O Pedro ficou ali, a olhar para o papel, depois para mim.
"Marta, eu... eu não sabia."
"Claro que não sabias."
A porta do quarto abriu-se e a minha sogra saiu.
"Pedro, a Lúcia está a chamar por ti. Ela não se sente bem."
O Pedro olhou para a mãe, depois para mim, dividido.
"Vai," eu disse. "Ela precisa de ti."
A minha voz era monótona. Não havia sarcasmo, apenas um facto.
Ele hesitou por mais um segundo, depois entrou rapidamente no quarto.
A Sofia olhou para mim com desdém.
"O que é isso que tens na mão?" ela perguntou, apontando para o envelope que o Pedro tinha deixado cair.
Apanhei-o do chão. "Não é nada."
"Seja o que for, não uses isso para chamar a atenção. O Pedro já tem preocupações suficientes com o pai e a Lúcia."
Ela nem sequer perguntou se eu estava bem.
A minha saúde era apenas um incómodo, uma tentativa de chamar a atenção.
"Não se preocupe," disse eu. "Não vou causar mais problemas."
Virei-me e comecei a afastar-me pelo corredor.
"Onde vais?" gritou ela.
"Para casa," respondi sem olhar para trás. "Como me foi dito para fazer."
Não esperei por uma resposta. Continuei a andar, os meus passos ecoando no corredor silencioso do hospital.
Quando cheguei a casa, o apartamento estava escuro e vazio.
Era a nossa casa, o lugar que partilhávamos. Mas nunca me senti tão sozinha.
Sentei-me no sofá, no escuro, e finalmente deixei as lágrimas caírem.
Chorei pela semana de medo, pela indiferença do meu marido, pela crueldade da minha sogra.
Chorei porque percebi que, na sua família, eu seria sempre uma estranha.
O meu telemóvel vibrou. Era uma mensagem do Pedro.
"Desculpa. Falamos amanhã."
Apenas isso. Sem mais perguntas. Sem preocupação.
Apaguei a mensagem.
Na manhã seguinte, acordei com o som do meu telemóvel a tocar incessantemente.
Era a minha sogra.
Atendi, a minha voz rouca de sono e choro.
"Marta, preciso que vás ao banco agora."
"O quê? Porquê?"
"A cirurgia do João foi remarcada para hoje. O Dr. Alves conseguiu que um colega dele, o Dr. Silva, viesse de outra cidade. Mas temos de pagar uma parte adiantado. Preciso de 50.000 euros."
Fiquei em choque. "Hoje? Mas o Pedro disse que seria na próxima semana."
"As coisas mudaram! Não faças perguntas, apenas vai! A conta conjunta que tens com o Pedro. Tira o dinheiro e traz para o hospital. Rápido!"
Ela desligou.
Fiquei sentada na cama, a tentar processar a informação.
Uma parte de mim sentiu um pânico repentino. A cirurgia era séria.
Mas outra parte, uma parte fria e lógica, começou a questionar.
Porque é que o Pedro não me ligou? Porque é que a sogra estava tão desesperada?
Algo não estava certo.