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-Já estou a ver - respondeu Flora com o coração muito agitado. - E você convenceu-a a enganar-me para que eu viesse até aqui. A sua família descende de Maquiavel?
- Pelo que sei, não teve descendência - respondeu ele, pensativo, - e Vittoria
não necessitou que a convencesse quando lhe contei o quanto desejava vê-la
outra vez - acrescentou, sorrindo. - Tem muita tendência a mimar-me.
-Pior para ela - disse Flora, em tom cortante. Quero ir-me embora.
-Antes de examinar a casa? Isso não é muito profissional, cara.
Ela dirigiu-lhe um olhar gelado.
-Mas penso que me fizeram vir para algo que não tem nada a ver com a minha
profissão.
-Está muito enganada. A Vittoria deseja que a aconselhe sobre a decoração do
quarto principal. Está aborrecida com a cor e o quarto da sua casa de Bruxelas.
Está decorado num tom parecido.
-Então, é verdade que quer vender esta casa? perguntou Flora.
-Já a vendeu directamente - disse ele com suavidade. - Subimos para ver oquarto?
-Não! - A palavra soou como uma explosão. Ele afastou-se como se lhe tivesse
dado uma bofetada. Os seus olhos verdes olharam-na com surpresa e desprezo, e
ela envergonhou-se ao dar-se conta de que a sua reacção tinha sido exagerada. - Desculpe... Não queria... - hesitou.
-Não sou tolo - disse ele. - Sei perfeitamente o que quis dizer. - Levantou-lhe
o queixo. - Duas coisas, mia cara - disse em tom suave. - Esta é a casa da
minha prima e eu não vou profaná-la. E o que é mais importante, nunca estive
com uma mulher contra a sua vontade, e você não vai ser a primeira. Capisce?
Flora corou. - Assim, por favor, leve a cabo a missão que lhe foi encomendada -
dirigiu-se para a porta. Quer que chame a Melinda para que faça de guarda?
-Não - respondeu ela, atrapalhada. - Isso não é necessário.
Aspernas tremiam-lhe enquanto subia ao quarto de Vittoria Fairlie, no segundo
andar.
Eraum quarto amplo com vista para o jardim e janelas francesas que davam para uma
varanda de ferro forjado com vasos de cerâmica cheios de flores.
Asparedes interiores eram cor-de-rosa pálido com adornos brancos e a colcha,
cor-de-rosa escuro. Não havia quase móveis, excepto uma espreguiçadeira e um
tocador de madeira de carvalho.
-E bem? - perguntou ele, olhando pela janela. Porque razão não conseguia ela
deixar de olhar para ele? Tinha a sua imagem gravada na mente, a desordem do
seu cabelo preto azulado, o contorno do seu queixo, as calças pretas justas que
acentuavam as suas ancas estreitas e as suas coxas fortes, a camisa branca com
o último botão desabotoado deixando ver um triângulo da pele suave e
bronzeada...
Por um instante, pensou em como se sentiria a tocar nessa pele com os dedos... ou
com a boca... Ficou horrorizada ao dar-se conta do que estava a pensar e
precipitou-se a dizer algo.
-É um quarto verdadeiramente bonito. Não encontro nenhuma falta de gosto da sua
prima - disse num segundo. - Mas pergunto-me se não é, quem sabe, demasiado
feminino.
-Essa é também a opinião do marido - disse Marco com uma careta. - Não quer que
pintem nada de cor-de-rosa na casa nova.
-Mas é tão difícil sugerir algo sem ter visto o quarto de Bruxelas... Pode ser
que esteja orientado noutra direcção...
-Não. A Vittoria diz que também está orientado para sul e é muito luminoso.
-Nesse caso - Flora deu outra vista de olhos à sua volta. - Há um papel de seda
em tons de água, azul e verde pálido, que é lindo. Chama-se Seascape. Sempre me
pareceu que realçava com a luz do sol, reflectindo a ondulação do Mediterrâneo.
Mas pode ser que a sua prima não goste.
-Pelo contrário. Penso que isso lhe traria boas recordações. Quando éramos
crianças, costumávamos passar o Verão em casa do nosso avô. Era um velho
castelo numa colina sobre o mar e todos os dias descíamos à praia por entre as
rochas.
-Parece paradisíaco.
-Sim - disse ele. - Um mundo muito mais inocente. Visitou alguma vez o meu país?
-Ainda não, mas espero ir lá na minha lua-de-mel. Se conseguir convencer o meu
noivo, claro!
-Ele não gosta de Itália? - Os seus olhos verdes estavam pensativos.
-Penso que também nunca esteve lá. Mas esteve nas Bahamas no princípio deste ano
e quer voltar lá. Ao que parece, há uma pequena ilha chamada Coconut Cay onde
os pelicanos vão comer. Um barqueiro leva-te pela manhã e vai buscar-te ao
entardecer. Nessa altura, não há mais ninguém na ilha.
-Ele deve ter boas recordações.
-Sim. Mas para a nossa lua-de-mel eu preferiria um sítio onde possamos criar juntos as nossas recordações. E poderíamos ir às Bahamas noutra altura.
-Claro - concordou ele, olhando para o relógio. Sem dúvida que os planos de
casamento o aborreciam. "Isso era o que pretendia", pensou Flora.
Apresentará por escrito as suas recomendações a Vittoria? Inclua também uma
nota com os seus honorários.
-Preferiria que você mesmo lhe dissesse - levantou a cara e olhou-o com
frontalidade. - E pode ficar descansado, que assim ficarão saldadas todas as
dívidas entre nós.
-Como queira - respondeu ele cortesmente. Enquanto descia a escada, Flora pensou
que não era isso que esperava. Tinha previsto que ele discutisse um pouco ou,
pelo menos, que fizesse algum dos seus comentários irónicos.
Estavaclaro que já se tinha aborrecido do jogo, que tinha estado a jogar. "Melhor
assim", pensou. Estava a descer a escada com intenção de sair pela porta,
sem nem sequer olhar para trás, quando viu que Melinda subia com um balde de
gelo e, de repente, já estava de novo no salão.
-Champanhe? - perguntou Marco, abrindo a garrafa.
-
Na realidade, devia ir-me embora - alegou ela, aceitando a taça e sentando-se
na ponta de um sofá, enquanto observava, incomodada, como a empregada deixava
uma bandeja com canapés sobre uma mesa auxiliar e saía, deixando-os a sós. -
Está a comemorar algo?