O médico entregou-me um envelope grosso.
"Parabéns, os resultados da sua biópsia são benignos. O nódulo é apenas uma hiperplasia."
O meu coração, que estava apertado, finalmente relaxou.
Olhei para o envelope na minha mão, e um sorriso apareceu no meu rosto.
Eu queria partilhar imediatamente esta boa notícia com o meu marido, Pedro.
Mas quando peguei no telemóvel, vi uma mensagem da minha sogra, Sofia.
"Marta, o teu pai vai fazer uma cirurgia de ponte de safena amanhã. Tu e o Pedro venham ao hospital."
O meu pai?
Eu não tinha pai. O meu pai biológico faleceu há muitos anos.
A mensagem referia-se ao meu sogro, João.
Desde que me casei com o Pedro, a minha sogra tentou de todas as formas fazer-me chamar ao sogro dela "pai".
Ela dizia que isso nos faria parecer mais próximos, como uma verdadeira família.
Mas eu nunca consegui dizer essa palavra.
Respondi: "Ok, mãe. Vou já para aí."
Depois, liguei ao Pedro.
O telefone tocou várias vezes antes de ele atender, a sua voz soava cansada.
"Marta, o que foi?"
"Pedro, a mãe mandou-me uma mensagem. Vou agora para o hospital."
"Não precisas de vir," ele disse rapidamente. "A cirurgia do pai foi adiada. O médico que ia operá-lo, o Dr. Alves, teve uma emergência familiar e teve de ir embora."
Fiquei surpreendida. "Emergência? O que aconteceu?"
"A filha dele teve um acidente de carro, parece que foi grave. Ele teve de ir para o hospital da cidade vizinha. A cirurgia do pai foi remarcada para a próxima semana."
Senti um alívio momentâneo, mas depois a preocupação tomou conta.
"Então o sogro está bem? Vocês estão no hospital?"
"Sim, estamos aqui. A Lúcia também está. Ela ficou tão assustada que não para de chorar. Estou a tentar acalmá-la."
Lúcia. A prima do Pedro.
Ela sempre foi a menina dos olhos da minha sogra.
"Ok, então eu vou para aí para ajudar."
"Não, não venhas," a voz do Pedro tornou-se firme. "Está tudo sob controlo. A Lúcia precisa de mim. Fica em casa e descansa."
Antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, ele desligou.
Olhei para o ecrã do telemóvel, sentindo um frio na barriga.
Ele nem perguntou porque é que eu estava no hospital.
Ele não sabia que eu tinha acabado de receber os resultados da minha biópsia.
Durante uma semana, vivi com o medo de ter cancro.
E ele nem sequer notou.