Quando abri os olhos, o teto branco do hospital foi a primeira coisa que vi. O cheiro de desinfetante era forte. A minha mão foi instintivamente para a minha barriga. Estava vazia, lisa. O peso que carreguei durante nove meses tinha desaparecido.
O nosso filho tinha-se ido.
A porta do quarto abriu-se. Era o meu marido, Leo. Ele não parecia preocupado. Parecia irritado, a sua testa franzida.
"Finalmente acordaste", disse ele, a sua voz áspera. "Passei o dia inteiro a correr por causa da Clara. O gato dela teve um ataque de asma por causa do fumo do incêndio. Tive de a levar ao veterinário de emergência do outro lado da cidade."
Ele sentou-se na cadeira ao lado da minha cama, suspirando alto como se ele fosse a vítima.
"E a Isabel não parava de me ligar, em pânico. Tive de acalmar toda a gente."
Olhei para ele. Não uma única pergunta sobre mim. Não uma única palavra sobre o nosso bebé. O bebé que ele supostamente queria tanto quanto eu.
"Leo", a minha voz saiu como um sussurro, seca. "Vamos divorciar-nos."
Ele olhou para mim, os seus olhos arregalados em descrença, e depois a sua expressão transformou-se em fúria.
"Divórcio? Estás a falar a sério? Por causa disto?"
Ele gesticulou descontroladamente.
"Eu sei que o teu prédio pegou fogo, Sofia. Mas a Clara estava em pânico! Ela é a minha irmã! O que é que querias que eu fizesse? Deixá-la sozinha a lidar com tudo?"
"Ela não é tua irmã", corrigi-o calmamente. "Ela é tua meia-irmã."
"É a mesma coisa! És tão insensível. Perdi o meu dia a ajudar a minha família, e é assim que me agradeces? A pensar em divórcio?"
Ele levantou-se, a andar de um lado para o outro no pequeno quarto.
"Tu não perdeste nada, Sofia. Só inalaste um pouco de fumo. A Clara, por outro lado, estava a ter um verdadeiro ataque de ansiedade. Ela precisa de mim."
Eu não disse nada. Apenas o observei. Observei o homem com quem me casei, o pai do meu filho morto. Ele não via. Ele não via que ao escolher acalmar o pânico da Clara, ele me tinha deixado num inferno.
Eu liguei-lhe. Liguei-lhe quinze vezes enquanto o fumo enchia o meu apartamento. Quinze vezes. Ele não atendeu nenhuma. A última coisa de que me lembro antes de desmaiar foi o som do meu telemóvel a cair no chão, ainda a tocar para ele.
"Não tens nada a dizer?", ele exigiu. "Vais ficar aí deitada a julgar-me em silêncio?"
"Não há nada para dizer", respondi. "A minha decisão está tomada."