Capítulo 4 A luz no fim do túnel

A manhã seguinte àquela noite de insônia trouxe consigo uma sensação estranha para Clara. Era como se algo dentro dela tivesse se despertado, uma pequena voz que insistia em sussurrar: chega. Ela não sabia ao certo o que faria, mas sabia que não poderia continuar vivendo daquela forma.

Ricardo, como de costume, havia saído cedo para o trabalho, deixando-a sozinha no apartamento. Ele sempre fazia questão de trancar a porta por fora, alegando que era para "protegê-la". Clara olhou para a fechadura, sentindo um nó se formar em sua garganta. Ela estava presa, não apenas emocionalmente, mas fisicamente.

Foi então que ela se lembrou de um cartão que havia guardado meses atrás, quando ainda tinha um pouco de liberdade. Era o número de uma linha de apoio para mulheres em situação de violência. Ela havia pegado o cartão em um evento na cidade, sem imaginar que um dia precisaria dele. Agora, ele estava escondido em uma gaveta, sob uma pilha de roupas que Ricardo nunca usava.

Com o coração acelerado, Clara pegou o cartão e olhou para o número. Ela sabia que Ricardo monitorava suas ligações, mas talvez, se ela fosse rápida, pudesse fazer a chamada sem que ele descobrisse.

- Você pode fazer isso - ela sussurrou para si mesma, segurando o telefone com mãos trêmulas.

A ligação foi breve, mas suficiente. A voz calma e compreensiva do outro lado da linha a fez sentir um alívio que há muito não experimentava. A mulher que a atendeu explicou que havia um abrigo seguro onde ela poderia ficar, longe de Ricardo, e que eles poderiam ajudá-la a reconstruir sua vida. Clara anotou o endereço e as instruções, prometendo a si mesma que seguiria o plano.

No entanto, escapar não seria fácil. Ricardo controlava cada aspecto de sua vida, desde suas finanças até suas roupas. Ele havia confiscado seu cartão de crédito e deixava apenas uma pequena quantia em dinheiro para compras básicas. Clara sabia que precisaria ser cuidadosa, planejando cada movimento com precisão.

Nos dias seguintes, ela começou a juntar pequenas quantias de dinheiro, escondendo-as em um livro velho que Ricardo nunca olhava. Ela também reuniu documentos importantes, como sua certidão de nascimento e passaporte, e os colocou em uma bolsa que poderia carregar consigo em caso de fuga.

A oportunidade surgiu em uma tarde chuvosa. Ricardo havia saído para uma reunião de trabalho e disse que voltaria tarde. Clara sabia que era sua chance. Com o coração batendo forte, ela pegou a bolsa que havia preparado e olhou ao redor do apartamento pela última vez. Parte dela sentia uma dor aguda ao pensar em deixar tudo para trás, mas outra parte, mais forte, sabia que era necessário.

Ela abriu a porta e olhou para o corredor vazio. A sensação de liberdade foi tão avassaladora que ela quase desistiu, quase voltou para dentro e trancou a porta. Mas então ela se lembrou das noites de choro, dos hematomas que tentava esconder, das promessas vazias que nunca se cumpriam.

- Chega - ela disse em voz alta, como se estivesse afirmando sua decisão para o universo.

Clara saiu do apartamento e caminhou rapidamente até o ponto de ônibus mais próximo. A chuva a molhou, mas ela mal percebeu. Seu foco estava em chegar ao abrigo, em encontrar um lugar onde pudesse se sentir segura novamente.

Quando finalmente chegou ao local, foi recebida por uma equipe de mulheres que a acolheram com gentileza e compreensão. Pela primeira vez em muito tempo, Clara sentiu que não estava sozinha. Ela foi levada a um quarto simples, mas limpo e aconchegante, onde poderia descansar e começar a processar tudo o que havia vivido.

Naquela noite, enquanto se deitava na cama do abrigo, Clara olhou para o teto e sentiu uma lágrima escorrer pelo seu rosto. Era uma lágrima de alívio, de medo, mas também de esperança. Ela sabia que a jornada para se reconstruir seria longa e difícil, mas também sabia que havia dado o primeiro passo.

A luz no fim do túnel ainda estava distante, mas Clara finalmente conseguia vê-la. E, pela primeira vez em muito tempo, ela sentiu que talvez, apenas talvez, pudesse ser feliz novamente.

            
            

COPYRIGHT(©) 2022