Dois dias depois, recebi alta do hospital. A minha mãe, ainda a recuperar da sua própria cirurgia para remover um tumor benigno, insistiu em vir comigo para o meu apartamento.
O apartamento que eu partilhava com o Pedro parecia estranho, frio. O quarto do bebé, que tínhamos decorado com tanto amor, estava silencioso. A porta estava fechada. Eu não conseguia olhar para lá.
A minha sogra, a Dona Helena, estava sentada na sala de estar, de braços cruzados e com uma expressão severa no rosto. A Clara estava ao lado dela no sofá, com o braço numa tipóia, a choramingar baixinho.
O Pedro estava de pé ao lado delas, a olhar para mim como se eu fosse uma estranha.
"Sofia, finalmente", disse a Dona Helena, a sua voz cortante. "Viemos falar contigo sobre esta tolice do divórcio."
Ignorei-a e olhei diretamente para o Pedro.
"Onde estavas, Pedro? Quando eu acordei, quando precisei de ti."
"Eu já te disse", respondeu ele, impaciente. "A Clara precisava de mim. Ela estava em choque."
"Eu estava a morrer!", a minha voz elevou-se, a tremer de raiva e dor. "O nosso filho estava a morrer dentro de mim, e tu estavas a consolar a tua irmã por causa de um ombro deslocado?"
"Não fales assim da minha filha!", gritou a Dona Helena, levantando-se. "Ela também sofreu! Tu és tão egoísta! Só pensas em ti mesma!"
A Clara começou a soluçar mais alto. "Eu não queria causar problemas, Sofia. Eu sinto muito pelo bebé, sinto mesmo..."
A sua voz era fraca e trémula, mas os seus olhos, quando encontraram os meus por uma fração de segundo, continham um brilho de triunfo.
"Sofia, já chega", disse o Pedro, a sua voz dura. "Pede desculpa à minha mãe e à Clara. Estás a agir como uma louca."
Eu ri, um som oco e sem alegria. "Pedir desculpa? Eu não vou pedir desculpa por nada. Eu quero o divórcio. Peguem nas vossas coisas e saiam da minha casa."
"Tua casa?", a Dona Helena riu-se. "Querida, esta casa foi comprada com o nosso dinheiro. Tu não tens direito a nada."
O meu coração gelou. Era verdade. O adiantamento tinha sido um "presente" deles. Um presente que eles agora estavam a usar como uma arma.
"Pedro?", olhei para ele, à procura de qualquer sinal de apoio.
Ele desviou o olhar. "A minha mãe tem razão, Sofia. Talvez devesses ir para casa da tua mãe por uns tempos, até te acalmares."
Naquele momento, eu percebi. Eu não era a sua esposa. Eu era um inconveniente. O nosso filho tinha sido a única cola que nos mantinha juntos, e agora que ele se fora, eu era descartável.
"Tudo bem", disse eu, a minha voz surpreendentemente calma. "Eu vou-me embora. Mas vocês vão arrepender-se disto."