A parte de mim que acredita que ele não violaria as leis de trânsito propositalmente e é um bom homem está constantemente entrando em confronto com aquela que acredita que ele não passa de mais um homem imprudente. E convenhamos que seria bem mais fácil acreditar na segunda opção se ele não tivesse me contado que sonha em ser professor de crianças e pré-adolescentes. Agora tudo que passa pela minha mente é seu olhar arrependido e o momento em que tentou se explicar, mas o cortei.
Abro a nossa conversa e vejo a sua última mensagem. Eu não o respondi ainda e enquanto digito um "talvez eu possa apresentá-lo a você", pergunto-me se deveria enviá-la. Mordo o lábio inferior apreensiva e instantes depois balanço a cabeça negativamente, apagando a frase. Quais as chances de ele pensar que estou com segundas intenções? Afinal, ele não sabe que namoro. O plano é: enviar o orçamento para ele e esquecer a sua existência, não importa quão intrigante ele seja!
Bufo frustrada e bloqueio a tela do celular, vendo minha amiga me fitar com o cenho franzido e um grande ponto de interrogação estampado no rosto. Já tinha acabado as nossas aulas e paramos para lanchar, aproveitando que ainda não tinha começado meu expediente. Pego meu hambúrguer nas mãos e ela arregala os olhos quando lanço duas mordidas enormes no mesmo. Eu e minha mania de descontar tudo na comida.
- Credo, Pâmela - ela diz horrorizada. - O que aconteceu?
Eu conheci Anabel na faculdade e apesar de convivermos há mais de um ano, eu ainda tenho dificuldade em contar coisas que acontecem na minha vida pessoal e isso inclui, é claro, o que houve dois dias atrás, por conta disso, é com muita relutância que me convenço a desabafar sobre o assunto e pedir conselhos.
- Domingo um cara ultrapassou o sinal vermelho e colidiu com meu carro.
- Misericórdia! Tá explicado porque você anda tão mal-humorada ultimamente, eu também ficaria puta. Se bem que... - abre um sorriso amarelo - aquele seu carro já tá nas últimas, né?
Reviro os olhos. Nem tá tão velho assim.
- Tá, mas não é por isso que estou assim. O cara se chama Lorenzo e estuda na nossa faculdade. Ontem nós conversamos um pouco e ele não é uma má companhia. Eu fico vendo os status dele e sinto vontade de conhecê-lo, sabe?
- Mas você não namora, amiga? - pergunta confusa, mexendo no seu macarrão e levando uma garfada até a boca.
- Sim e juro que não é com segundas intenções. - Beberico um pouco de suco e pego o guardanapo para limpar meus lábios. - O que você faria?
- Ai, não sei, amiga. Só segue seu coração. Se é isso que você quer, vai e faz.
- Droga - praguejei.
E como se tivessem ouvido minha amiga, visualizo Lorenzo cruzar a porta do restaurante junto com um grupo de rapazes. Todos conversam animadamente e é extremamente clichê a forma como as pessoas ao nosso redor param o que estão fazendo para encará-los, como se somente a presença deles fosse capaz de alterar a órbita do planeta.
- Eu sei que meus conselhos não são tão bons, mas...
- Anabel, não é isso - resmungo em um sussurro enquanto me escondo debaixo da mesa para que não seja vista. Minha amiga ergue a toalha de mesa branca, e vejo o grupo sentar em uma mesa a poucos metros de distância de nós. - Ele está aqui, atrás de você.
A mulher gira o corpo na velocidade da luz, e bato a mão na testa, chocada com sua sutileza.
- Qual deles, amiga?
- O de cabelo preto que tá com uma camiseta branca e calça preta.
Ergo a cabeça para vê-la, e ela volta-se para mim sorrindo largamente.
- Mulher, mas gostoso desse jeito até eu quero conhecê-lo. - Pega o cardápio e se abana. - E com segundas intenções e tudo.
Dou risada e meu celular vibra em cima da mesa, puxo-o e abro a nova mensagem de Lorenzo.
Como está o clima embaixo da mesa? [12h33m].
Sinto minha pele ruborizando e subo vagarosamente, arrumando minha postura na cadeira e escondendo o rosto com as mãos. Deus, se quiser me levar, essa é a hora.
- Você tá parecendo um pimentão - comenta Anabel quando abaixo as mãos.
- Ele me viu e me mandou uma mensagem.
- Sério? Deixa eu ver. - Em um minuto, Anabel está pegando o celular de minhas mãos e no outro está digitando uma resposta. Ela sorri perversa e me entrega de volta o aparelho. - De nada, gata.
- "Não tão bom quanto deve ser no seu colo"? - leio a resposta em voz alta e arregalo os olhos. - Eu namoro, sua louca!
- Então passa meu telefone pra ele, boba - pede, com os olhos brilhando em expectativa. - Sério, eu ficaria te devendo pra sempre.
- Meu Deus, você não tem jeito mesmo.
E antes que eu possa corrigir a burrada que minha amiga fez, ele me responde.
Não brinque com fogo se não estiver pronta para incendiar de prazer, baby [12h46m].
Minha boca seca e olho para Lorenzo. Suas pernas estão afastadas uma da outra e sua mão tatuada e cheia de anéis está em cima da sua coxa direita. Ele me olha intensamente e passa a mão por ela em um convite discreto. Sinto minha pele queimar e por um momento, me imagino com minhas pernas envolta de seu quadril e meus dedos presos em seu cabelo. Aperto minhas coxas uma contra a outra e desvio o olhar.
- É, amiga, você tá muito fodida - diz Anabel, que eu nem havia reparado, mas assistiu toda a cena.