Levanto meio tonta da cama e caminho em passos lentos até o banheiro, Aimée provavelmente ainda dormia, então eu tento fazer o mínimo barulho possível para não acordá-la. Sinto uma dor abaixo do meu ventre e imagino que fosse cólica, quando fui na obstetra a mesma disse que eu poderia sentir isso, mas que deveria me atentar ao nível da dor.
Minha mente estava bagunçada, e a terapeuta disse que era normal isso acontecer. Que apesar de tudo que eu passei, ainda era possível eu sentir afeto pelo feto. Observo minha imagem no espelho a minha frente do banheiro e noto as manchas escuras que minhas olheiras estavam fazendo abaixo dos meus olhos. Ligo a torneira e jogo um pouco de água sobre meu rosto, antes de me afastar para poder tirar minha roupa e fazer xixi, sentia minha bexiga prestes a estourar.
Sento na privada e quando meu olhar recai sobre o algodão da minha calcinha, noto uma quantidade de sangue, o que me faz entrar em desespero total. Eu não sei o motivo, mas eu não queria que aquilo estivesse acontecendo.
- AIMÉEEEEE. - Não percebi quando grito, apenas o faço. Pego um monte de papel higiênico e limpo, bem desengonçada enquanto sinto a dor no meu ventre aumentar.
Eu não queria o bebê. Porque eu sentia um desespero enorme por estar perdendo-o?
- Bella, Bella. - Ouço Aimée me chamar e não consigo me mover, apenas choco compulsoriamente, sentindo as lágrimas grossas molharem meu rosto. - Ei, o que...
Ela para de falar quando observa minha calcinha suja. Não falo, não me movo. Estou em choque e sinto a escuridão querer me atingir. Sinto Aimée me ajudando a reerguer minha roupa e logo pega uma toalha. Aos poucos ela vai me tirando do banheiro e me levando pro quarto, é então que eu volto a consciência e a primeira coisa que me vem na mente é:
- Me leva pro hospital, Aimée. Eu não quero perder o bebê, por favor.
Falo desesperada. Minha amiga me olha sem entender mas não faz perguntas. Ela me senta na cama e sai, em seguida volta com uma bolsa e as chaves de casa. Eu sinto meu corpo mole, e logo minha visão vai ficando apagada e eu não vejo mais nada, apenas a escuridão me atingindo aos poucos.
[...]
Acordo com uma dor de cabeça absurda, sinto-me zonza e minha vista está turva. Observo o quarto em que eu estava e conclui que era de um hospital, ajeito meu corpo e solto um gemido sentindo uma leve pontada de dor como uma cólica em meu ventre, foi então que tudo veio em minha mente e minha mão foi para minha barriga, ao mesmo tempo que um barulho de porta se abrindo chamou minha atenção.
- Ei, como você está se sentindo? - Aimée me observa sorrindo fraco e se aproxima, sentando na poltrona presente ali.
- Bem, um pouco grogue e com cólica, mas bem. O bebê, tá tudo bem? - pergunto meio receosa da resposta.
Sim, no início eu não queria o bebê, não conseguia imaginar um filho fruto de um estupro. Mas, agora, sinto um aperto em meu coração toda vez que imagino perdendo ou tirando o feto que está em meu ventre. Eu não quero tirar o bebê, mas se irei cuidar dele quando nascer ainda irei descobrir.
- Tá sim, tá tudo bem com ele. O médico logo vem nos dizer mais sobre. Fica calma, ok? - Assinto, e chamo-a para mais perto, dando-lhe espaço para ela se sentar ao meu lado na cama.
- Acha que é errado eu não querer tirar o bebê ou perdê-lo?
Indago, segurando em sua mão com uma enquanto a outra mão repousa sobre minha barriga.
- O afeto pode aparecer quando você menos espera. Não se culpe por amar o seu filho, Bella.
Sinto meus olhos arderem e balanço a cabeça. Eu só torço para tudo dar certo.
Uma batida na porta é soada e meus olhos automaticamente se pregam na porta. Observo um médico de jaleco azul claro adentrar o quarto e logo me ajeito melhor na cama.
- Bella Mariolli, correto? Que susto esse bebezinho trouxe a vocês, uh. - Ouço ele falar enquanto olhava uma prancheta que imagino ser a minha ficha. - Você teve um descolamento de placenta, algo que pode vir a ficar grave se você não tiver repouso, e sua pressão aumentou muito. Teve muitas emoções esses dias, Bella? - Eu apenas assinto, esperando que ele continue. - O bebê tá bem, vemos que ele é mais forte do que vocês pensam. Mas, você precisa de repouso total até o fim da gravidez. Tome bastante vitaminas e sulfato ferroso que irei lhe receitar. E na sua próxima consulta de pré-natal, avise sua médica sobre. Tenham um bom dia, senhoritas.
Ao fim, ele avisa que já estou de alta e que é pra Aimée ir assiná-la e pegar as receitas dos remédios passados. Enquanto isso, saio com cuidado da maca e vou trocar de roupa, já que eu estava usando uma vestimenta do hospital. Já imagino que minha melhor amiga não vai deixar eu fazer nada pelos próximos meses.
[...]
Quando chegamos em casa, Aimée liga para a clínica desmarcando nossa ida e eu fui mandada pra cama. Após tomar um banho e tirar todo o cheiro de hospital impregnado em mim, vou pra cama e pego um livro para que eu pudesse ler.
- Entre. - digo quando batem na porta do meu quarto.
Observo o rosto de Aimée adentrar a porta e logo seu corpo entra por inteiro com uma bandeja sobre suas mãos.
- Trouxe um jantar leve pra você, um suco de laranja e suas vitaminas pra tomar. Não esqueça que você está em repouso total, mocinha.
Reviro meus olhos e ergo meu corpo pra pegar a bandeja com cuidado, lhe ofereço um sorriso terno.
Pelo visto a minha rotina vai ser mudada de cabeça pra baixo se depender de Aimée Bezerra.