Capítulo 3 Capitulo 3

Clara

Se alguém me dissesse que eu estaria entrando em uma loja de luxo com um cartão de crédito que não era meu e um homem bonito demais para ser real ao meu lado... eu teria rido. Ou chorado. Ou os dois. Mas lá estava eu, com os cabelos recém-hidratados, sapatos que custavam mais que meu notebook e um vestido vermelho pendurado no braço, enquanto uma vendedora me tratava como se eu fosse a nova influencer do momento.

- Esse ficou perfeito em você - disse ela, apertando levemente os ombros do blazer que eu experimentava. - E combina com o tom da sua pele.

Sorri de volta, sem saber se agradecia ou perguntava quanto custava. Mas Daniel chegou antes que eu precisasse decidir.

- Está pronta? - perguntou, encostado na porta do provador como se não fosse o responsável por pagar por tudo aquilo.

- Ainda me sinto como se estivesse em um daqueles filmes da Sessão da Tarde - murmurei, ajeitando a blusa.

- Pelo menos é uma comédia romântica e não um suspense policial - ele respondeu, com aquele sorriso contido que fazia meu estômago dar voltas involuntárias.

De todos os jeitos com que imaginei salvar minha carreira - um best-seller, uma adaptação da Netflix, uma indicação ao Jabuti -, fingir ser namorada de um milionário durante o Natal definitivamente não estava na lista.

Saímos da loja carregados de sacolas, e Daniel me levou para um café charmoso, daqueles em que os pães parecem obras de arte e a água vem com gás por padrão. Sentamos em uma mesa discreta no canto. Ele pediu um expresso; eu aceitei um chocolate quente porque, sinceramente, precisava de um pouco de doçura na vida.

- Você está mais tranquila hoje - ele comentou, apoiando os braços na mesa. - Imagino que ontem tenha sido um pouco... incomum.

- Só um pouco. Afinal, não é todo dia que recebo uma proposta de "namoro de mentira com contrato e salário incluso".

Ele sorriu.

- Justo. Mas fico feliz que tenha aceitado. Acredite, você é exatamente o tipo de pessoa que eu precisava.

- Charmosa, apresentável e sabe mentir com charme?

- Inteligente, espontânea e... real. - Ele disse isso com uma sinceridade desconcertante.

Eu corei. Ótimo. Como se já não estivesse suficientemente deslocada, agora estava corando como uma adolescente.

- Posso te perguntar uma coisa? - arrisquei, brincando com a colher.

- Claro.

- Por quê? Por que você precisa disso? Você parece... sei lá, do tipo que poderia levar qualquer mulher para casa no Natal e a família não acharia estranho.

Daniel respirou fundo, como quem decide que está na hora de tirar a armadura.

- Minha avó está doente. Nada grave, só... ela sempre foi o centro da família, sabe? E esse ano ela pediu uma coisa específica: quer ver todo mundo reunido e feliz. E eu... - ele hesitou. - Eu terminei um noivado há poucos meses. Todos esperavam que eu levasse a ex para o Natal. Então, em vez de explicar tudo, preferi encontrar uma alternativa. Temporária. Razoável.

Fiquei em silêncio por alguns segundos. Ele parecia constrangido de contar aquilo, como se estivesse pedindo desculpas.

- Bom, você contratou uma ótima atriz - respondi, tentando aliviar o clima. - Vou fingir que te amo como uma personagem de romance barato. Vai ser convincente.

- E quanto ao seu motivo? - ele perguntou de volta, olhando diretamente nos meus olhos. - Por que aceitou?

Engoli seco. Eu ja havia resumido antes, mas sempre é bom reafirmar. Se eu ia fingir amar esse homem na frente da avó dele, pelo menos ele podia conhecer meu motivo real.

- Porque estou a dois passos de ser despejada - disse, simples. - Minha carreira como escritora está estagnada, as contas acumulam, e esse dinheiro significa mais do que conforto. Significa continuar tentando. Escrever, comer, pagar o aluguel. Eu não podia dizer não.

Daniel assentiu, sem julgamento, apenas compreensão.

- Então temos um acordo, Clara. Você me ajuda a passar ileso pelo Natal. Eu te ajudo a manter a esperança viva.

- Parece justo. Só... tem uma condição.

Ele arqueou a sobrancelha.

- Nada de beijo na boca se não estiver no contrato.

Ele riu.

- Pode deixar. Beijos sob demanda, com cláusula específica.

Sorrimos os dois. Pela primeira vez, aquilo tudo não parecia tão absurdo. Parecia... um acordo entre duas pessoas desesperadas por um pouco de paz. Ou, quem sabe, uma desculpa para acreditar - ainda que por dez dias - que finais felizes talvez não sejam só coisa de ficção.

            
            

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