Não Me Toques: A Recusa da Vítima
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Capítulo 3

Beatriz ignorou os olhares hostis, especialmente o de Clara, que parecia pronta a saltar-lhe ao pescoço.

Caminhou com a elegância de quem se sente em casa.

"Que reuniãozinha adorável," disse Beatriz, a voz melosa. "Ricardo, querido, não sabia que tinhas eventos sociais hoje."

Ela virou-se para os amigos de Sofia, um sorriso condescendente nos lábios.

"Vocês devem ser os amigos da... Sofia." O nome dela foi pronunciado com um leve desdém.

"Sabiam que esta marca de vinhos que estão a beber," ela apontou para as garrafas na mesa, uma marca de luxo, "é minha? Um dos meus pequenos empreendimentos. Financiado, claro, pela generosidade do Ricardo. Ele é tão bom a apoiar os talentos certos."

A insinuação era clara. A influência dela sobre ele. O poder dela.

Ricardo levantou-se, o rosto uma máscara de fúria.

"Beatriz! O que estás a fazer aqui?"

Ele agarrou-a pelo braço, com força.

"Sai daqui. Agora."

Beatriz riu, um som agudo.

"Calma, Ricardinho. Só vim dar um olá."

Ele não hesitou. Deu-lhe uma bofetada. O som ecoou pela sala silenciosa.

Beatriz levou a mão ao rosto, os olhos a faiscar de ódio.

"Vais pagar por isto," ela sibilou, antes de se virar e sair, tão subitamente como entrara.

Ricardo voltou-se para os convidados, a tentar recompor-se.

"Peço desculpa por esta cena lamentável. Esta mulher... ela não está bem."

Sofia sentia-se pálida, o estômago a revirar. A humilhação pública.

"Preciso de apanhar ar," murmurou, levantando-se.

Ricardo tentou segurá-la. "Sofia, espera."

Ela desviou-se dele, caminhando para a varanda. Queria ficar sozinha, longe dos olhares curiosos, da pena disfarçada.

Beatriz estava à espera dela no corredor, como uma predadora.

"Não penses que ganhaste," disse Beatriz, a voz baixa e venenosa. "Ele pode ter-me expulsado agora, para manter as aparências contigo. Mas o coração dele está a mudar, Sofia. Os filhos... eles mudam tudo."

Sofia não respondeu. Apenas a olhou com um cansaço infinito.

Nesse momento, o telemóvel de Ricardo tocou.

Ele atendeu, o rosto tenso.

"Alô?... O quê?... Calma, Beatriz, estou a ir."

Ele desligou, o olhar dividido entre Sofia e a porta. Hesitou por um instante.

"Os gémeos... estão com febre alta. Beatriz está sozinha, desesperada."

Ele largou a mão de Sofia, que ainda segurava frouxamente.

"Eu preciso de ir."

E foi. Deixou-a ali, no meio da festa arruinada, para acudir a outra família.

A confirmação das palavras de Beatriz. As prioridades dele estavam a mudar.

Sofia voltou para dentro, despediu-se rapidamente dos amigos, a cabeça a latejar.

No carro, a caminho de casa, o telemóvel dela apitou.

Um vídeo de Beatriz.

Ricardo estava sentado na beira da cama, a embalar um dos gémeos. Beatriz filmava, chorosa.

"Oh, Ricardo, ainda bem que vieste. Eu estava tão assustada."

"Calma, meu amor, já passou. Eu estou aqui." A voz dele era suave, carinhosa. A mesma voz que usava com Sofia.

Depois, a câmara focou em Beatriz.

"Ele vai dar-me a ilha, Sofia. Aquela que prometeu para o teu... bebé. Disse que eu e as crianças merecemos mais."

O vídeo terminou.

Sofia sentiu uma exaustão profunda, uma náusea que não era da gravidez fantasma.

As ações dele eram um padrão. A devoção, os presentes, as palavras doces. Nada era exclusivo. Tudo era duplicado, replicado, distribuído conforme a conveniência.

Ela não era especial. Era apenas mais uma.

A decisão de partir, de simular a morte, solidificou-se. Não havia mais dúvidas, nem hesitações.

Era a única forma de se libertar daquele ciclo doentio.

            
            

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