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O vento batia nos cabelos de Clementine enquanto ela olhava as ondas irem e virem no mar, sentada sobre as pedras enquanto seu cavalo passeava no pasto perto dali. Seus dedos rodeavam a aliança de casamento. Ela tinha tirado alguns dias depois de saber da morte do marido, e desde então a carregava em uma corrente no pescoço, mas não sentia mais necessidade de mantê-la consigo. Sentia um peso enorme ao carrega-la, como se a presença de Antônio a acusasse, falando que ela não conseguia manter seu nome sozinha, sua patente, suas terras...
como se o traísse tendo que entrar em um casamento arranjado apenas para manter o título dentro da família, como se fosse somente uma questão de negócios.
Ela sabia que era somente uma questão de tempo para que o tal primo de seu marido, o Lorde Guimarães, viesse visita-la. Sabia que já tinha voltado da Inglaterra há meses, sabia que ele estava a estudando e estudando o local, o que deixava Clementine mais irritada ainda. Ardilosos, ela desconfiava que eles estavam esperando ela chegar perto do período fértil para que pudessem acertar o casamento e por isso, a próprio Clementine já estava em contato com algumas botânicas da cidade, vendo algumas receitas de chás contraceptivos, para que conseguisse se impor contra o homem quando chegasse o momento em que seus hormônios a deixasse vulnerável e a flor da pele.
- Milady pretende ficar aqui muito tempo? - Joana, sua acompanhante, perguntou, arrumando a manga do vestido preto que usava. - Poderia entrar na água, esta um dia bonito.
Clementine deu um meio sorriso - Não, tenho medo. - confessou baixinho.
- Do oceano? - ela perguntou sem acreditar - Oras, mas posso perguntar porque?
A viscondessa fitou a imensidão azul poderosa - Me sinto pequena, parece que vai me roubar de alguma forma...
Joana sorriu, olhando para o mar - Pareceu ele falando agora. - Clementine ergueu o olhar para o céu, vendo o sol brilhando entre as nuvens, apertando a aliança entre os dedos - Sente falta dele Milady?
Ela pensou. Sentia? - Eu... não sei... ele viajava muito... mas quando estávamos juntos era bom, quando conversávamos, riamos, então posso dizer que sim, eu sinto falta dele.
- Milady o amava?
Um silêncio - Acredito que se ficássemos mais tempo juntos com certeza eu começaria a o amar de verdade. Com certeza me apaixonaria por ele. Antônio me tratava com muito carinho, muito respeito, jamais ultrapassou meus limites, desde a primeira vez que nos vimos. Foi muito paciente, muito amoroso... ele foi o marido perfeito pelo tempo que durou...
- Sinto muito que tenha o perdido senhora - Joana falou baixinho e Clementine assentiu, mas seu coração se apertou. Ela também sentia muito, mas não pelo mesmo motivo que a acompanhante.
Clementine tinha se conformado com a vida com Antônio, e como tinha acabado de dizer para Joana, ele era o marido perfeito, e com certeza ela teria se acomodado e tido filhos e ficado feliz com esse casamento pelo resto da vida. Mas ter que se casar de novo? Obrigada? Com alguém que só queria suas posses e seu titulo? Passar mais uma vez pelo medo de ter alguém reivindicando seu corpo? E se essa pessoa não fosse paciente? E se essa pessoa não fosse carinhosa? E se fosse alguém movida somente pelo poder e ambição? Então sim, Clementine sentia muito, mas somente porque Antônio tinha morrido e a colocado naquela posição outra vez.
- Você pode ir Joana, quero ficar sozinha um pouco, sei o caminho de volta pra casa. - ela falou sem a olhar, mas sentiu que ela se afastou com uma reverência, pegando seu cavalo e saindo dali.
Clementine fechou os olhos, sentindo a brisa molhada, lembrando das vezes que ia ali quando o marido ainda estava vivo, quando pensava que podia estar grávida. Colocou a mão automaticamente na barriga. Naquela época sentia medo, não estava preparada para ter um filho. Mas agora... agora era diferente. Se ela tivesse realmente tido um filho de Antonio talvez não precisasse se casar outra vez. Porque as coisas tinham que ser tão complicadas pra ela? Porque Antônio tinha que morrer? Porque ela tinha que ter nascido uma mulher? Porque tinha que se importar tanto com se apaixonar?
- Fraca, é isso, sou uma fraca - murmurou pra si mesmo. Levantou da pedra onde estava sentada, olhou para o mar, pisando duro na areia que afundava seus pés com as botas pretas, e, com raiva, jogou sua aliança no oceano, vendo ela ser levada com as ondas. Seus olhos encheram de lágrimas.
As ondas iam e vinham e ela começou a andar pra trás, engolindo em seco, abraçando o corpo envolto em tecido preto. Era assim que seria seu futuro agora, sem nenhuma cor, apenas o preto, apenas a dor, apenas o luto.