- Meu pai, Augusto Avelar, pode acordar a qualquer momento. Mas tem uma pessoa que não quero que se aproxime dele de jeito nenhum. E, para garantir isso, eu preciso que você finja ser... a esposa dele.
O silêncio que se seguiu foi absoluto.
Patrícia piscou, achando que tinha entendido errado.
- O quê? - perguntou, boquiaberta.
Rafael manteve a postura firme.
- Sei que parece absurdo, mas essa mulher, Estela, não pode voltar para a vida do meu pai. Ele esteve perto da morte e não quero que ela se aproveite da situação. Se ele acordar acreditando que tem uma esposa ao seu lado, talvez isso a mantenha afastada.
- Mas... - Patrícia balançou a cabeça, tentando assimilar aquilo. - Isso é loucura.
- Eu sei - Rafael admitiu, inclinando-se um pouco para a frente. - Mas é a única forma que encontrei de protegê-lo.
Ela sentiu o coração acelerar.
- Você quer que eu finja ser a esposa dele? Que tipo de farsa seria essa?
- Algo simples. Não precisa fingir estar apaixonada nem agir de forma inadequada. Apenas quero que, quando ele acordar, ele veja uma presença confiável ao lado dele. E, principalmente, que Estela acredite que ele já tem alguém.
Patrícia ainda estava atônita.
- Isso... Isso não tem como dar certo. E se ele não acreditar? E se eu disser algo errado?
- Eu confio em você - Rafael afirmou, sério. - Você tem sido a única pessoa ao lado dele. Meu pai vai reconhecer isso.
Ela desviou o olhar, sentindo a cabeça girar.
- E se eu não aceitar?
Rafael suspirou.
- Não vou forçá-la a nada. Mas, se aceitar, eu me certificarei de que seu avô tenha o melhor tratamento possível.
Patrícia prendeu a respiração.
- Você... você está tentando me comprar?
- Estou tentando ajudá-la, enquanto você me ajuda - Rafael corrigiu. - Pense nisso como um acordo. Você cuida do meu pai e evita que Estela se aproxime, e eu cuido do seu avô.
O peso daquela proposta caiu sobre Patrícia como uma avalanche. Era arriscado. Absurdo. Mas também era a chance de garantir a melhor assistência para seu avô.
Ela fechou os olhos por um instante, sentindo-se encurralada. Então, respirou fundo e olhou para Rafael.
- Eu... preciso de um tempo para pensar.
Ele assentiu.
- Entendo. Mas não demore muito. Meu pai pode acordar a qualquer momento.
Patrícia se levantou, sentindo as pernas bambas, e saiu do escritório. Seu coração martelava no peito.
Ela realmente poderia aceitar algo assim?
- Se eu aceitar... o que você vai fazer? - Patrícia perguntou, parando na porta e se virando para encará-lo.
Rafael não hesitou. Seu olhar era firme, decidido.
- Vou marcar o casamento.
O coração dela deu um salto.
- Casamento? - repetiu, atordoada. - Você quer mesmo levar essa mentira tão longe?
Ele se levantou e caminhou até ela com calma, as mãos nos bolsos.
- Preciso que pareça real, Patrícia. Um simples boato não manteria Estela afastada. Mas se ela acreditar que meu pai é um homem casado, será mais difícil que tente se reaproximar.
Ela o encarou, tentando encontrar alguma hesitação em sua expressão, mas ele parecia determinado.
- E se ele acordar e não acreditar?
- Vamos torcer para que a recuperação dele seja lenta o suficiente para que a história faça sentido.
Patrícia soltou uma risada nervosa.
- Isso é loucura.
Rafael deu de ombros.
- Talvez. Mas é a melhor solução que encontrei.
Ela mordeu o lábio, o peso da decisão esmagando seus ombros.
- Eu preciso pensar...
- Pense o quanto precisar - ele disse, inclinando a cabeça ligeiramente. - Mas saiba que, se aceitar, eu cuidarei de tudo. Inclusive do seu avô.
Patrícia sentiu um arrepio percorrer sua espinha.
Ela saiu do escritório sem dizer mais nada, com a mente fervilhando.
No quarto, Patrícia suspirou, torcendo os dedos enquanto observava o senhor Avelar adormecido.
- Que situação... - murmurou para si mesma.
Seus olhos vagaram pelo rosto dele, como se o enxergasse pela primeira vez. Já havia notado a grande beleza de Augusto Avelar, o porte imponente, os traços fortes, a elegância natural. Mas, além da aparência, ela não sabia nada sobre ele. Não conhecia sua voz, seu olhar, suas expressões. Ele ainda era um completo desconhecido.
E, mesmo assim, em breve, ela teria que chamá-lo de marido.
A ideia a fez engolir seco. O que aconteceria quando ele acordasse? E se a rejeitasse? E se se revoltasse ao descobrir que, enquanto dormia, sua vida havia mudado drasticamente?
Mas, por outro lado, não havia escolha. Seu avô precisava do tratamento, e aquela era sua única chance.
Ela apertou a mão do senhor Avelar levemente, sentindo-se culpada por estar tomando uma decisão tão grande sem seu consentimento.
- Eu vou ter que aceitar, senhor Avelar... Sinto muito.
Seus olhos se fecharam por um instante, tentando afastar os pensamentos. Não podia hesitar mais.
Respirando fundo, se levantou e caminhou com passos firmes até a sala de estar, onde encontrou Rafael.
Ele se virou ao vê-la, esperando sua resposta.
- Eu aceito - disse, tentando demonstrar mais confiança do que realmente sentia.
Um sorriso satisfeito surgiu no rosto de Rafael.
- Ótimo. Vou ver se tem como casar vocês amanhã mesmo.
O coração de Patrícia disparou.
- Amanhã?!
- Quanto mais rápido, melhor - ele afirmou, pegando o celular para dar início aos preparativos.
Patrícia sentiu as pernas fraquejarem, mas não recuou. Ela já tinha tomado sua decisão. E agora não havia mais volta.
Ela voltou para o corredor, sentindo o cansaço pesar sobre seus ombros. Com passos lentos, abriu a porta do seu quarto e, sem pensar, trancou-a atrás de si. Estava exausta, mas precisava de um momento para si mesma. Despiu-se rapidamente, deixando a roupa cair ao chão, e foi direto para o banheiro. A água quente do chuveiro parecia aliviar o peso do dia, e ela se permitiu alguns minutos de silêncio e tranquilidade, tentando afastar as tensões acumuladas nas últimas horas.
Após o banho, sentiu-se renovada, mas ao sair do banheiro, o ambiente parecia estranho. Algo havia mudado. Um leve som, como se alguém estivesse mexendo no quarto ao lado, a fez parar. Sem pensar duas vezes, ela se apressou a abrir a porta do quarto, imaginando que o senhor Avelar finalmente tivesse acordado. O coração acelerado a fez caminhar rapidamente, e com a mão trêmula, ela abriu a porta do quarto ao lado, esperando ver o homem que estivera inconsciente por tanto tempo.
Porém, ao entrar no quarto, não encontrou Avelar acordado, mas sim o filho dele, Rafael. Ele estava de pé, com a camisa do pai nas mãos, ajustando cuidadosamente o colarinho, como se estivesse preparando o pai para acordar. Ela ficou ali, paralisada por um momento, seu rosto se incendiando ao perceber que estava de pijama de ursinho, algo que ela normalmente usava apenas em casa, longe de olhares curiosos.
Rafael a olhou com um sorriso discreto, um olhar divertido ao vê-la ali, tão envergonhada. Ela sentiu seu rosto queimar, mas tentou manter a postura.
- Achei que ficaríamos sozinhos... - ela disse com suavidade. - Já é tarde.
Ele a observou por um instante, então, com um gesto calmo, finalizou o abotoamento da camisa do pai e olhou para ela novamente.
- Eu tinha que banhá-lo - respondeu Rafael, com uma voz grave, mas tranquila. - Acredito que seja a última vez.
Mesmo sem querer, um sorriso tímido apareceu em seus lábios, misturado com o desconforto da situação.
- Talvez seja melhor você descansar... posso ficar com ele agora.