Capítulo 3 3° Capítulo

Marco Valante riu-se.

- Tenho a certeza que o fará, cara, mas não se esqueça, aceito um primeiro

pagamento agora.

Logo, chegou junto dela e o seu braço rodeou-a e puxou-a para ele. E durante um instante

ela sentiu a boca ardente e máscula sobre a sua, a saboreá-la com uma ânsia que

não sabia que existia.

Terminou quase antes de começar. Antes dela se dar conta do que estava a acontecer, já

estava livre e continuava a olhá-lo horrorizada, limpando a boca com a mão.

Ele também a olhou e fez uma careta.

- Tão ardente como o pecado e tão doce como o mel. Mal posso esperar pelo próximo

pagamento, Flora mia.

O tom da sua voz fez com que ela estremecesse. Queria olhar para outro lado, mas

era impossível. Estava como que hipnotizada. Por sorte, bateram à porta e ela

foi abrir. Afastou o roupão para não tropeçar e tentou não sair a correr.

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A voz dele perseguiu-a.

- Ti vedro, mia bella. Vemo-nos por aí.

- Não. Não nos veremos - respondeu ela, furiosa, enquanto saía batendo com a

porta, consciente, para sua vergonha, de que não se atreveria a voltar a olhar para ele.

Preparei-te um chá - disse Melanie, preocupada.

-Aposto que ainda não consegues aguentar um cappucino. Dizem que o choque pode

fazer-te sentir assim.

"Alguns choques sim, podem", pensou Flora enquanto agradecia à sua secretária pela

chávena que lhe tinha levado. O choque para ela não era o cappucino, masqualquer coisa que soasse a italiano.

Tinham passado três dias desde o encontro e a sensação desagradável continuava. Tinha

sido pior a emenda que o soneto, e ainda mandava seleccionar as suas chamadas e

espreitava para a rua antes de sair de casa ou do escritório.

- Vemo-nos por aí - era o que ele tinha dito. Uma frase normal de despedida,

provavelmente sem maior importância. Mas eram palavras de má sorte, porque

fizera com que parecessem uma promessa... ou uma ameaça.

Flora tentava convencer-se de que essas palavras não importavam e que devia

esquecê-lo por completo. Já que as suas feridas estavam a cicatrizar, pensava

que as suas emoções também o deviam fazer.

Desde o primeiro momento, era evidente que Marco Valante significava problemas, e ela

tinha tido a má sorte de ser ele o primeiro a aparecer, quando ela

pediu ajuda. Era o tipo de homem que não perdia uma ocasião para seduzir.

Mas... só tinha sido um beijo. Não seria exagerada a sua reacção? Certamente ele já

tinha esquecido tudo e talvez estivesse de regresso a Itália. Ela também devia

esquecê-lo. Porque lhe custava tanto? Por que razão ele invadia os seus

pensamentos durante o dia e os seus sonhos pela noite? Não fazia sentido.

E o que era ainda mais preocupante: porque não tinha contado nada a Chris?

A sua atitude incomodava-a. Ao princípio, ele mostrou-se compreensivo, mas depois

criticou-a por resistir, disse-lhe que tinha tido muita sorte por não se ter magoado mais. Isso não era o que ela precisava de ouvir. Devia ter-se mostrado mais preocupado e compreensivo. Mais carinhoso.

Ele estava muito ocupado a tentar estabelecer uma base económica segura para o

casamento e Flora sabia que não podia estar sempre dependente dela. Mas devia

ter ficado com ela, pelo menos aquela noite. Em vez disso, só dissera:

- Sinto muito, querida. Tenho um encontro com um cliente novo. Pode ser

importante. Além disso, é bom para ti ires descansar, relaxar... e para isso

não precisas de mim.

"Não", pensou Flora com tristeza, "mas teria gostado de sentir o consolo dos teus

braços a abraçar-me. Gostaria que me olhasses como ele me olhou. Que me demonstrasses

que me desejas, que estás ansioso para que chegue o dia do nosso casamento e o

momento em que pertenceremos de verdade um ao outro. E que esse momento não

seja como aquela outra vez..."

23

Mordeu o lábio, recordando-se, e voltou a concentrar-se em terminar um projecto para

uma mulher que queria vender um apartamento cheio de quinquilharia a um preço

exorbitante. Sabia que estava a perder tempo com esse projecto e que a senhora

Barstow não faria nenhuma mudança e, além disso, discutiria a percentagem que

lhe cobraria. Decidiu estudar um dos outros pedidos que tinha. Melanie tinha-a

avisado de que era urgente. Tratava-se da senhora Fairlie, que tinha que ir

para Bruxelas e necessitava de vender a casa com urgência. Diz que nos

recomendaram, tinha escrito Melanie.

- Isso é o que eu gosto de ouvir - disse Flora em voz alta enquanto marcava o

número da senhora Fairlie.

-Não poderia fazer-me um jeitinho? Tenho muita urgência - suplicou a senhora,

quando Flora lhe disse que não poderia ver a casa até à semana seguinte.

- Posso tentar vê-la esta noite, de caminho para a minha casa, se não for muito

tarde para si.

- Oh, sim - disse a senhora Fairlie, animada. - Parece-me estupendo.

Flora

desligou o telefone e ficou pensativa. Voltou a pegar no telefone e, seguindo

um impulso que não entendia, marcou o número do hotel Mayfair Tower.

-Estou a tentar localizar o senhor Marco Valante

-inventou. - Tenho conhecimento que está hospedado no vosso hotel.

-Sinto muito, mas o senhor Valante partiu ontem.

-Ah. sim? Muito agradecida - respondeu Flora, e desligou. O seu coração estava

acelerado, mas sentia-se aliviada. Ele tinha regressado a Itália e ela já não

tinha nada que temer.

"Devo ser mais positiva", pensou, "e tomar medidas para o futuro. Este

fim-de-semana vou dedicar-me a arranjar o apartamento e convencer o Chris a

ajudar-me. E também terminaremos os detalhes do casamento. Uns quantos passos

positivos e voltarei a ser quem era, sem tempo para pensar em tolices."

Apanhouum táxi para a casa da senhora Fairlie, situada numa praça tranquila e

elegante. Ainda que valesse uma fortuna, decerto teria muitos interessados.

Uma empregada abriu-lhe a porta e conduziu-a por uma ampla escada até ao salão. A

casa estava decorada com muita elegância e Flora pensou que não necessitavam da

sua assessoria para vendê-la.

A luz do entardecer inundava a divisão e não lhe permitia ver a figura que se

aproximava dela. Quando se deu conta de que não era uma mulher, teve um

pressentimento e sentiu um frio intenso.

- Buona sera, Flora mia - cumprimentou Marco Valante enquanto lhe agarrava a mão

e a levava aos lábios. - Alegra-me vê-la outra vez.

-Oxalá pudesse dizer o mesmo - respondeu ela quase sem respiração. - Que é isto?

Tinha um encontro com uma tal senhora Fairlie.

-

Teve um contratempo e não pôde vir. Mas encarregou-me a mim de lhe mostrar a

casa.

-E pensa que eu vou acreditar? Ele arqueou as sobrancelhas.

-O que é que acha? Que a tenho presa e amordaçada no sótão?

-Parece-me estranho que seja precisamente você a estar encarregue da casa.

-Ficarei a viver aqui uns dias - disse ele com calma. - A senhora Fairlie é a

minha prima Vittoria.

            
            

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