Seu corpo aos poucos foi ficando menos trêmulo. Ofereço meu melhor sorriso aconchegante para minha melhor amiga e vou deslizando minha mão sobre seu rosto até retirar as poucas madeixas que haviam caído sobre sua pele.
- E-Eu não sei como dizer isso, eu não consigo nem acreditar ainda que isso aconteceu. Por quê comigo, Aimée? - Ela funga e eu volto a abraçá-la. Não sei exatamente o que havia acontecido, mas pela sua reação é algo realmente grave.
Afasto-me de seu corpo aos poucos e levanto do sofá para pegar um copo d'água com açúcar. Abro a geladeira e pego um litro com água gelada e um copo limpo do armário. Coloco sobre a bancada enquanto observo-a de longe abraçar uma almofada, a única que fazia companhia ao sofá. Despejo o líquido e logo fecho a garrafa, devolvendo-a para a geladeira. Coloco duas colheres de açúcar sobre a água transparente e volto para a sala, abaixo-me sobre ela e estendo-lhe o copo, que a mesma pega de bom grado.
Após bebericar um pouco do líquido, ouço ela respirar profundamente diversas vezes como se estivesse preparando-se para contar tudo que havia acontecido. Somos bastante apegadas uma a outra, mas desde sua última briga com Felipe, há quatro semanas, ela veio ficando distante e talvez essa fosse a explicação.
- Lembra da minha briga com Felipe algumas semanas atrás? Eu não te contei, mas fui pra balada com uma colega de trabalho. Eu estava muito raivosa, queria apenas me divertir e esquecer por um momento do ciúme idiota que ele sentia por mim. Eu não lembro de muitas coisas, são apenas flashes de lembranças. - Soluça e eu aperto sua mão. Não irei cobrar nada dela, se ela quisesse continuar, faria isso por si própria. - Eu não bebi muito, te juro, Aimée. Eu lembro que tomei três copos de caipirinha e logo em seguida essa colega de trabalho veio com uma batida de morango pra mim, eu juro que foi somente isso que eu tomei. Juro.
Retiro o copo da sua mão que estava tremendo e coloco sobre o chão, enquanto seguro em suas duas mãos, apertando-as com força e trazendo-lhe toda confiança e apoio possível. Então logo ela continua a falar:
- Depois que eu tomei essa bebida, lembro somente desses flashes. Eu dançando com alguém e logo um vazio negro aparece em minha mente. Eu acordei no dia seguinte em um quarto de hotel, sem saber onde estava e com quem estava, e agora eu... eu estou grávida. Grávida e sem saber quem é o pai. Como eu pude ser tão otária?
Volto a abraçá-la e tento engolir tudo que ela havia me dito. Algo bastante pesado para uma pessoa frágil e sensível como ela aguentar. Enquanto Bel estava me contando o que havia acontecido me veio à mente o quão nós mulheres somos frágeis e somos as que mais sofrem no mundo. Quando nesse mundo, nós mulheres, poderemos ir para uma festa sem medo algum? Usar a roupa que quisermos sem ser assediada?
Hoje em dia é bastante difícil ser mulher, pois o medo sempre nos assola quando saímos tarde do trabalho, ou da faculdade, ou quando tiramos um tempo para descansar e amenizar a mente e o receio de uma bebida batizada nos aflige.
Após fazer com que Bella acalmasse-se, volto a me sentar do seu lado e faço com que ela deita sobre o sofá e encostasse sua cabeça em meu colo.
- A culpa não é sua, Bel. Você foi drogada por alguém e essa sua colega de trabalho ajudou, você é apenas a vítima dessa história, amiga. Jamais pense que se você não tivesse ido à festa nada teria acontecido, os únicos responsáveis que deveriam se sentir culpado é o imbecil que batizou sua bebida e a sua colega de trabalho, do qual vamos correr atrás pra tirar tudo a limpo e denunciar.
Falo calmamente para deixá-la mais leve e ela levanta do meu colo de súbito, enquanto me encara amendrontada com seus olhos azuis que estavam bem destacados por conta do choro.
- Por favor, Aimée, não. Mexer com essa história só vai acabar comigo. Eu não consigo nem me olhar no espelho direito sem pensar que eu fui pra cama com um completo desconhecido e que agora eu estou grávida. - Seu choque era visível e o medo também. Eu a entendia completamente.
- Ei, calma. Foi sem seu consentimento, Bella. Você não autorizou que te tocassem, você estava sem poder de falar nada, estava impossibilitada, a culpa é somente do idiota que vendo seu estado aproveitou da situação.
Conforto-a e ela levanta do sofá, limpa seu rosto e logo abaixa para pegar o copo d'água no chão, terminando de beber tudo em um único gole.
- Eu não quero esse bebê - avisa, enquanto as lágrimas voltam para seus olhos.