Capítulo 2 O começo do pesadelo

Clara sempre acreditou que o amor era a força mais poderosa do universo. Cresceu ouvindo histórias de contos de fadas, onde o príncipe salvava a princesa e eles viviam felizes para sempre. Aos 27 anos, ela era uma artista talentosa, com um estúdio pequeno no centro da cidade, onde passava horas criando pinturas que refletiam sua alma sensível e sonhadora. Foi em uma de suas exposições que ela conheceu Ricardo.

Ele chegou ao evento sozinho, vestindo um terno impecável e com um ar de confiança que chamou a atenção de todos. Clara o notou imediatamente - não apenas por sua aparência, mas pela forma como ele parecia genuinamente interessado em suas obras. Ele parou em frente a uma de suas telas, uma pintura abstrata cheia de cores vibrantes e formas caóticas, e ficou ali por longos minutos, como se estivesse decifrando um código.

- Esta é incrível - ele disse, virando-se para ela com um sorriso que iluminou o ambiente. - Você capturou algo que eu não consigo explicar, mas que sinto profundamente.

Clara ficou surpresa. Poucas pessoas entendiam sua arte daquela forma. Eles começaram a conversar, e Ricardo se mostrou um homem culto, bem-humorado e cheio de histórias fascinantes. Ele era advogado, bem-sucedido, e parecia ter uma vida perfeita. Clara se sentiu atraída não apenas por sua inteligência, mas pela forma como ele a fazia se sentir especial.

Nos meses seguintes, Ricardo a conquistou com gestos românticos: jantares à luz de velas, flores entregues em seu estúdio, mensagens carinhosas no meio do dia. Ele parecia saber exatamente o que dizer para fazê-la se sentir amada e desejada. Clara, que sempre fora cautelosa em relacionamentos, se entregou completamente.

No entanto, os primeiros sinais de alerta surgiram discretamente. Ricardo começou a fazer comentários sobre suas roupas, sugerindo que ela se vestisse de forma mais "elegante" para acompanhá-lo em eventos sociais. Depois, passou a questionar suas amizades, dizendo que certas pessoas não eram boas influências para ela. Clara justificava tudo como preocupação e cuidado, afinal, ele a amava, não era?

O primeiro grande incidente aconteceu durante uma festa de amigos. Clara, animada, conversava com um colega de trabalho quando Ricardo a puxou pelo braço, com uma força que a fez estremecer.

- Você está me humilhando - ele sussurrou em seu ouvido, com uma voz gelada que contrastava com o sorriso nos lábios.

Clara ficou chocada. Ela tentou explicar que não havia intenção alguma em suas ações, mas Ricardo se recusou a ouvir. Naquela noite, ele se desculpou, dizendo que estava estressado com o trabalho e que nunca mais agiria daquela forma. Clara acreditou nele, como acreditaria muitas vezes nos meses seguintes.

Aos poucos, o controle de Ricardo sobre sua vida se intensificou. Ele começou a criticar suas escolhas profissionais, dizendo que ela deveria buscar algo mais "estável" do que a arte. Isolou-a de amigos e familiares, convencendo-a de que ele era a única pessoa que realmente se importava com ela. E, quando as palavras não eram suficientes, ele usava a força.

A primeira vez que ele a empurrou contra a parede, Clara ficou em choque. Ele chorou, jurou que nunca mais faria aquilo, e ela o perdoou. Mas a violência se repetiu, sempre seguida de promessas de mudança e gestos de arrependimento. Clara se viu presa em um ciclo de medo e esperança, sem conseguir enxergar uma saída.

Ela se perguntava como tudo havia chegado àquele ponto. O homem que um dia a fizera se sentir a pessoa mais especial do mundo agora a fazia se sentir pequena, insignificante, como se não valesse nada sem ele. Mas, no fundo, Clara ainda acreditava que poderia salvar o relacionamento, que poderia ajudar Ricardo a se tornar a pessoa que ela conhecera no início.

O que ela não sabia era que o pior ainda estava por vir. E que, para escapar, ela precisaria encontrar uma força que nem sabia que possuía.

O pesadelo estava apenas começando.

            
            

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