Capítulo 5 RITA

Umas dessas minhas conquistas pela vida, acaba de entrar por aquela porta, me deixando totalmente estupefato, não poderia me definir como belo, mas atraía a beleza feminina ao meu encontro.

Como ela soube do meu óbito?

Amável Rita, sabor de mel, néctar de vida, a expressão dos sentidos que sempre evidenciaram prazeres, que tantas vezes me fez delirar sem ópio, fazendo me viajar por fantasias indescritíveis.

Descobri como ela veio parar no meu velório, sem nenhuma informação sobre mim, alguém de dentro do hospital onde fora declarado o meu óbito, achou algo de engraçado na minha história, a forma como morri, e passou a informação a um jornalista que noticiou num canal local como motivo de chacota, que um empresário da cidade havia falecido, engasgado por não saber comer peixe, entalado por uma espinha, claro que essa notícia não era verdade, provavelmente eu tenha morrido por um enfarto fulminante.

Deve ter sido através do noticiário que Rita ficou sabendo e descobriu meu endereço.

Rita entra no recinto em prantos, revelando segredos guardado por anos, como joia preciosa que não se pode ser admirada por mais ninguém, era desesperadamente demasiado o seu choro, que até mesmo comoveu os mais sensíveis ali, ela falava:

- Você me abandonou seu covarde, não sei viver sem você!

Estarrecido, estupefato, boquiaberto, atônito era meu corpo dentro do caixão, quando ela revelou mais um segredo:

- E agora, meu amor, o que farei com o fruto do nosso amor que está no meu ventre?

Algumas das pessoas que estavam ali velando meu corpo, procurava de alguma forma entender o fio da meada, e se arriscavam a preguntar baixinho e opinar:

- Quem é essa louca?

- Deve ser a amante!

- Ou deve estar no lugar errado!

Mas o que era dúvida, passou a ser certeza, os gritos de Rita ecoavam por toda parte da casa:

- Gaspar! Amor da minha vida, você nem se despediu de mim, seu filho nascerá sem pai!

Pronto, agora ninguém mais tinha dúvidas, era a minha amante e ainda grávida, o meu caráter foi revelado.

Meus filhos que estavam bem distantes da residência jogando bola, pararam e ouviram a gritaria, em unanimidade correram para ver o que era toda aquela algazarra, e ainda conseguiram ouvir as últimas palavras de Rita, o caçulinha logo fala:

- Oba, meu pai vai ser pai de novo, mais um irmão para nosso time!

Alguns até acharam graça do comentário do caçulinha, sorriram disfarçadamente, era algo natural em minha vida saber que seria pai mais uma vez, mas o meu relacionamento com ela era fechado num pacto amigável, que filhos não fariam parte da nossa relação, então ou ela tinha falhado na proteção ou havia quebrado o pacto, mas prefiro que ela tenha falhado, pois caso contrário, ela tinha agido de má fé.

Rita era uma mulher muito especial de uma doçura e ternura inigualável, meus estresses eram descarregados quando eu estava com ela, me fazia esquecer do mundo, era algo sem comparação, não tive tempo de dizer adeus, mas tinha alguns meses que eu não a visitava, por conta do tempo, mas a sua estabilidade era garantida por depósitos mensais pontuais, morava em um apartamento luxuoso em um bairro nobre da cidade, tinha sido o meu presente de agradecimento a ela por me fazer sentir bem.

Madalena minha esposa infiel, sai do seu ninho de amor que eu achava que era somente meu e dela, ela desce a escada com o cabelo despenteado, mal arrumada, na verdade ela parecia estar saindo de uma guerra, mas de certo modo era verdade, momentos atrás ela estava numa luta corporal intensa, mas o seu oponente não era certamente um rival, creio que dessa luta não saíram perdedores, estavam satisfeitos com a performance um do outro.

Ela desce a escada ainda muito ofegante, parecia estar realmente exausta e desgastada, ela era uma mulher muito atraente, mesmo nesse estado lastimoso, ela ainda chamava atenção por sua beleza natural, e depois de ter me dado oito filhos, era um milagre ela estar ainda jovem e bela, ela pergunta:

- O que está acontecendo aqui?

Interrogações à deriva soltas pelos ares, por que Madalena estava daquele jeito? Mas ninguém ousou perguntar.

O meu caçulinha sempre bem atrevido entre os outros irmãos responde sem demora, na verdade aquele acontecimento para ele parecia estar sendo divertido:

- Mãe!

Ele puxava a roupa da mãe, e ela achando que ele não teria a resposta:

- Mãe!

- O que foi menino?

- Meu pai que já era vai ser pai!

- Para com isso caçulinha, eu não estou grávida!

Alguns até achou graça em silêncio por causa da situação:

- Mãe, mas o filho não é seu, é dela!

Ele fala apontado para Rita, Madalena grita:

- O quê?

Rita muito mais calma agora, mas, ainda meio desconsolada, minha amável Rita, agora sozinha e ainda esperando um filho meu, sem o meu apoio, é muito triste para mim, incapacitado sem poder fazer nada por ela, essa sim, me amava de verdade!

Eu gostava de ouvir ela me chamando de meu amor, mesmo depois de morto, eu ainda gostava, mas, Madalena queria saber quem era aquela mulher:

- Quem é a senhora, de onde você conhecia o Gaspar?

Rita que já não estava tão em desespero, responde à pergunta de Madalena com outra pergunta:

- Há, a senhora quem é, deve ser a bruxa que o Gaspar tanto tinha medo?!

- O quê?

Madalena não conseguia acreditar no que estava ouvindo:

- Quem é a senhora para vir me ofender na minha própria casa?

- Gaspar falava que você era uma bruxa muito feia e malvada, mas acho que ele me enganou, não vejo feiura em você, mesmo desse jeito, toda desarrumada e despenteada, você ainda é bonita!

- Canalha, safado, me traía e ainda me chamava de bruxa!

Ela falava tentando me levantar do caixão para me dar um tapa na cara, mas as pessoas que estavam ali, a seguraram para ela não me fazer cair do caixão. Naturalmente aquela revelação era uma bomba e por isso Madalena estava tão transtornada:

- Quem é você, sua sirigaita?

Rita agora parece ser a dona da razão, muito controlada, não parecia mais a mulher desesperada de minutos atrás, e responde calmamente:

- Eu me chamo Rita, mas estou aqui porque seu marido vai ser pai e eu fiquei sabendo que ele havia morrido, vim me despedir dele, eu não sabia que ele era casado até pouco tempo, ele me enrolou por algum tempo, depois eu descobri, mas não consegui mais sair dele.

Agora sim, eu não sabia se aquela mulher era amável ou uma interesseira de carteirinha, eu estava conhecendo uma outra Rita, percebi que aquilo tudo era uma encenação para chamar atenção de Madalena, até mesmo aquela barriga que já estava bem saliente poderia ser falsa.

Um dos meus filhos pergunta para Madalena:

- Mãe meu pai vai ser pai mesmo, essa mulher está mesmo com nosso irmão na barriga?

- Não sei garoto!

- Meu pai que já era, era uma fera para fazer neném!

- Cala boca garoto!

- Tá bom mãe!

Quando as crianças ouviram Madalena sem paciência, e já conheciam a mãe muito bem quando estava nervosa, resolveram então escapulir dali sem mais demora, foram buscar divertimento bem distante da casa, voltaram a jogar bola, mas sabiam que logo enterrariam seu pai dando o último adeus.

Eu aqui com meus botões inexistentes, me pergunto: - Será que essas crianças algum dia sentiriam minha falta?

Rita fala mais uma vez:

- Eu conheci Gaspar, não usava anel de casado, veio com o falar sedoso, com as mãos cheias de dedos, um olha que me conquistou, só notei boas intenções, até em casamento falou!

Agora pronto, acabou minha reputação de bom moço!

Ela continuou:

- Eu não resisti e caí na lábia do safado, mas quando eu comecei a desconfiar de algumas coisas, eu tive a certeza em um dia que ele esqueceu de tirar a aliança, o cara era tão safado que a aliança não deixava marca no dedo dele, eu encostei ele na parede, me confessou que era casado, mas me convenceu que a sua esposa era uma bruxa malvada, e que estava com ela somente por causa das crianças, e que não tinha mais nada com ela, dormiam em quartos separados.

- Canalha safado! – Grita Madalena

- Por essa razão que eu continuei com ele, mas hoje estou vendo que ele era o puto de um mentiroso!

Como doeu aquelas palavras de Rita me chamando de canalha! Eu era apenas um homem que diversificava os relacionamentos de forma terceirizada.

Madalena gritou comigo no caixão, nem ao menos eu poderia me defender, colocar meus questionamentos em pauta para arrazoarmos.

Nesse momento deixei de ser ateu, pedi a Deus um sinal da sua fidelidade a um desamparado sem defesa, se ele existisse mesmo que mudasse o rumo dessa história.

Não é que ele me ou ouviu, ou foi pura sorte, mas sorte não era, se não, estaria vivo ainda!?

                         

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