso depois que começamos a buscar tratamento para ela engravidar.
― Na capela. – respondi sentando displicente na cama. Não me deixaria envolver pelas reclamações dela. Chega de brigas.
― Eu disse que queria conversar com você logo após as últimas filmagens e você some. – acusou.
Como se você fosse acordar às cinco da manhã! – pensei começando a me irritar uma vez que ela sabia que as últimas filmagens seriam durante a madrugada.
― Conversar sobre o que, Gabi? Sobre o nosso divórcio? Vai pedir o divórcio se não engravidar? – já estava cansado. Toda vez que ela dizia que queria conversar eu acabava em um novo tratamento sem resultado.
― Não. Claro que não! – respondeu deixando claro através da sua expressão que aquilo estava fora de cogitação.
Mas eu já não estava mais com o melhor dos humores, então declarei esquecendo a minha determinação de não brigar:
― É o que parece. Eu pulo de uma clínica a outra, de um tratamento a outro e você parece não perceber o meu esforço. Às vezes parece que me culpa por nenhum tratamento dar certo. Estou cansado disso. Chega de tratamentos! Chega de cobranças! Se quiser o divórcio basta me dizer que assino quando desejar.
― Calma, Alex! – pediu sentando-se ao meu lado. – Não parece que voltou de uma capela.
― É difícil manter a calma quando minha esposa diz com todas as letras que não sou um homem de verdade. – recordei a nossa última briga na noite passada. Por causa de Gabriela precisei de muita maquiagem para esconder as olheiras durante a gravação.
As últimas palavras dela, antes de se trancar no banheiro foram: É tão difícil assim? Até mendigos engravidam.
As minhas foram: Vá procurar um que esteja disponível.
― Eu estava nervosa. Quero muito um filho. Você sabe disso. – tentou se justificar.
― E eu não quero? – a encarei.
Como que para apaziguar a situação ela sorriu e disse:
― Vamos tentar um último tratamento que me indicaram e juro que se não der certo aceito a sua sugestão de adoção.
Era uma das opções; adoção ou divórcio. Para falar a verdade, o desgaste com as tentativas de engravidar já havia abalado os meus sentimentos por Gabriela, mas eu insistia porque acreditava no casamento. Queria que a minha vida de casado fosse como a dos meus pais que completariam cinquenta anos juntos em breve.
Por isso quando ouvi a proposta dela tive vontade de levantar e abraçá-la, mas me contive.
― Vai ser o último! – declarei decidido.
― Sim. Prometo. – ela se ajoelhou perto da cama com uma expressão que dizia claramente onde a nossa conversa iria terminar. – Agora vamos praticar.
Acariciei o rosto dela e aceitei o seu convite. Mesmo com todas as tribulações e brigas, era difícil resistir ao fogo naqueles olhos azuis. Sequer me importei que a manhã ainda estivesse pela metade.