Léo só apareceu no dia seguinte.
Ele não veio sozinho, o seu pai, Ricardo, veio com ele.
Ricardo também era meu padrasto, casado com a minha mãe há anos, mas nunca gostou de mim.
Os dois entraram no quarto com expressões sérias, como se estivessem a entrar numa reunião de negócios.
Léo não olhou para mim. Os seus olhos fixaram-se na parede por cima da minha cabeça.
"Eva," disse Ricardo, a sua voz grave e autoritária, "Isto é uma tragédia terrível."
Não era uma pergunta. Era uma declaração.
"Onde estavas?" perguntei diretamente a Léo, ignorando Ricardo.
Léo finalmente olhou para mim, e não havia culpa nos seus olhos, apenas irritação.
"Eu já te disse. Estava com a Sofia. Ela estava a ter um ataque de pânico. A casa dela ficou sem luz, ela estava sozinha e assustada."
"A casa dela não fica na zona das cheias," disse eu, a minha voz fria como gelo. "Ela estava segura. Eu não."
"Não sejas dramática, Eva," interrompeu Ricardo. "O que é que querias que o Léo fizesse? Ele não é um super-herói. Além disso, o que é que estavas a fazer na rua com uma tempestade daquelas? Grávida de nove meses?"
A culpa. Eles estavam a virar a culpa para mim.
Eu estava na rua porque a minha mãe tinha tido uma consulta médica e eu a tinha ido levar a casa, do outro lado da cidade. Léo sabia disso.
"Eu perdi o nosso filho, Léo," disse eu, a voz a quebrar-se pela primeira vez.
"Eu sei," disse ele, desviando o olhar novamente. "É horrível. Mas estas coisas acontecem."
Estas coisas acontecem.
Como se perder um filho fosse como perder as chaves de casa.
O vazio dentro de mim começou a ser preenchido por uma raiva fria e cortante.
Olhei para o rosto do homem com quem me casei, o homem que prometeu proteger-me.
Não o reconheci.
"Quero o divórcio," disse eu.
As palavras saíram calmas e claras.
O silêncio no quarto tornou-se pesado.
Ricardo olhou para mim como se eu tivesse enlouquecido.
Léo finalmente focou os seus olhos em mim, a sua expressão passou de irritação para fúria.
"O quê?"