O meu filho morreu no dia em que nasceu.
Eu estava no hospital, a olhar para o teto branco. O médico disse que foi por falta de oxigénio.
O meu marido, o Diogo, não estava lá.
Ele estava a salvar a sua ex-namorada, a Sofia.
Ela ligou-lhe a chorar, a dizer que o seu prédio estava a arder.
"Diogo, socorro, estou com tanto medo, acho que vou morrer."
Essa foi a última coisa que ouvi antes de desmaiar na sala de parto.
O meu telemóvel caiu no chão, a chamada ainda estava ligada.
A enfermeira apanhou-o e desligou.
Quando acordei, o meu ventre estava vazio.
A dor no meu corpo não era nada comparada com o vazio na minha alma.
Peguei no meu telemóvel. Havia dezenas de mensagens e chamadas não atendidas do Diogo.
"Ana, desculpa, o fogo era grave."
"Estás bem? O bebé nasceu?"
"Porque não atendes?"
Ignorei tudo e liguei-lhe.
Ele atendeu quase de imediato, a sua voz cheia de ansiedade.
"Ana! Graças a Deus. Estava tão preocupado. O que aconteceu? O nosso filho está bem?"
A sua voz soava tão sincera.
Mas a imagem da Sofia a chorar no telefone não saía da minha cabeça.
"Ele morreu, Diogo."
Disse-o com uma calma que me assustou.
Houve um silêncio do outro lado. Um silêncio pesado, longo.
Depois, ouvi um soluço.
"O quê? Como... como assim? Não é possível. Ana, não brinques comigo."
"O médico disse que foi por falta de oxigénio. Eu precisei de ti. Tu não estavas aqui."
A minha voz continuava sem emoção, como se estivesse a falar do tempo.
"Eu... eu estava a ajudar a Sofia. O prédio dela... Ana, foi um incêndio terrível, ela podia ter morrido!"
Ele tentava justificar-se, a sua voz a tremer.
"E eu? E o teu filho? Nós não importávamos?"
"Claro que importavam! És a minha mulher, ele era o nosso filho! Eu pensei que tinha tempo, pensei que..."
"Pensaste mal."
Desliguei.
Não tinha forças para discutir. Não tinha forças para chorar.
Só sentia um frio imenso, um frio que vinha de dentro.
O meu filho. O nosso filho. Tínhamos escolhido o nome dele juntos. Lucas.
Agora, o Lucas era apenas uma memória que nunca chegou a ser.