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Varsóvia - Polônia - 2022
No final da estrada de espessura diferente, surgiram casas altas distintas do que eu estava acostumada. Eu me recordava de lugares com 2 ou 3 andares, alas extensas onde guardas perambulavam e pequenas estruturas para camponeses ao decorrer das cidades. Porém ali, as estruturas eram de uma diferença grotesca.
Havia janelas envidraçadas que não eram sustentadas por madeira e sim por pedras que deveriam ter dado muito trabalho para serem carregadas. Me lembrei que apenas os castelos eram feitos de algo semelhante e fechei os olhos ao imaginar os pobres escravos sendo açoitados enquanto erguiam aqueles locais, pois era o que havia ocorrido comigo.
A floresta acabava em um ponto e aquela cidade de pedra iniciava no outro. Algumas pessoas caminhavam pela rua, em cima de outras estruturas de pedras. Observei os monstros metálicos perambulando por entre cada um e percebi que ninguém os montava. As criaturas se moviam sem ordens ou rédeas até cuspirem pessoas de dentro de si, após abrirem sua boca de maneira estranha.
Outro fato intrigante eram as vestes, pois todos pareciam andar igual à garota que eu possuía. As mulheres vestiam calças e algumas usavam blusas que as faziam parecer meretrizes. Homens andavam de maneira elegante, mas não usavam joias ou armaduras e alguns saíam completamente da etiqueta atual, vestindo roupas tão folgadas que pareciam mulambos da época que era um borrão sendo moldado lentamente em minha cabeça.
- O que... - Pensar que o mundo havia mudado tanto me fez questionar por quanto tempo havia adormecido. Parecia que as pessoas tinham evoluído de uma maneira catastrófica, mas também que tudo aquilo estava fazendo bem para elas. - Quando estou?
Eu falava para mim mesma. Era estranho não me lembrar o que eu havia feito durante tanto tempo. Tudo o que eu conseguia em minha cabeça era ouvir as pessoas gritando que aquele era o meu destino, sentindo o fogo torrar minha carne até que a completa escuridão fechasse meus olhos e tudo o que ficara em minha cabeça no fim disse fora a voz clamando do meu antigo nome. "Cloe".
- O que você fez, menina? - Perguntei internamente me referindo a dona do corpo tentando ver se ela ainda estava ali. Se um pouco da sua alma estivesse ali eu poderia ter a minha resposta e também entender tudo ao meu redor. Porém, se não estivesse eu teria que descobrir sozinha e por não obter resposta entendi que era isso que iria acontecer.
"Mestre" um sopro de vento trouxe vozes até mim. Ergueu os cabelos do corpo onde eu estava e arrepiaram meu interior. "Cloe".
"Eu os condeno" dessa vez a voz feminina e madura fez eu lembrar de mim mesma. Aquela deveria ter sido a minha voz no passado. Fechei os olhos para tentar me lembrar dessa frase, mas havia muitos pensamentos ruins em minha mente e tudo que eu conseguia ouvir era minha antiga voz mesclada a mais mil. "Todos irão queimar ao meu lado! Todos irão pagar por seu ódio".
- Regina! - Esbravejou uma das vozes em minha cabeça, mas percebi que ela não estava realmente dentro de mim. Isso me levou a olhar na direção que ela viera e com isso o vento levou o corpo do rapaz para longe do meu lançando-o contra uma barraca de frutas. Percebi que era apenas uma pessoa comum quando ele não revidou o ataque e recompus meu corpo. O rapaz se levantou arrumando as suas roupas e olhando incrédulo para mim. - Tudo bem! Eu tô legal! O que foi isso?
Ele disse ao caminhar em minha direção novamente e dessa vez me contive para não machucá-lo. Regina deveria ser o nome da garota que eu estava possuindo e ele talvez a conhecesse.
- Tá todo mundo procurando você. Meu Deus! - Ele segurou minhas mãos para observá-las manchadas de sangue. - Eles fizeram isso?
Pela primeira vez senti a dor e retrai as mãos observando por entre as pulseiras os pequenos cortes no pulso da garota. "Um corpo" pensei. Forcei a mim mesma para projetar em minha cabeça o local onde despertei na noite anterior e me recordei que haviam quatro lados para seguir. "Uma encruzilhada". Minhas mãos invadiram o peito da garota acariciando aquela área em busca de algo e quando senti o pingente o tirei do pescoço para encontrar o símbolo pela metade, uma cobra engolindo a própria cauda. "Um amuleto". Ainda faltava um item e mesmo que Regina fosse a melhor estudiosa, levaria anos para decifrar isso se o encontrasse. Não me recordei de nenhum osso no local onde despertei.
- Regina? - O rapaz me tirou dos meus devaneios, e olhei para seus olhos azuis tentando usar o pouco da energia do corpo daquela garota para poder ver sua ligação com ele.
Em uma breve viagem na mente da garota, vi os dois dando as mãos, correndo na infância um atrás do outro em uma praia e ele a protegendo em meio a um monte de jovens. Depois, ouvir a voz de Regina chamando o seu nome em algumas vezes, até mesmo comemorando festas com o rapaz.
- Antoni. - Eu disse ao ter algumas lembranças deles. - Melhor amigo de Regina.
- Ok, senhora das cavernas. Vamos logo que seus pais estão quase morrendo de preocupação. - Ele disse segurando meu braço para ajudar o corpo a caminhar. Novamente vasculhei a mente da garota.
- Haskel. Haskel Jan - falei ao captar o nome do pai dela. - Ewa Jan.
- Ta estranha - Ele parou tentando olhar diretamente para meus olhos. - O que fizeram com você?
- Preciso descobrir. - Observei o céu e tentei fazer uma análise mental, dessa vez na mente do espírito, meu espírito. Tentando encontrar algum resquício a mais do meu verdadeiro eu. No entanto, sempre que tentava entrar em minha própria lembrança, aquelas vozes me chamando de mestre tiravam toda minha concentração e as lembranças eram sempre borrões, mas minha mente ainda sabia de muita coisa como o ritual da garota que gradualmente eu ia entendendo.
Eu me recordei que no passado aquelas vozes me seguiam, eram pessoas que usavam algo semelhante ao meu amuleto. Me recordei do que eu fazia e também me lembrei que havia uma pessoa em meio aos outros que não estava nem contra mim, nem ao meu favor. Essa mesma pessoa também usava magia. Todas as vozes usavam e se estavam falando em minha mente, mas a dele não estavam mais lá e isso me levou a tentar ver onde o havia deixado pelo caminho, pois eu sabia que ele estava lá naquela noite.
Nada achei.
- Ranon. Onde você está?