Levantei-me, vesti-me mecanicamente e fui ao banco.
A nossa conta conjunta tinha um pouco mais de 60.000 euros. As nossas poupanças.
Enquanto a funcionária do banco preparava o levantamento, a minha mão tremia.
Uma voz na minha cabeça gritava que isto era um erro.
Peguei no meu telemóvel e liguei ao Pedro.
Caixa de correio de voz.
Liguei outra vez. E outra.
Sempre para a caixa de correio de voz.
A funcionária entregou-me o envelope com o dinheiro. Parecia pesado, como um tijolo.
Sentei-me num banco fora do banco, a olhar para o envelope.
O meu instinto dizia-me para não ir ao hospital.
Lembrei-me do que o Pedro disse. "O Dr. Alves teve uma emergência familiar. A filha dele teve um acidente de carro."
Peguei no telemóvel e fiz algo que nunca pensei fazer.
Procurei o nome do "Dr. Alves, cirurgião cardíaco" na internet.
Encontrei o site do hospital principal da nossa cidade. O perfil dele estava lá.
Havia um número de contacto do seu consultório.
Com o coração a bater forte, liguei.
Uma secretária atendeu.
"Consultório do Dr. Alves, bom dia."
"Bom dia," tentei manter a minha voz calma. "Eu sou... uma jornalista. Estou a escrever um artigo sobre cirurgiões de topo e gostaria de saber se o Dr. Alves está disponível para uma breve entrevista hoje."
Era uma mentira estúpida, mas foi a primeira coisa que me veio à cabeça.
"Receio que não seja possível," disse a secretária. "O Dr. Alves está de férias com a família. Só volta para a semana."
Férias.
Não uma emergência familiar. Não um acidente de carro.
Férias.
"Oh, entendo," disse eu, a minha voz a falhar. "Obrigada."
Desliguei o telefone.
O mundo pareceu parar.
O ar ficou rarefeito.
Tudo era uma mentira.
O Pedro mentiu-me. A minha sogra mentiu-me.
A Lúcia... a frágil e assustada Lúcia... estava no centro de tudo.
Mas porquê?
Porquê esta mentira tão elaborada?
E o dinheiro... os 50.000 euros.
O meu sangue gelou.
Isto não era sobre a cirurgia do meu sogro.
Era sobre outra coisa.