Carros atolados e brigas na chuva
img img Carros atolados e brigas na chuva img Capítulo 5 Realmente, um idiota
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Capítulo 6 Estranho, mas estranho de um jeito bom img
Capítulo 7 O que foi que eu fiz img
Capítulo 8 Terreno conhecido img
Capítulo 9 Era para ser a minha vida de sempre img
Capítulo 10 A festa img
Capítulo 11 Hormônios img
Capítulo 12 Eu só quero paz img
Capítulo 13 Mudanças img
Capítulo 14 Verdadeiramente surpreso img
Capítulo 15 Ele não é nada além de um incômodo img
Capítulo 16 Esclarecimentos img
Capítulo 17 Uma noite juntos img
Capítulo 18 Vai me dar a chance img
Capítulo 19 Muito para viver img
Capítulo 20 Optei pelo silêncio img
Capítulo 21 Foi assim que acabou img
Capítulo 22 Endurecer img
Capítulo 23 Um encontro muito inesperado img
Capítulo 24 Não era a mesma coisa, mas era o mais próximo que eu podia chegar img
Capítulo 25 Uma nova rotina img
Capítulo 26 Eles sempre seriam irmãos img
Capítulo 27 Sonhos reais img
Capítulo 28 Os homens sempre seguem em frente img
Capítulo 29 Palavras de amiga img
Capítulo 30 Só um fim de semana img
Capítulo 31 Tão perto e uma vida inteira de distância img
Capítulo 32 Nosso problema img
Capítulo 33 Alívio e culpa img
Capítulo 34 Agora é para sempre img
Capítulo 35 Epílogo img
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Capítulo 5 Realmente, um idiota

Os bolinhos eram realmente bons, mas ficavam melhores ainda junto com o café - como Chico tinha falado. Saboreei minha refeição olhando a paisagem.

- Sei que não somos amigos. – Kaio começou depois de vários minutos.

- Não somos. – concordei sem virar para olhar para ele.

- Mas eu queria perguntar mesmo assim. – ele fez uma pausa e eu virei o rosto – Vai terminar com ele?

Toda minha tranquilidade se fechou.

- Isso realmente não é da sua conta.

- Esse é um modo de dizer que você não vai terminar com ele? – a voz de Kaio soou um pouco irritada.

- Esse é o modo como eu coloco um limite entre isso aqui. – apontei de mim para ele algumas vezes.

Ele se levantou, balançando a cabeça e sorrindo.

- Isso é tão ridículo que não tenho nem o que comentar.

- Você não deveria comentar porque não é da sua conta. – fiquei em pé também.

- Clara, pelo amor de Deus. – ele colocou as mãos na cabeça – Como você pode não ver o quanto esse cara é um idiota?

- Eu conheço o meu namorado. – esbravejei – Você não sabe nada sobre ele, nem sobre nós dois para ser sincera.

- Eu conheço ele. – Kaio continuou irritado, a testa franzida – Você pode ter coisa melhor. Clara, você saiu debaixo da maior tempestade da vida porque ele não te deixa segura.

Era verdade, mas eu não queria dar razão. Já tinha agradecido Caio e era só o que eu estava disposta a fazer.

- Por que se importa? – rebati, me controlando para não gritar.

Isso o fez calar a boca.

- Tem razão, eu não deveria me importar. – seu rosto relaxou – Eu não me importo.

Com isso ele entrou na casa e subiu as escadas correndo.

Aquela discussão cutucou um ponto muito importante dentro de mim. Eu não confiava mais em Xande há um tempo, não confiava em nós dois como um casal.

Disparei pela escada e entrei no quarto de Bento sem me preocupar em bater. Agora ele estava deitado na cama – que estava perfeitamente arrumada – lendo um livro surrado.

- Oi? – minha aparição o sobressaltou.

- Preciso do celular. – eu estava ofegante e com o coração acelerado, mas desconfiava que tinha muita pouca relação com o esforço físico – Pode me emprestar? Eu juro que depois pago por tudo isso.

- Tudo bem... – ele respondeu baixo, ainda com os olhos arregalados, e tirou o aparelho do bolso – Não se preocupe em pagar.

- Faço questão. – peguei o aparelho e sai correndo de novo.

Já que Kaio estava no andar de cima, voltei para a varanda e liguei para o número de Xande. Agora que ele sabia que a namorada estava passando por problemas em pleno sábado, atenderia sem demora. Não é? É isso que os namorados fazem.

Os toques se prolongaram infinitamente, e quando finalmente escutei a ligação se completar, havia muito barulho ao fundo.

- Clara?

- Oi, Xande. Oi.

O que eu deveria dizer agora? Como expressar que eu andava sempre insegura e preocupada? Como dizer para o meu namorado de quase dois anos que eu estava ansiosa o tempo todo com essa relação?

- Clara, eu estou aqui no churrasco... – ele falou, já que eu não tinha continuado.

- Sei disso. – respirei fundo – Mas eu estou aqui, no meio do nada em uma fazenda.

- Sinto muito por isso. Mas não tem como eu te ajudar daqui. - curto e grosso – Sinto muito que esteja sozinha.

- Não estou sozinha. Tem a família e Kaio está comigo. – não sei porque falei aquilo, minha cabeça parecia estar flutuando.

- Kaio. – Xande repetiu depois de uma pausa.

- Sim. – confirmei.

Houve mais uma pausa.

- Clara, por que o idiota do Kaio está com você aí? – a explosão do outro lado do telefone me pegou desprevenida.

Também não esperei reagir da forma como reagi.

- Kaio é um idiota? – falei, indignada – Kaio estava no carro quando atolou. Kaio encontrou um abrigo e me deu a sua jaqueta para eu não morrer de frio. Kaio encontrou a casa. – eu estava tremendo de irritação – E quanto a você, Xande? Você nem atendeu o telefone.

- O que quer dizer com tudo isso? – ele rebateu, igualmente irritado – Kaio é o salvador da pátria e eu um nada?

- É, ele salvou o mundo ontem. – concordei, já completamente esquecida de manter a voz baixa.

- Pois bem, que bom que ele estava aí então. – Xande estava verdadeiramente com raiva, o que me deixava cada vez mais irritada.

Me sentei na cadeira em que estivera minutos antes. E eu achava que o dia anterior é que estava muito ruim.

- Você é um idiota. – dessa vez saiu baixo.

- Como é? – não parecia que ele não tinha escutado, mas que queria ter certeza.

- Você. É. Um. Idiota. – falei pausadamente.

Houve um momento de silêncio, onde ouvi a bagunça do churrasco do outro lado, depois Xande falou com sua voz mais fria possível.

- Ótimo. Você acabou de ficar livre desse idiota.

E desligou.

Coloquei o celular na mesa com a mão trêmula, me levantei e corri em direção ao projeto de alguma coisa onde tínhamos passado a noite anterior, sentindo os pingos do início de outra chuva.

Só então resolvi chorar. E muito.

Chorei por todos os telefonemas estranhos, pela ausência dele no último ano que tinha me magoado tanto, pelas últimas palavras que tínhamos trocado. E também por ter atolado o carro e estar abusando da boa vontade de pessoas gentis como aquelas. Eu odiava admitir, mas estava chorando até por ter enfiado Kaio nessa enrascada.

- Clara? – não fiquei totalmente surpresa por ele aparecer justo naquele momento. Kaio era campeão nisso.

- Você está certo. Ele é um babaca, vem sendo um babaca há pelo menos um ano. – as lágrimas estavam escorrendo pelo rosto – Agora acabou, certo? De um jeito horrível e por telefone.

Kaio estava com uma expressão preocupada.

- Obrigado por ter me defendido.

Gemi, segurando os cabelos.

- Eu e minha boca grande!

- Na verdade eu estava na janela logo acima da varanda. Não foi culpa sua. – ele encolheu os ombros – Eu só... Obrigado por ter me defendido daquele jeito.

Sentei no chão, cansada.

A chuva estava apertando, embaçando tudo num tom levemente esbranquiçado – outra vez. Eu nem queria pensar no que isso significava para a ponte caída.

- Só fui sincera. – continuei, ainda chorando – Você é uma pessoa decente, mesmo que a gente se odeie eu sei disso. Você não deixaria sua namorada preocupada, insegura ou sem saber sobre o que realmente você sente. Você, com certeza, não estaria num churrasco enquanto sua namorada está no meio do nada.

Kaio ficou parado, apenas observando.

- É, eu realmente não faria nada disso.

Juntei os joelhos no peito e apoiei a cabeça neles.

- Olha, eu não quero bancar o, sei lá, espertinho ou qualquer coisa. – escutei os passos dele se aproximando – Mas você está melhor sem ele. E, um dia, vai encontrar alguém que não faça você se sentir tão mal.

Continuei imóvel, e instantes depois senti o corpo de Kaio sentando ao meu lado. Não era como a noite anterior, onde ele queria me aquecer, mas não era com a mesma distância de sempre também.

Percebi, com estranheza, que ele estava tentando me consolar de todas as formas que sabia.

- Vamos dar uma trégua dessas brigas todas. – sugeriu, antes de passar o braço por trás da minha cabeça – Vamos fingir que a gente não se conhece a vida toda.

Cedi e ergui a cabeça. Kaio me deu um pequeno sorriso encorajador.

Antes de perceber o que estava fazendo, senti minha cabeça apoiar em seu ombro. Se encaixou bem ali, então não foi estranho quando sua mão começou a subir e descer pelo meu braço.

Na verdade, ele era bom em consolar.

                         

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