Capítulo 2 Primeiros contatos

Uma semana. Foi o tempo que Nicholas passou sem trocar uma palavra com nenhum dos colegas; às vezes ouvia seu nome sendo pronunciado em sussurro, outra pessoas comentando sobre bobagens, fazendo teorias da conspiração, mas nada igualava a extrema necessidade em ocupar sua mente lendo um bom livro.

Era segunda-feira, e chegou cedo naquele dia. Havia comprado um livro recém lançado e buscou um lugar entre as sombras das árvores para iniciar sua leitura, sempre evitando contato visual com os demais estudantes; principalmente os de sua turma, pois achava-os vulgares, mesquinhos e mesmo tendo pouco ou mais dinheiro que eles, pisar nas pessoas nunca esteve em seus planos.

Ele colocou os fones nos ouvidos e conectou via bluetooth, mas não pôs nada para tocar. Abriu o livro e começou a ler, antes de concluir a terceira lauda, sentiu o toque em seus ombros e erguendo o olhar, observou seu vizinho, Alec, de pé. Nicholas marcou a página e fechou o livro. Retirou os fones e fez um sinal, como se para Alec perguntar o que gostaria de saber.

- Hã... posso me sentar? - ele perguntou.

- Pode sim, Alec.

Alec sentou no banco de mármore e repousou a mochila sobre suas pernas.

- Eu fiquei triste por você ter me evitado.

Nicholas corou.

- Ah, me perdoa. Eu... sou inexperiente com colegas novos.

- De boa - ele sorriu e que sorriso. Pensou Nicholas. - Vi seu nome na equipe de soccer, vai mesmo tentar ser um selecionado?

- Talvez! Gosto de futebol, mas não sei se competir é meu forte. É mais para... me manter saudável. Entende?

- Entendo sim. Caso queira uma ajuda com os deveres de casa, estou convencido em ajudá-lo!

- Obrigado, Alec. Mas não preciso por enquanto.

Alec correu com os dedos pelos fios de seu cabelo e, depois, de forma programática, mordeu os lábios inferiores.

- Meus amigos comentam sobre você, principalmente as meninas. Que tal sentar conosco hoje no intervalo e trocar uma ideia?

- Outro dia. Não quero me intrometer nos assuntos restritos a vocês. Mas, posso passar na sua casa qualquer hora dessa pra provar a... pipoca doce de comer rezando e lamber os dedos.

A lembrança de sua fala anterior alegrou Alec. Dois minutos depois, no entanto, uma menina ruiva com o mesmo piercing no nariz, aproximou-se deles e deixou um beijo nos lábios rosados de Alec, o ato desconfortou Nicholas que encarou as rosas do jardim.

- Bom dia amor. Bom dia, Andrich, estou certa?

- Sim, mas é Nicholas. Andrich é meu segundo nome.

A garota sentou entre os dois e a pergunta soou com tons de ciúmes.

- Se conhece da onde?

Alec foi quem respondeu.

- Ah, ele é meu vizinho. O pai dele é o Robert, sócio do meu pai e do seu também.

- Legal. Eu sou a Mia, namorada do Alec.

Não era nenhuma surpresa para Nicholas depois do beijo; além do mais Mia parecia ser uma boa pessoa, mesmo se deixando ser influenciada de cabo a rabo por Amber Johnson, a popular.

- Felicidades pro casal - Nicholas se levantou do banco e olhou os dois. - Foi um prazer. Nos falamos mais tarde, Alec. Boa aula.

Alec estudava na sala sessenta e um, antes da classe de Nicholas, não eram muito chegados e a presença de Mia pareceu incomodá-lo de uma maneira surreal.

- Mas já? - o garoto protestou. - Sério mesmo que precisa ir agora?

- Não me incomodo que fique, Andrich - asseverou Mia, massageando os cabelos ruivos - Se quiser podemos nos sentar juntos no refeitório mais tarde.

Será que havia escapatória? Ele pensou.

- Pode ser, então.

Dito isso, Nicholas deixou o casal de pombinhos namorando e foi em direção a sua sala. Faltava aproximadamente quinze minutos para o início das aulas, e ao estar caminhando nos corredores aglomerados do segundo andar, percebeu as pessoas menos improváveis acenando em direção a ele. Não se tratava de ninguém menos que Austin Moore e sua corja de garotos bonitos, fortes e podres de coração e alma; todos vestindo um casaco em especial, o do time de soccer. No meio deles, Amber Johnson, a popular e namorada de Austin. Bonita por fora, vazia por dentro. O grupinho dos ricaços. Os temidos, os indomáveis, como os menos privilegiados conheciam na Bernard High School.

Como lutar contra eles? Nicholas perguntou ao cumprimentá-los um por um. O sorriso mais esnobe e de pura falsidade foi visto de perto, mas não negava que Amber Johnson tinha bom gosto. Austin Moore era ainda mais belo de perto; os cabelos castanhos impávidos só não eram mais belos porque os olhos azuis deslumbrantes ao toque da luz.

- Como está? - Austin perguntou por extrema curiosidade.

- Bem, e vocês?

Todos assentiram veementemente.

- Vai na festinha do Túlio final de semana? - o loiro desejou saber.

- Não, não fui convidado.

Túlio, um rapaz negro e dono de dentes brancos, prontificou-se em convidá-lo pessoalmente.

- Está convidado. Passarei o endereço mais tarde.

- Ah, mas ele reside no mesmo condomínio que a gente, cara - avisou Austin, dando um tapinha nos ombros de Túlio- Alec leva ele, já que são vizinhos de rua.

O grupo gargalhou um pouco alto, mas Nicholas não entendeu os motivos, então foi enfático na pergunta.

- Qual a razão dos sorrisos de deboche? - a pergunta encerrou o sarcasmo.

Amber que estava até o momento centrada no celular assistindo tutoriais de como suportar babacas o dia inteiro, respondeu:

- Você não sabia?

- Sabia o que?

Amber era programada para destruir casamentos e namoros longínquos em um único clique, logo não seria diferente ao expor Liam, o irmão mais velho de Alec.

- O cara é puro narcisismo, mas é gay.

- Gay?

- Sim, gay. Quando o homem se apaixona por...

- Eu sei o que é homossexualismo, garoto - Nicholas cortou Erik, amigo de Austin- E por que riram quando disseram sobre eu residir perto dele?

Todos engoliram em seco, mas Erik foi quem respondeu agora mais cauteloso.

- Sei lá, algo sobre: tome cuidado com ele. O cara é bonito, mas é lobo em pele de cordeiro.

A resposta bastou.

- Certo! Se eu tiver com vontade de ir a festa do seu amigo, eu vou, beleza? - exclamou Nicholas, afastando-se meio metro do grupo- Boa conversa.

Ele adentrou a sala de aula, composta por pouquíssimos alunos até aquele instante.

Em cinco minutos, o professor Washington, de Biologia, entrou pela porta trazendo todos que estavam ainda fora. Repousou seus materiais em cima da mesa e esperou se acomodarem, quando observou os adolescentes com hormônios aflorados nos devidos lugares, entrelaçou os braços acima dos peitos e encostou o quadril na mesa.

- Bom dia, gente da testosterona e progesterona elevada.

O coro respondeu em uníssono.

- Bom dia, professor Washington.

Washington Hall era um dos educadores mais adorados do ensino médio, tudo porque facilitava a vida do aluno fazendo-o entreter em assuntos importantes como o clima, saúde e futuro. Naquela manhã, em especial, trazia três boas notícias.

- Pessoas do hormônio elevado, a diretora Blanche pediu para noticiar algumas novidades deste semestre. A primeira é que haverá o famoso Baile que vocês amam... usem camisinha e nada de transar bêbados.

A classe caiu em gargalhadas.

- Segunda notícia - ele prosseguiu - Nossa escola vai tentar o bicampeonato dos Jogos Interclasses. E a terceira e mais favorável, dias de terça e quinta, as aulas passarão a ser... - todos suspiraram profundamente, menos Nich - integral, para poderem treinar e ficarem mais preparados na disputa. Nada de azarões, por favor, garotos dos hormônios eletrizantes.

Todos comentaram as notícias durante três minutos, quando Washington resolveu se intrometer.

- Outra notícia que havia me esquecido, mas não eram as três mais importantes: amanhã antes do início das aulas, todos agrupados no ginásio. O professor Elliot, vai dar continuidade nas atividades extraclasse.

O burburinho prosseguiu. Nicholas estava sentado no meio da turma, ao seu lado direito estava Brian, um garoto extremamente bonito, com um corte de cabelo baixo; à esquerda, Vanessa, uma das amigas de Amber; à frente, Austin, atrás Dylan. Seria quase impossível Washington avistá-lo em meio a pessoas tão populares. Mas os olhos castanhos-escuros do professor o encontraram no momento oportuno, quando os "hormônios exaltados" como referia-se a Austin e seu grupinho, falavam asneiras sem sentido.

- Silêncio - ele pediu, se levantando. - Cadê os dois novatos? - Washington procurou pela frequência e a encontrou. Colocou os óculos e buscou os referentes - Anne Maya e Nicholas Andrich! É isso?

As mãos no ar foram o bastante para o professor chamá-los à frente. Sem hesitar, cumpriram as ordens. Washington permaneceu entre ambos.

- Sejam bem vindos a Bernard High School. É uma satisfação tê-los aqui. São de onde? Começando por você,... Anne!

Anne era uma garota bonita de cabelos cacheados e tom de pele parecido com canela. Corpo moldado, nádegas que denunciavam a não pertencer àquele país.

- Sou Anne Maya, brasileira. Tenho dezessete anos, sou filha de advogados e me mudei recentemente para os Estados Unidos. Espero fazer grandes amizades.

Sem sotaque. O inglês de Anne era impecável, ninguém jamais suspeitaria que fosse brasileira.

- O Brasil é lindo. Qual seu estado?

- Pará. É o segundo maior do Brasil, depois do Amazonas e o mais populoso da região Norte.

Aquilo bastou para Washington.

- Sua vez, rapazinho!

Nicholas parecia mais relaxado depois da primeira semana. Aquele tivera sido seu primeiro contato com o professor Washington, mas já o adorava.

- Sou Nicholas Andrich. Galês, tenho dezessete anos, cheguei há uma semana em Nova Iorque.

- É de Cardiff?

- Sim, Cardiff!

Professor Washington pediu para que ambos voltassem aos seus lugares.

Passou os exercícios devido e ao soar o horário do intervalo, liberou todos para lanchar no refeitório.

O refeitório normalmente era dividido em duas partes: a primeira coberta, com diversas mesas onde grupos sentavam; ventilado pelos arcondicionados e onde os próprios alunos serviam-se. A segunda divisão ficava ao ar livre, debaixo de árvores, também muito frequentadas. A turminha de Austin sentava ali, todos com seus pares românticos, a decisão de acompanhá-los foi pura nostalgia, afinal Nicholas não namorava. Se entreter com aquele povo seria difícil. Mas todos foram bastante receptivos com ele.

- Então esse é o carinha novato? - Guilherme questionou Alec.

- O nome dele é Nicholas Andrich. Estuda comigo - disse Austin, dando um tapinha no ombro esquerdo do rapaz- Convidei ele para a festa do Túlio. Espero que ele vá!

Nicholas nada disse.

- É verdade que irão inaugurar uma boate no centro? - Dylan perguntou ao grupo.

- Meu pai conhece o dono - assegurou Philip, após um gole no milkshake- Ele consegue umas entradas pra gente.

Austin esfregou uma mão na outra.

- Tenta e avisa a mim. São apenas dois menores de idade: o novato e a namorada do Alec. Cê está dentro, né?

Nicholas tomou um pouco de suco.

- Ah, não, meu pai me mata se descobrir. Mas meu aniversário é noutro mês... consigo esperar.

- Hum... vai ter festinha?

- Não, ainda não.

- Como assim, não? Se desejar eu e Maíra somos ótimas em decorações e montagens de festa... - intrometeu-se Amber, deixando, finalmente, o celular de lado. - Estamos aqui caso precise.

Nicholas agradeceu de bom grado, mas ainda não tinha conversado com o pai a respeito. Jamais tomaria uma decisão sem antes consultá-lo.

Ele levantou e todos encararam um semblante curioso.

- Bem, obrigado pela recepção. Até mais.

- Como assim você já vai? - Austin quis saber.

- Passarei na biblioteca da escola. Ouvi dizer que estão precisando de voluntários, então decidi me candidatar a vaga.

Os olhares suspeitos o abateram, mas não ligou.

- Até mais, então. Boa sorte lá, cara.

- Obrigado, pessoal!

A educação de Nicholas parecia coisa de outro mundo, tanto Austin quanto o restante do grupo perceberam isso, mas Nicholas era inocente demais, e não prestou atenção devida no que aquelas pessoas tramavam por debaixo dos sorrisos.

            
            

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