/0/15061/coverbig.jpg?v=9665623d81c3dbb931b796c52ee3aa30)
Seguimos o caminho, e Fanny parecia finalmente se acalmar.
Mas então...
Ela arregalou os olhos de novo.
- François!
- O que foi agora?
Ela apontou para um grupo de mulheres na calçada.
- Elas estão nuas!
Engoli a risada e tentei não bater o carro.
- Elas não estão nuas, Fanny. São roupas modernas.
Ela piscou, escandalizada.
- Mas essas saias mal cobriam suas pernas! As blusas... MON DIEU! DÁ PARA VER OS OMBROS!
- E qual o problema com isso?
Ela me olhou indignada.
- As mulheres daqui não têm pudor?! No meu tempo, uma senhora jamais sairia assim! Isso é... escandaloso!
Eu ri.
- Bem-vinda ao século XXI.
Ela fechou os olhos e respirou fundo.
- Isso é pior do que imaginei.
E naquele momento, soube de uma coisa...
Fanny Marchand não estava preparada para o século XXI.
E eu não estava preparado para Fanny Marchand.
Trazer Fanny para o século XXI era como apresentar um gato à água.
Cada novidade era um choque.
Cada coisa moderna, bruxaria.
E cada vez que eu tentava explicar...
Ela se assustava ainda mais.
Assim que chegamos ao prédio, Fanny parou na entrada, observando o saguão com olhos arregalados.
- Onde estão os criados?
Pisquei.
- Criados?
Ela me lançou um olhar impaciente.
- Sim! Quem abre as portas e anuncia a chegada dos visitantes?
Cruzei os braços, segurando o riso.
- Fanny, ninguém mais faz isso.
Seu queixo caiu.
- Comment?! (Como assim?!)
Antes que eu pudesse responder, chegamos ao elevador.
Assim que a porta metálica se abriu, ela recuou e gritou.
- MON DIEU! C'EST UN CERCUEIL AVEC DES MIROIRS! (MEU DEUS! É UM CAIXÃO COM ESPELHOS!)
Esfreguei o rosto.
- Fanny, isso é um elevador.
- E-ele nos traga para onde?!
- Para o andar de cima.
Ela cruzou os braços.
- Isso se move sozinho?
- Sim.
Ela me lançou um olhar de puro horror.
- Então é feitiçaria! O século XXI é povoado por bruxos! Ainda bem que a Inquisição acabou!
Segurei o riso e, antes que ela fugisse, a puxei para dentro.
Assim que a porta se fechou e o elevador começou a subir, ela agarrou meu braço e prendeu a respiração.
- MON DIEU! NOUS SOMMES EMPORTÉS AU CIEL?! (MEU DEUS! ESTAMOS SENDO LEVADOS PARA O CÉU?!)
Eu gargalhei.
- Não, estamos indo para o meu apartamento.
Fanny estava pálida.
- Eu não ficarei sozinha com um homem! Já disse, sou uma donzela!
Revirei os olhos.
- Fanny, não se preocupe. Jamais abusaria de uma dama.
Ela me observou desconfiada.
- Jamais?
- Nunca. Eu preciso esfriar a cabeça, só isso.
Ela suspirou.
- Se me encontrar desonrada amanhã, lançarei uma praga sobre sua família.
Sorri.
- Bem, espero que sobreviva à sua primeira noite no século XXI.
Entramos no apartamento, Fanny parou na sala e franziu o cenho.
- Que quadro grande e negro é esse na parede?
Peguei o controle remoto e liguei a TV.
Mal tive tempo de mudar de canal.
Fanny deu um grito e se jogou atrás do sofá.
- C'EST LE DIABLE! (É O DIABO!)
Eu chorei de rir.
- Fanny, isso se chama televisão!
Ela apontou assustada para a tela.
- Mas... elas se movem! Elas falam!
- É uma gravação!
- Elas estão vivas?!
- Não.
- Então como falam?!
Suspirei.
- Tecnologia.
Ela estreitou os olhos, desconfiada.
- Isso soa como outro nome para feitiçaria.
- Bem-vinda ao século XXI, Fanny.
- François, onde está a bacia?
Pisquei.
- Que bacia?
Ela revirou os olhos.
- A bacia onde se toma banho!
Ah.
- Você não precisa de uma bacia. Tem um chuveiro.
Levei-a até o banheiro e liguei o chuveiro. Assim que a água quente caiu, Fanny gritou e se escondeu atrás de mim.
- MON DIEU! L'EAU TOMBE DU CIEL! (MEU DEUS! A ÁGUA CAI DO CÉU!)
Eu me segurei para não rir.
- Vem do encanamento.
Ela ignorou minha explicação.
- SEU APARTAMENTO TEM UM RIO ESCONDIDO?!
Eu gargalhei.
- Não, Fanny. É apenas um sistema moderno.
Ela continuou me encarando, assustada.
- Seu século é um pesadelo.
Depois de sobreviver ao banheiro, levei Fanny para a cozinha.
Ela cruzou os braços.
- E onde está a lareira?
Apontei para o fogão elétrico.
Ela estreitou os olhos.
- Isso... faz fogo?
Girei um botão. As chamas surgiram instantaneamente.
Fanny gritou e correu para trás.
- MON DIEU! C'EST LA SORCELLERIE! (MEU DEUS! ISSO É BRUXARIA!)
- Fanny, é um fogão elétrico!
- COMO O FOGO APARECEU SEM LENHA?!
Revirei os olhos.
- Fanny, confie em mim.
Ela resmungou, desconfiada.
Então, peguei um prato de comida, coloquei no micro-ondas e apertei um botão.
Quando o aparelho começou a girar, Fanny deu um pulo.
- CETTE CHOSE EST VIVANTE?! (ESSA COISA ESTÁ VIVA?!)
- Fanny, por favor, para de achar que tudo é feitiçaria.
- ENTÃO EXPLIQUE!
Suspirei.
- É um aparelho que aquece comida com ondas eletromagnéticas.
Ela me olhou como se eu tivesse falado latim.
- Isso soa como bruxaria.
Eu me joguei na cadeira, exausto de tanto rir.
- Se soubesse que te trazer para o futuro seria tão divertido, teria feito isso antes.
Ela bufou.
- Prefiro meu tempo.
Levantei uma sobrancelha.
- Mas no seu tempo você seria forçada a casar com um velho asqueroso.
Ela mordeu os lábios.
- Ok. Prefiro um mundo sem lampiões do que um marido horrível.
Sorri, satisfeito.
- Bem-vinda ao século XXI, Fanny.
Ela revirou os olhos.
- Espero que esse século não me mate.
Dei de ombros.
- Se sobreviver ao micro-ondas, acho que sobrevive a tudo.
Ela não riu.
Ainda achava que a comida ia explodir.
E eu sabia que essa jornada estava apenas começando.
razer Fanny para o século XXI era como apresentar um gato à água.
Cada novidade era um choque.
Cada coisa moderna, bruxaria.
E cada vez que eu tentava explicar...
Ela se assustava ainda mais.