Tarde Demais Para Amar, Tiago
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Capítulo 1

Sofia Almeida entrou no gabinete de Marta, a responsável pelos Recursos Humanos da "Monteiro Vinhos".

"Marta, bom dia. Venho formalizar o meu pedido de demissão."

Marta olhou para Sofia, surpreendida.

"Sofia? Tem a certeza? O Sr. Monteiro aprovou o pedido, mas não sabia que era seu. Ele sempre elogiou muito o seu trabalho."

Sofia sorriu, um sorriso que não chegava aos olhos.

"Tenho, Marta. São problemas familiares. Preciso de voltar para Évora, ajudar os meus pais."

Engoliu em seco antes de acrescentar a desculpa que tinha ensaiado.

"E, quem sabe, encontrar um marido por lá."

Marta ainda tentou demovê-la.

"Mas Sofia, o seu futuro aqui é promissor. O Tiago..."

"Agradeço a preocupação, Marta, mas a minha decisão está tomada."

Sofia manteve a postura firme, escondendo a tempestade que lhe ia na alma.

Saiu do gabinete dos RH e dirigiu-se à sua secretária. Era hora de arrumar as suas coisas, os vestígios de anos de dedicação e de um amor secreto.

Cada objeto que pegava parecia um portal para o passado.

A imagem de Inês Monteiro surgiu-lhe nítida. Conheceram-se na faculdade, em Lisboa. Sofia, a rapariga humilde de Évora, e Inês, a irmã do futuro CEO de uma das maiores empresas de vinho do Porto, tornaram-se inseparáveis.

Inês era o seu oposto: extrovertida, confiante, vinda de um berço de ouro. Mas a amizade delas era genuína, um porto seguro para ambas.

Foi Inês que a apresentou a Tiago.

Sofia lembrava-se do dia como se fosse hoje. Tiago Monteiro, alto, com um olhar intenso que parecia atravessar a alma, carismático.

Desde esse primeiro encontro, o coração de Sofia bateu de forma diferente por ele. Um sentimento que ela guardou, silencioso, no fundo do peito.

Após a licenciatura, com distinção em Gestão, Sofia soube da vaga para assistente pessoal de Tiago.

Não hesitou. Era a oportunidade de estar perto dele, mesmo que apenas como uma sombra eficiente.

Uma festa da empresa, meses depois de ter começado a trabalhar. Música alta, luzes coloridas, o cheiro a vinho e a perfume no ar.

Sofia viu Tiago num canto, visivelmente alterado. Alguém lhe tinha posto algo na bebida.

Aproximou-se, preocupada.

"Sr. Monteiro, está tudo bem?"

Ele olhou para ela, os olhos turvos, um sorriso estranho nos lábios.

"Sofia... você está aqui."

Antes que ela pudesse reagir, ele puxou-a para si e beijou-a. Um beijo desesperado, febril.

Sofia, apanhada de surpresa, sentiu o mundo girar. O amor secreto, reprimido durante tanto tempo, explodiu dentro dela.

Passaram a noite juntos no apartamento dele.

Na manhã seguinte, a realidade caiu sobre Sofia como um balde de água fria.

Tiago acordou, olhou para ela com uma expressão indecifrável e estendeu-lhe um cheque.

"Isto é para compensar a noite. Eu amo a Beatriz. Ela é tudo para mim."

Beatriz Ferraz. O amor de infância de Tiago, uma socialite de Cascais, tão rica e influente quanto ele. Estava no estrangeiro a estudar.

As palavras dele foram como facas. Sofia sentiu o rosto a queimar de humilhação.

Recusou o dinheiro.

"Não quero o seu dinheiro, Tiago."

A voz dela saiu trémula, mas firme.

"Dê-me uma oportunidade. Deixe-me ficar ao seu lado até a Beatriz voltar. Nesse dia, eu prometo, desapareço da sua vida."

Tiago olhou para ela, talvez surpreso pela sua audácia, talvez por conveniência.

Ele não disse sim, nem não. Mas não a mandou embora.

E assim começou.

Quatro anos.

Sofia era a assistente exemplar durante o dia, organizando a agenda caótica de Tiago, lidando com clientes e problemas com uma eficiência que todos admiravam.

À noite, transformava-se na amante secreta, vivendo na casa dele para "conveniência logística", como ele justificava a si mesmo.

Ninguém sabia. Nem Inês. Era um segredo pesado, doloroso, mas que Sofia carregava na esperança ténue de que um dia ele a visse, que um dia ele a amasse.

A esperança era uma chama frágil que ela alimentava com sacrifícios diários.

O toque do telemóvel dela interrompeu as suas memórias. Era um alerta de uma rede social.

Tiago Monteiro tinha acabado de publicar uma foto.

Ele e Beatriz Ferraz, num evento de luxo qualquer em Lisboa, talvez uma gala no Casino Estoril. Ele abraçava-a pela cintura, o sorriso dele era o de um homem apaixonado. A legenda dizia: "Finalmente juntos."

Beatriz tinha voltado.

O coração de Sofia afundou-se. O prazo tinha chegado.

Ligou para Tiago. O estômago dela estava num nó.

A voz do outro lado não era a dele.

"Sim?" Era Beatriz. A voz dela era melosa, mas com um toque de arrogância.

Sofia ficou em silêncio por um instante.

"Podia passar ao Tiago, por favor?"

Ouviu Beatriz perguntar, ao longe: "Quem é, querido?"

E a voz de Tiago, clara e fria, a responder: "Alguém sem importância, meu amor."

Alguém sem importância.

Sofia desligou o telemóvel. As lágrimas que tinha conseguido conter ameaçavam agora transbordar.

Era o fim.

Começou a enfiar as suas poucas coisas numa caixa de cartão. Roupas, alguns livros, pequenas recordações.

Tiago chegou a casa quando ela estava quase a terminar.

Viu-a com a caixa nas mãos, junto à porta.

"Já encontraste casa? Se precisares, posso levar-te. A Inês ficaria triste se te acontecesse alguma coisa."

A preocupação dele parecia superficial, quase ensaiada.

O carro dele, estacionado à porta, estava diferente. Havia flores caras no tablier, presentes embrulhados no banco de trás. Coisas ao gosto de Beatriz.

"Não é preciso, Tiago. Agradeço."

Ao sair do carro dele, uns quarteirões depois, perto do seu antigo apartamento alugado, a caixa caiu-lhe das mãos.

O conteúdo espalhou-se pelo passeio molhado pela chuva que começava a cair. Cartas que nunca enviara, pequenas lembranças que ele lhe dera e que ela guardara como tesouros, fotografias que ela lhe "roubara" discretamente ao longo dos anos.

Tiago viu. Por um instante, a sua expressão pareceu tensa. Mas não disse nada. Entrou no carro e arrancou, deixando-a sozinha na noite chuvosa.

Sofia apanhou os seus pertences espalhados, a chuva a misturar-se com as lágrimas silenciosas.

Enquanto caminhava, um motociclista descuidado atingiu-a. O impacto atirou-a ao chão. O condutor fugiu sem prestar auxílio.

Ferida, dorida, Sofia arrastou-se durante o que lhe pareceram horas até ao seu pequeno apartamento.

O telemóvel vibrou. Uma mensagem de Tiago.

"Não te prendas a mim. Segue a tua vida."

Sofia olhou para a mensagem, o coração despedaçado.

Subiu ao pequeno terraço do apartamento. Fez uma pequena fogueira improvisada e, uma por uma, queimou todas as recordações. As cartas, as fotos, as pequenas lembranças.

As chamas consumiam o papel, e com ele, os oito anos de amor secreto, os quatro anos de loucura.

Era o fim. Desta vez, para sempre.

            
            

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