Passei a semana seguinte num nevoeiro.
A Clara cuidou de mim. Trazia-me comida, mesmo quando eu não queria comer. Sentava-se comigo em silêncio, quando eu não queria falar.
O Diogo ligava todos os dias. Eu não atendia.
Ele enviava mensagens.
"Ana, por favor, fala comigo."
"Eu sinto a tua falta."
"Eu amo-te. Não desistas de nós."
Apaguei as mensagens sem as ler completamente.
Uma tarde, a campainha tocou.
A Clara foi atender. Ouvi vozes na sala.
Era a Sofia.
O meu corpo ficou tenso.
Levantei-me e fui até à sala.
Ela estava de pé, no meio da sala da Clara. Parecia pequena e frágil.
Quando me viu, os seus olhos encheram-se de lágrimas.
"Ana, eu sinto tanto."
A sua voz era um sussurro.
"O que estás a fazer aqui?"
A minha voz era dura.
"Eu... eu precisava de te ver. De pedir desculpa. A culpa foi minha. Se eu não tivesse ligado ao Diogo..."
"Sim. A culpa foi tua."
As minhas palavras foram cruéis. Eu queria magoá-la.
Ela encolheu-se.
"Eu sei. Eu vivo com isso todos os dias. Eu nunca quis que isto acontecesse."
"Mas aconteceu."
A Clara pôs uma mão no meu ombro. "Ana, talvez devesses sentar-te."
Ignorei-a.
"Porque é que ligaste para ele, Sofia? Havia bombeiros, havia vizinhos. Porque é que tinhas de ligar ao meu marido?"
Ela olhou para o chão.
"Eu entrei em pânico. Ele... ele é a única pessoa em quem eu confio. Ele sempre cuidou de mim."
"Ele não é o teu guardião. Ele era o meu marido. O pai do meu filho."
Aproximei-me dela.
"Tu sabias que eu estava no hospital. Tu sabias que o bebé estava a nascer. Mas mesmo assim ligaste."
"Eu não pensei..."
"Não. Tu não pensaste em mim. Tu só pensaste em ti."
As lágrimas escorriam livremente pelo seu rosto agora.
"Eu sou uma pessoa horrível. Eu sei."
"Sim, és."
Virei-lhe as costas.
"Vai-te embora, Sofia. Eu não quero voltar a ver-te."
Ouvi-a a soluçar. A Clara levou-a para fora.
Sentei-me no sofá. O meu corpo tremia de raiva.
Ver a cara dela só piorou tudo.
A sua tristeza não me trazia conforto. A sua culpa não me trazia o meu filho de volta.