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De volta ao meu escritório, sento-me na cadeira de couro e encaro a vista de Manhattan pelas enormes janelas. O céu está limpo, o sol reflete nas centenas de prédios que fazem parte do meu mundo. Tudo deveria parecer perfeito. Mas, no fundo, sinto a pressão esmagadora de algo que está fora do meu controle.
O telefone toca na minha mesa e vejo o nome de Malin no visor.
- Você não vai acreditar no que acabou de acontecer - digo assim que atendo.
- Ah, Samyla, conhecendo você, eu provavelmente vou - responde Malin, com o tom divertido de sempre.
Enquanto conto o desastre que Viktor deixou para trás, ouço o som de teclas sendo batidas ao fundo.
- Certo, não é o fim do mundo - ela diz finalmente. - Ele vai voltar, isso sempre acontece.
Bufo ao ouvi-la.
- Como não é o fim do mundo? Malin, o casamento está marcado para daqui a três meses. Milhões já foram gastos. Vai ser um escândalo se descobrirem que fui abandonada pelo meu noivo, que ninguém nunca conheceu. Além disso, Viktor não seria louco de fazer isso comigo.
- Escândalo? Não se você fizer isso direito.
- Fazer o quê?
Ela ri, e o som me dá calafrios.
- Encontrar um substituto.
Meu coração dispara.
- Você só pode estar brincando!
- Estou absolutamente falando sério. E, se existe alguém que consegue fazer isso funcionar, é você.
Por um momento, fico em silêncio, absorvendo o absurdo da ideia.
- Malin, onde exatamente você acha que vou encontrar um homem disposto a fingir ser meu noivo por quatro meses e depois aceitar se casar comigo?
- Não se preocupe. Cuido disso.
Deveria dizer não. Deveria desligar e esquecer essa ideia. Mas, enquanto encaro a cidade que decidi conquistar, percebo que não tenho outra escolha.
- Ok, mas não vá me fazer surtar ao conhecer essa pessoa... Não, espera! Você sabe que estou brincando, né? O Viktor vai estar em casa.
- Que isso, minha amiga, você está com medo das minhas escolhas? Vamos ter um plano B, caso ele tenha mesmo pulado do barco.
Suspiro, torcendo para que não tenha sido nada mais do que palavras ditas da boca para fora.
- Malin, você tem dedo podre para homens. Está solteira há tanto tempo que até perdi as contas.
- Samyla, eu apenas aproveito a vida. Não sou como você, que precisa escolher o homem perfeito, sem defeitos, para passar a vida inteira.
- Você sabe que quero me casar. Já estou na casa dos trinta e não quero ficar para titia.
- Está pegando a síndrome da Hellen? Ela vive dizendo que não quer nos ver como duas amigas solteironas - sorrio.
- Ela foi esperta, se casou com um australiano e abandonou tudo aqui para ter uma vida onde ninguém a conhecia.
- Você se lembra de como ela era? - pergunto, ainda rindo. - Sempre dizia que homem bom era homem com bolso fundo. "Coração vazio, mas conta cheia", era o lema dela.
- E ela seguia à risca, hein? Viveu uns bons anos só ficando com homens que podiam dar bolsas caras, viagens, joias... - diz Malin, com um tom nostálgico e divertido.
- É impossível esquecer aquela vez em que ela viajou para as Maldivas com um empresário só porque queria conhecer o lugar...
- E voltou dizendo que ele era insuportável, mas o hotel compensava - sorrio ainda mais.
- Só que aí veio o marido atual. Ela jurava que seria só mais um ricaço, mas olha só - comento, com um sorriso na voz. - Ela caiu de amores por ele.
- Pois é. E olha que ele não era o mais bonito, mas fazia ela rir. E, pelo visto, a tratava como uma rainha. Ele é todo certinho, cara de bom moço, mas com uma conta bancária que a fazia sorrir só de ouvir o nome dele.
- E o melhor é que, no meio dessa brincadeira, ela acabou apaixonada de verdade - digo, mais suave. - Lembro dela dizendo que foi a primeira vez que sentiu medo de perder alguém, e não o cartão de crédito dele.
- Foi um pouco assustador ver a Hellen apaixonada de verdade!
- Ela vivia na neura, porque achava que ele não a aceitaria por causa de seu passado. Mas, no final, ele a queria de qualquer forma.
- A Hellen ama aquele homem. Ela ainda faz pose de interesseira, mas virou uma romântica enrustida - comenta Malin, rindo.
- E agora vive feliz, longe das nossas confusões e dos nossos dramas - digo, suspirando. - Talvez ela tenha vencido o jogo.
- Se a conhecessem, iriam trancar seus maridos em casa - rimos.
- Obrigada, amiga!
- Amigos são para isso. Te conheço, Samyla, e sei que, por baixo dessa casca durona, há um coração que está sofrendo. No fundo, mesmo a sua relação com o Viktor não sendo das melhores, você gosta dele.
Suspiro, limpando rapidamente uma lágrima que escorre. Não posso chorar, não posso deixar que me vejam assim.
- Malin, eu... - O som de alguém batendo na porta me interrompe. Olho para a porta entreaberta, tentando ver quem é, mas não consigo. - Tem alguém na porta. Depois te ligo, beijos.
Desligo o celular, arrumo-me na cadeira e verifico na tela se algo está fora do lugar, como a maquiagem. Está tudo certo. Guardo o celular.
- Pode entrar.
A porta se abre e ele entra. Nunca vi um homem tão tímido quanto ele. Toda vez que o vejo, ele me lembra alguém, mas não sei quem.
- Boa tarde, se... senhorita - ele ajusta os óculos. - O projeto do Blue Crescent Resort será avaliado novamente? - pergunta, e posso ver que está nervoso.
Ele parece um cordeirinho acuado perto de um lobo feroz.
- Boa tarde, Sr. Black. Não, o projeto está perfeito e os investidores gostaram dele. Pode informar à equipe que você comanda. Ele estará em suas mãos, e não aceito falhas. Qualquer coisa que precisar, fale comigo. Quero supervisionar este projeto de perto, pois ele é a prioridade.
- Sim, se-senhorita - ele gagueja, com a cabeça baixa, sem jamais levantar os olhos para me encarar.
Ele continua parado como um poste.
- Era só isso, Sr. Black? - Ele balança a cabeça afirmativamente. - Então pode se retirar.
Ele levanta a cabeça e me olha por alguns milésimos de segundo antes de se virar, atrapalhando-se com os próprios pés, tropeçando um pouco e saindo pela porta. Fico olhando para a porta, segurando o riso. Depois, volto meu olhar para os prédios da cidade, suspiro e ligo meu notebook para retomar o trabalho.
🩷🩷💍🩷🩷
Espreguiço-me e respiro fundo, olhando para o céu noturno e as luzes brilhantes dos prédios. A porta da minha sala se abre e me assusto.
- Me perdoe, senhorita Porter, não sabia que ainda estava aqui - diz o Sr. Elias.
- Tudo bem, Elias. Acho que perdi a noção do tempo. Já estou indo, para não te atrapalhar na limpeza - digo, levantando-me. Desligo o notebook, guardo-o na bolsa e pego meu celular e casaco.
- Que isso, a senhorita não atrapalha em nada.
Sorrio.
- Como estão as coisas? Sua esposa está melhor?
- Muito melhor, já está dando alguns passos.
- Que maravilha! - Coloco a mão em seu ombro. - Fico muito feliz em saber que ela está bem - sorrio. - Boa noite, Sr. Elias. Mande um beijo para ela.
- Pode deixar, senhorita. Excelente noite para você, descanse.
- Pode deixar.
Saio da sala e caminho até o elevador, vestindo meu casaco. Aperto o botão do elevador e, assim que as portas se abrem, entro. Olho para o espelho, ajeito meus cabelos e aperto o botão do térreo, onde sei que meu motorista me aguarda.
Enquanto o elevador desce, meus pensamentos se voltam para Viktor. Não acredito que ele realmente foi embora.
As portas se abrem e eu saio. Cumprimento algumas pessoas que ainda estão no prédio, passo pelas portas duplas e sou recebida por Wendel, que abre a porta do carro para mim. Entro, ele fecha e eu encosto minha cabeça no encosto, fechando os olhos e suspirando.
Sinto o carro deslizar suavemente pela rua. Dentro de mim, uma esperança cresce, mesmo que frágil: a de que, quando chegar em casa, ele estará lá... sei que vai!