- Preciso que fique aqui, até resolver um problema.
- O problema é aquele menino?
- Sim...
Ligo sua televisão e coloco um desenho.
- Ele é bonito! Um menino bonito para você.
Minha raiva me impede de achar graça em suas palavras. Alice não faz ideia do que está acontecendo.
- Ele é só um amigo do trabalho, vamos falar sobre o meu plantão.
Beijo sua cabeça e ela senta na cama.
- Fique aqui!
Ordeno mais uma vez, mas agora um pouco mais suave. Saio do quarto e fecho a porta. Vou para o meu e coloco meu roupão. É melhor que essa toalha. Termino de colocar o roupão e volto para a sala.
- Que merda acha que está fazendo aqui!
Digo furiosa ao tal Renato Mantovani, mas mantenho a voz baixa. Vira-se e me olha.
- O que seu irmão imbecil te mandou fazer aqui? Veio me falar merdas como ele e jogar na minha cara que quero dinheiro?
Vejo em suas mãos um dos porta retratos que tenho na mesinha, meu e de Alice.
- Ela é a garotinha? A que pode ser filha dele.
Cruzo meus braços e não respondo.
- Não vai me responder?
- Não devo respostas a você. Dei a chance de seu irmão me perguntar o que quisesse e resolver isso. Mas ele decidiu que não queria fazer parte de nada.
Ele solta um longo suspiro e se aproxima. Cada passo que ele dá em minha direção, é uma batida firme do meu coração em meu peito. Seus olhos fixos nos meus e não consigo me mexer.
- Não sou meu irmão!
Diz com a voz rouca que me faz prender o ar. Para na minha frente, muito próximo.
- Assim como você não é a mãe, não sou o pai. Então estamos no mesmo patamar de tios.
- Não me compare a você. Alice desde seu primeiro sopro de vida está comigo. Todas as dores, medos, fases e evoluções foram comigo. Você nunca esteve aqui pra ela, mas eu sim.
- Se soubesse da existência dela, teria feito o mesmo pela pequena. Fui privado de ser tio e estou aqui por isso.
- Talvez você não seja o tio.
Ficamos nos encarando sem recuar.
- Mas talvez seja... E por essa razão estou aqui.
- Alice não precisa de um tio. Precisa de um pai e um como o seu irmão eu dispenso.
Saio de perto dele e vou para a porta. Abro-a e fico firme.
- Não quero ele e nem sua família perto da Alice. É um imbecil que não a merece, se negou a verificar a paternidade e agora quem o nega sou eu.
Renato vem andando até a porta, mas não passa por mim.
- Você não pode negar isso. Não é um direito seu e sim da Alice.
Minha vontade é de bater nele e manda-lo embora a tapa.
- Então manda seu irmão vir brigar por ela e não seu cão de guarda! Agora sai da minha casa. Não se aproxime da Alice ou serei obrigada a buscar a justiça para mantê-los longe.
- Então buscarei a justiça também para me manter perto.
- Primeiro procura a justiça pra fazer seu irmão virar homem e reconhecer o que fez no passado com a minha irmã. Até lá só me apareça aqui com ordem judicial. Não se aproxime de Alice.
Renato vem pra cima de mim e na tentativa de recuar, bato minhas costas na parede.
- Você é irritante! Vim aqui para tentar resolver isso.
- Não procurei por você e muito menos por sua ajuda.
- Para de me atacar!
Diz bravo e avança mais em mim, colando seu peito no meu. Nossos rostos muito próximos e prendo a respiração, assustada.
- O idiota aqui é o meu irmão.
Sussurra e vou soltando aos poucos o ar que prendia.
- Ele está assustado com a possibilidade de ser pai. Aquele infeliz ainda nem cuida dele direito, quem dirá de uma criança.
- Por isso mesmo o quero longe da minha sobrinha. Alice não merece alguém como ele por perto.
- Estou disposto a ajuda-lo com ela. Se for mesmo filha dele.
- Ótimo! Quando o exame sair e tivermos a paternidade confirmada, pode vir. Antes disso fique longe. Ela não precisa dessa confusão na cabeça dela.
- Ela não sabe das possibilidades?
Ele ainda está muito perto e isso me faz perder um pouco o raciocínio, por causa de seu perfume forte.
- Não vou contar a ela que a mãe dormiu com mais de um homem e que teremos que fazer um exame pra ver quem é o pai dela. Alice só tem cinco anos.
- Está certa! Não precisa saber disso.
- Mantive Sophi viva na cabecinha e no coração dela. Mas mantive a mãe e não a jovem que viveu uma vida intensa. Essa parte ela não precisa saber.
- Vou conversar com meu irmão. Convencê-lo a fazer o exame.
- Sinceramente não quero.
Renato me olha sem entender.
- Diego não precisa engolir essa paternidade. Não estou fazendo tudo isso para que o pai arque com algo e que me ajude financeiramente. Mantive Alice até agora e posso fazer por mais longos anos, até meu último dia de vida.
Respiro fundo.
- Estou fazendo isso por ela. Porque ela sonha com um pai, já que não pode ter a mãe de volta. Quero que a pessoa queira ser pai dela. Que a ame e cuide dela comigo. Não quero um pai por obrigação, que nunca estará presente, mas dê o nome. Alice não merece isso. Quero mesmo um pai. Que a ame mais que tudo, como amo essa garotinha.
Ele me observa sem dizer nada. Estou com os olhos marejados e seguro o choro. Possivelmente por isso me olha de um jeito intenso.
- Alice pode não ter a mãe, mas tem você que a ama muito. Diego pode não ser o melhor pai, mas ela terá a mim. Posso ama-la como tio, como você a ama como tia. Não nos prive desse amor por causa do meu irmão. Estou realmente disposto a ama-la.
- Mãedinda...
Meus olhos desviam dos dele e olho para Alice na sala. Ela nos observa preocupada. Ele recua, ficando agora perto da sala.
- Acho melhor ir.
Digo e ele está olhando para ela.
- Foi um prazer te conhecer Alice.
Diz pra ela que sorri.
- Podia vir me ver mais vezes. A Mãedinda quase sempre fica fora de casa de noite.
Oh merda! Ela tinha que ter avisado sobre isso? Ele sorri pra ela.
- Se ela deixar, venho te ver de noite.
Agora os dois me olham do mesmo jeito pidão.
- Vai embora!
Digo irritada o empurrando pra fora.
- Posso vir aqui amanhã?
- Tchau!
Ele sorri pra mim e tento não sorrir.
- Por favor!
- Tchau!
Fecho a porta e respiro fundo.
- Chego no mesmo horário...
Grita e Alice está pulando animada.
- Combinado...
Ela grita de volta e corre para o quarto dela.
- Isso vai dar merda!