- Um dia te conto, é uma longa história. Mas, que bom que já está a vontade. É sempre bom ter uma mulher bonita passeando pela casa, viu. - Falei em tom de brincadeira e ela sorriu.
- Ah, é pra isso que eu sirvo, então? Ser uma garota bonita passeando pela sua casa? - Disse, com uma falsa indignação.
- Você me entendeu, Ana. Mas, bom... Parece que vamos nos dar bem. Vai ser divertido ter sua companhia aqui em casa. Ao menos ao invés de me irritar, você me diverte. Já pensou em ser comediante ou coisa do tipo? - Ela tomou um gole da cerveja e depois me olhou.
- Comediantes não ganham tanto dinheiro assim a menos que viralizem, eu prefiro ganhar meu dinheiro de outro jeito. Aliás, se quiser um serviço extra, é só avisar. - Eu a olhei de forma irônica.
- Ana, olha pra mim... Olha bem pra mim, pros meus olhos. Você acha que eu preciso pagar pra ter sexo com alguém? Eu como quem eu quiser. - Falei e soltei uma risada debochada. Ana girou os olhos.
- Quanta prepotência. - Disse e cruzou os braços. - Só estou deixando claro que, já que estou aqui e sou uma pessoa muuuuito trabalhadora, poderia muito bem ganhar um extra, sei lá... - Eu interrompi.
- Não te contratei pra ser minha puta. Você vai ficar aqui, vai sair comigo e ir nos eventos como se fosse minha nova fiel. E é isso. - Ela deu os ombros.
- Tá. Por acaso, eu posso sair daqui ou estou em cárcere privado? Você tinha dito que eu posso passear, que eu ia ter cartões disponíveis e eu estou esperando. - Ela esticou a mão, me pedindo o cartão.
Me levantei do sofá e fui até a porta. Peguei uma chave do meu chaveiro e joguei para ela. Ela a pegou no ar.
- Tá livre. - Tirei a carteira do bolso e peguei um cartão de crédito. Ela se aproximou e dei na mão dela. - Não de bola para nenhum homem daqui do morro. Não se esqueça do nosso contrato... Nada de divulgar seus serviços pra alguém ou coisa do tipo.
- Eu só quero sair e comprar coisas... Não vou sair dando bola pra macho ou me divulgando. Sei respeitar meu trabalho, tá? Não se preocupe. - Disse.
- Certo. Sinta-se livre, mas lembre que tecnicamente você não é livre. Você é minha nova fiel. - Eu pisquei um dos meus olhos e ela deu os ombros.
- Se me perguntarem onde nos conhecemos, o que eu respondo? - Eu olhei para baixo, pensando.
- Responda que foi fora do morro. E que foi bem interessante. - Ela prendeu uma risada, pude perceber porque mordeu o lábio inferior.
- Sim senhor. Nos conhecemos em um restaurante de ricaços onde você olhou pra mim e pra minha bela bunda e... Uau, se apaixonou de primeira. - Eu concordei com a cabeça.
- Exatamente isso. Não resisti ao seu traseiro maravilhoso e quis você pra mim. Ah, acho melhor você omitir o fato de que as mulheres naquele restaurante trabalham só de biquini... - Ela deu os ombros.
- Puta não foi feita pra namorar, né. - Disse, de forma debochada. Mas eu senti um ar de tristeza nela.
- Não... Não é isso. - Falei. Para evitar constrangimento, mudei de assunto. - Vou te mostrar o quarto que você vai ficar, pode arrumar suas coisas lá.
Depois que terminamos as cervejas, levei Ana até o quarto dela e ajudei com as malas. Ela se instalou ali, colocando seu notebook na pequena mesa de estudos e depois, colocou uma música alta divertida da Anitta. Ela rebolava aõ som da música enquanto tirava as roupas da mala, e eu confesso que fiquei curioso para continuar assistindo o show... Mas agora, preciso deixar ela quieta, na dela, enquanto faço o meu por aqui.
O dia foi passando. Já era noite. Meu celular tocava sem parar e eu estava sentado, na sala.
- Alô?
- Não passou nem um mês desde que nos separamos e você já levou uma vagabunda pra morar na nossa casa? Eu não acredito nisso, Henrique! - Aline gritava do outro lado da linha.
- Foi você quem foi embora de casa! - Retruquei. - Eu tenho alguém comigo agora, arranjei uma nova fiel. Alguém que gosta de mim de verdade, diferente de você que nesses últimos anos parecia amar mais o status e o dinheiro do que seu próprio marido, sabe? Coisa bem de puta. - Eu vi Ana saindo do quarto e indo até a cozinha. Ela estava com um short bem curto e um cropped, abriu a geladeira e começou a fuçar. Eu me distraí com o tamanho daquela bunda enquanto ela olhava a geladeira.
- Estou falando com você! - Aline gritou do outro lado da linha.
- Tá, desculpa, me distraí com o tamanho da bunda da minha mulher, aqui. - Eu falei e ela saiu de dentro da geladeira, com uma pizza velha na mão. - Ana, larga isso, eu vou comprar uma nova.
- Oxe, pra que? Essa tá boa, eu taco no microondas, coloco um ketchup em cima e é nois. - Ela disse e mostrou o polegar pra mim.
- Para com isso, eu vou comprar pizza fresca. Qual seu sabor favorito?
Ana mordeu a pizza gelada.
Gelada!
- Você não fez isso... - Eu falei, com os olhos arregalados.
- O que foi? Você nunca comeu pizza gelada? - Perguntou mastigando, e eu continuava com os olhos arregalados.
- Ana, é tipo uma regra da existência humana: Não comerás pizza gelada. Que porra foi essa? - Eu disse.
Foi naquele momento que eu me lembrei que estava no telefone.
- Julio nunca faria o que você acabou de fazer nesse telefone, seu babaca. Você deveria saber que eu te amo, mas pelo visto, está mais interessado no rabo da sua nova namorada comedora de pizza gelada. Pensei que você aprenderia com minha ausência, mas pelo visto, isso só piorou as coisas.
- Piorou? Piorou porque eu tô tentando seguir minha vida, Aline? - Resmunguei.
Ela desligou na minha cara. Quando fez isso, arremessei o celular longe e fui até a primeira parede que encontrei. Soquei a parede, soquei com tanta força, que quando caí em mim, vi que havia aberto um corte na mão, e estavam completamente ensanguentada. Eu respirei fundo, me sentando no chão e vendo aquela cena ridícula. Me senti um pré-adolescente punheteiro e frustrado, depois de levar um fora da namorada.
Ana largou a pizza na bancada e veio até mim. Ela viu minha mão e assustada, correu até o banheiro e voltou com uma toalha. Ela se ajoelhou ao meu lado e colocou a toalha na mão ferida, meio chocada com tudo que aconteceu mas, de qualquer forma, tentou parar o sangramento. Não disse uma palavra sequer enquanto me socorria, acho que ela ficou com medo. Depois de enrolar bem minha mão, me olhou nos olhos e respirou fundo.
- Cadê o kit de primeiros socorros dessa casa? Isso com certeza vai precisar de uns pontos. - Disse.
- No banheiro.
Ela foi de novo até o banheiro e voltou com um kit de primeiro socorros, ouvi ela batendo as portas dos armários e procurando feito uma maluca. Assim que voltou, abriu a caixinha, tirou a toalha de minhas mãos e começou a limpar com o antisseptico o ferimento que fiz em mim mesmo.
- Quer falar sobre isso? - Perguntou. - Isso foi bem idiota da sua parte. Mas se quiser falar...
- Na verdade, não. - Respondi.
- Tudo bem. Só me deixa limpar essa merda que você fez. Caralho, qual seu problema? Você achou que tinha mais força que a parede de tijolos da sua casa? Seu prepotente. - Ela riu com a própria piada.
- É, mas eu fiz um estrago, olha só, ficou quase que um buraco. - Apontei com minha cabeça e ela olhou para a parede, rindo.
- Realmente, a parede quase caiu. Essa sala provavelmente estaria em conceito aberto com a rua se eu não tivesse aparecido.- Ela disse de forma brincalhona.
- Foi culpa sua, Ana. Você mordeu a pizza gelada e eu fiquei nervoso. - Falei, zombando. Ela riu de novo.
- Eu nunca mais vou morder pizza gelada na sua frente. Até deixo você comprar uma fresquinha, vai. Contanto que eu possa encher de ketchup...
Depois que ela terminou de ajeitar minhas duas mãos, ela se encostou na parede, sentada, e me olhou de forma carinhosa.
- Por que tá me olhando com essa cara? - Questionei. - Tá com pena de mim?
- Você parece estar bem destruído. Eu já passei por isso aí. Por mais piadista que eu seja, eu sei o que é querer socar a parede ou arrancar o reboco na base do grito, sabe? Então, se você quiser conversar... Posso ser sua amiga. - Acho que foi a coisa mais séria que ela falou desde que nos conhecemos.
- Valeu, menina. - Falei e me levantei. - Agradeço pelo cuidado. Mas esqueça o que acabou de acontecer aqui, tá? Eu sou explosivo às vezes e minha ex me irrita ao ponto de eu querer quebrar a cara dela, e aí, pra não quebrar a cara dela, eu quebro as coisas.
- Contanto que você não quebre pessoas... - Ela arregalou os olhos e se levantou, indo em direção a porta.
- Vou ser sincero... Em mulheres eu não bato, não. Minha mãe me ensinou bem. Mas em homem... - Soltei minha gargalhada típica e sádica. Ela arregalou os olhos mais uma vez e fez o sinal da cruz.
- Creio em Deus pai, todo poderoso. - Ela falou. - Brincadeira. Não me batendo, eu não tô nem aí. - Riu e saiu do quarto. - Ah, minha pizza favorita é de muçarela, mesmo! - Ela deu um berro.