Lucian, nascido sob a sombra de um nome poderoso, foi forjado no fogo da tragédia e na perversidade do desejo. Desde cedo, aprendeu que a dor é uma moeda, uma ferramenta que, nas mãos certas, pode comprar qualquer alma. Quando o corpo do pai foi engolido pela estrada, e sua mãe Evangeline se perdeu nos braços do vício, Lucian viu o mundo se despedaçar - mas ele não chorou. Ele aprendeu. Descobriu, naquele momento, que o caos pode ser moldado, que a desordem pode ser seu playground. O hedonismo que abraçou não é o simples prazer dos sentidos; é o domínio completo sobre o destino dos outros, como um Deus menor que brinca com suas criações.
Selene, por outro lado, é a vítima do próprio idealismo. Não há nada mais trágico, nem mais patético, do que alguém que acredita no poder redentor do amor. Ela o confunde com uma salvação, algo divino, quando, na verdade, o amor é a prisão dourada que a cega. Em Lucian, ela não enxerga o carrasco, mas o amante incompreendido. Selene não apenas ama; ela se sacrifica, como se o sofrimento fosse a própria virtude. E como muitas almas que se deleitam em sua própria tragédia, ela se entrega a ele de corpo e alma, acreditando que o prazer, ou talvez a dor, que sente ao lado de Lucian é a verdadeira essência da vida. Ela é manipulada porque escolheu sê-lo. Acredita que sua submissão é um ato de devoção, quando, na verdade, é o último suspiro de sua identidade.
Cassian, o mais jovem, observa tudo de fora, com uma inocência que, no final, também será sua ruína. Ele é o tipo de homem que acredita no bem, mesmo quando o mal o cerca como um manto sufocante. A cada gesto de bondade, a cada tentativa de salvar Selene ou de alcançar Lucian, ele se afunda mais profundamente no abismo. Ele é tão manipulável quanto qualquer um deles, talvez mais, pois não vê o mundo pelo que ele é, mas pelo que ele gostaria que fosse. Cassian, em sua luta para salvar o que resta de sua família, é a verdadeira tragédia. Sua bondade, ao contrário do que pensam os tolos, não o redime. Ela o condena.
A sociedade que os cerca é apenas uma plateia apática, aplaudindo as mentiras que contam a si mesmos enquanto abraçam seus próprios vícios. Não há heróis aqui. Nem mártires. Apenas seres humanos, cujos desejos e fraquezas os arrastam para o fundo do poço. Lucian, Selene e Cassian são o reflexo de todos nós, jogados em um espetáculo decadente, onde o hedonismo não é uma escolha, mas uma inevitabilidade. O que os faz odiados não são suas ações - qualquer um pode ser cruel ou egoísta. O que os torna detestáveis é o fato de que, no fundo, eles sabem o que são, sabem o que querem, e mesmo assim continuam.
Cassian Thorn sempre foi uma marionete nas mãos do irmão, movido pelas cordas invisíveis de uma submissão que ele mesmo nunca soube identificar. Era como uma criança que volta à casa da mãe, depois de ser negado por ela, buscando consolo onde só encontra o eco de suas próprias frustrações. A casa de Lucian sempre teve esse poder sobre ele, uma espécie de refúgio tóxico, onde o desespero de Cassian se dissolvia na frieza calculada de seu irmão mais velho. Ele chegava ali como um cão perdido, implorando por um afago, mesmo sabendo que o dono não lhe daria mais do que o necessário para mantê-lo cativo.
Lucian, por sua vez, observava tudo. Desde a maneira como Cassian entrava ofegante, os olhos marejados de desespero, até o momento em que, inevitavelmente, ele cedia. Era sempre o mesmo. Cassian tropeçava nas próprias emoções, a voz trêmula como a de uma criança que implora, e Lucian permanecia imóvel, impassível.
- Eu não sei mais o que fazer, Lucian. - A voz de Cassian quase se quebrava no fim da frase, os olhos baixos, evitando encarar o irmão.
Lucian não respondeu de imediato. Ele deixou que o silêncio se prolongasse, uma tática já ensaiada tantas vezes e que dera certo. Quando finalmente falou, a voz saiu calma, quase suave, como um veneno que escorre lentamente.
- Você sabe o que fazer, Cassian. Sempre soube. - Seus olhos eram um poço de escuridão, impenetráveis.
Cassian se lançou nos braços do irmão como uma criança busca o colo materno. Era um abraço longo, sufocante, mas havia algo de mórbido ali. Lucian mantinha as mãos firmes nas costas de Cas, enquanto seus lábios se curvavam num sorriso que Cassian não podia ver. O mais novo sentia o aperto, a falsa sensação de segurança, como se naquele abraço houvesse a promessa de que tudo ficaria bem. Mas as palavras de Lucian, sempre mortas, vazias, eram promessas quebradas antes mesmo de serem pronunciadas.
- Eu preciso da sua ajuda... - Cassian murmurou contra o ombro de Lucian, a voz fraca, carregada de súplica.
- E eu estou aqui, Cassian. Sempre estarei. - Lucian não precisou dizer mais nada. Ele já sabia que, no momento em que Cassian cruzou aquela porta, estava à mercê dele. Como sempre.
Cassian, como um cordeiro, acatava cada ordem, cada gesto. Ele não via a maldade no irmão. Não enxergava o veneno que lhe corria nas veias. Lucian sabia disso, e era exatamente isso que o tornava tão poderoso e manipulador. Cassian tentava, vez ou outra, consertar o que via como falhas no irmão. Como se sua bondade pudesse resgatar Lucian de si mesmo.
- Eu só quero que você volte a ser como antes, Lucian... como quando éramos crianças.
Lucian riu. Um riso frio, que não combinava com o calor do abraço que ainda o prendia.
- Você nunca entendeu, não é? Não há volta. Isso aqui é o que sou. - E soltou o irmão, deixando-o cair em um abismo emocional que só ele parecia controlar.
Cassian, influenciável como sempre, se afastou, os ombros caídos, mas a fé cega ainda intacta. Ele queria acreditar que, de alguma forma, sua presença poderia mudar Lucian. Queria acreditar que seu irmão não era o monstro que todos viam, mas apenas um homem ferido, precisando de redenção. Ele via isso, mas não enxergava.
- Vamos, irmão. Você só precisa de tempo. - Cassian dizia isso mais para si mesmo do que para Lucian, buscando encontrar esperança nas ruínas da relação deles.
Lucian o observou em silêncio por mais um momento, satisfeito com a influência que exercia. Cassian era, e sempre seria, sua marionete, dançando ao ritmo das cordas que ele puxava.
- Talvez, Cassian. Talvez o tempo conserte tudo.
Mas a verdade, que Lucian nunca diria, era que ele gostava exatamente do que eram: um jogo de poder, onde ele sempre saía vencedor e Cassian sempre perdia, sem ao menos perceber.
Lucian observou Cassian se debater emocionalmente em seus braços, como sempre fazia. Ele sabia que aquele abraço não era a verdadeira razão da visita do irmão mais novo. Cassian não estava ali apenas por sua própria fragilidade, mas por algo mais profundo, mais sombrio. O instinto manipulador de Lucian pulsava em suas veias, e ele decidiu afiar suas palavras como uma serpente prepara suas presas antes de um bote.
Soltando Cassian com uma falsa gentileza, Lucian tomou um gole de seu whisky e perguntou, sem tirar os olhos do irmão:
- O que te atormenta de verdade, Cassian? Não me venha dizer que é só o peso do mundo. Você não estaria aqui, comigo, se fosse apenas isso.
Cassian desviou o olhar, como uma criança pega em flagrante. Havia algo que ele não queria dizer, mas que estava prestes a explodir de dentro dele. Lucian sabia o que vinha. Sabia exatamente o que estava corroendo o irmão por dentro, mas decidiu esperar. Ele gostava de assistir o momento em que o veneno começava a fazer efeito.
- É Selene... - a voz de Cassian quebrou o silêncio. - Ela está... diferente. Eu não sei mais o que está acontecendo entre nós.
Lucian arqueou uma sobrancelha, fingindo surpresa, mas por dentro se deliciava com a confissão. Ele poderia trabalhar com isso, moldar a situação a seu favor. Como uma víbora que lentamente circunda sua presa, ele aproximou-se de Cassian e falou com um tom quase paternal, mas carregado de insídia:
- Diferente? Como assim, diferente? O que está fazendo você pensar isso, Cas?
Cassian passou as mãos pelos cabelos, o desespero visível em cada gesto, e começou a desfiar suas preocupações. Selene estava distante, fria. Não o tocava mais como antes. Havia algo entre eles que parecia... errado.
Lucian escutava com atenção, seu olhar fixo no irmão. A cada palavra que saía da boca de Cassian, ele plantava uma nova semente de dúvida. Quando finalmente Cassian terminou de falar, Lucian sorriu, um sorriso venenoso, e se inclinou levemente para frente.
- Você acha que isso é normal, Cassian? Que uma mulher que está supostamente apaixonada deveria agir assim? - Sua voz era baixa, mas carregada de uma malícia sutil. - Você está aqui, desesperado, chorando no meu ombro, enquanto ela... quem sabe onde está. E com quem.
Cassian franziu o cenho, confuso.
- O que você está insinuando?
Lucian soltou uma risada suave, como se estivesse quase lamentando pela inocência do irmão.
- Ah, Cassian... não sou eu quem estou insinuando. É você. Você que está me dizendo que algo está errado. E, me diga... você já se perguntou o que ela faz enquanto você não está por perto? Já pensou que enquanto você está aqui, afogado em suas emoções, alguém pode estar lá, à espreita, esperando o momento certo para... se aproveitar?
Cassian deu um passo para trás, como se tivesse levado um golpe. As palavras de Lucian cortaram fundo. Ele queria, desesperadamente, rejeitar essa ideia. Selene o amava, não amava? Mas as dúvidas, as malditas dúvidas, começaram a crescer dentro dele, enraizando-se em seu coração como ervas daninhas.
- Não... ela não faria isso. Ela não é assim, Lucian.
Lucian se aproximou novamente, colocando uma mão pesada no ombro do irmão, como se quisesse confortá-lo, mas o gesto era apenas uma nova forma de dominá-lo.
- Tem certeza disso, Cassian? Tem mesmo? Porque pelo que você me diz, parece que ela já começou a te deixar de lado. E quem sabe o que ela faz quando você não está vendo. - A voz de Lucian era sibilante, um veneno escorrendo lentamente pelo canto da boca. - Talvez já tenha alguém esperando nas sombras, alguém que ela encontra enquanto você está fora, tentando ser o bom homem, o bom noivo.
Cassian lutava contra aquilo. Ele queria acreditar que era apenas paranoia, que Lucian estava exagerando. Mas o irmão tinha uma habilidade única de fazer as palavras parecerem verdades inevitáveis, e cada frase dele se impregnava na mente de Cassian como um eco que se recusava a morrer.
- Eu não... - Cassian balbuciou, mas as palavras lhe faltavam. Sua mente estava confusa, e o veneno de Lucian estava fazendo efeito.
- Não se engane, Cassian. Eu sei que você quer acreditar no melhor, mas... enquanto você se convence disso, enquanto você está aqui, ela pode estar com alguém. Alguém que talvez ela prefira. - Lucian deu de ombros, como se a possibilidade fosse apenas uma constatação óbvia. - E o que você fará quando isso acontecer? Quando finalmente perceber que, enquanto você está lutando para consertar as coisas, ela já desistiu?
O golpe final foi desferido com uma crueldade calculada. Lucian sabia que Cassian estava à beira do colapso emocional, e a dúvida que ele plantava agora se tornaria uma sombra permanente na mente do irmão mais novo.
Cassian desmoronou. Ele começou a duvidar de tudo. De si mesmo, de Selene, do futuro que sonhava construir. A influência de Lucian era como uma teia que se fechava ao seu redor, e ele não conseguia mais escapar.
- Eu... eu não sei, Lucian. Não sei o que fazer... - A voz de Cassian era um sussurro quebrado.
Lucian o puxou para um último abraço, um gesto frio de possessão. Ele era o maestro daquela destruição, o irmão que sempre ditaria as regras, mesmo que Cassian nunca visse a traição em seus olhos.
- Eu estou aqui para você, Cas. Sempre estarei. E se ela te trair... - Ele parou, deixando as palavras suspensas no ar como uma sentença. - Se isso acontecer, você sempre terá a mim para se apoiar.
E foi assim, com palavras envenenadas e um abraço letal, que Lucian deu o último passo para garantir que Cassian nunca se libertasse de suas mãos.