Acordei numa cama de hospital.
A primeira coisa que senti foi o vazio.
A minha barriga estava lisa.
O meu bebé tinha-se ido.
Uma enfermeira entrou, a sua expressão era de compaixão.
"Sinto muito, senhora. Fizemos tudo o que pudemos, mas o stress e a queda provocaram um parto prematuro grave. O seu filho não sobreviveu."
As palavras dela flutuavam no ar, sem sentido.
Eu olhei para a porta, à espera que Pedro entrasse.
Ele não veio.
Em vez disso, a minha madrasta, Clara, apareceu.
A sua cara não mostrava qualquer simpatia.
"Finalmente acordaste."
Ela sentou-se na cadeira ao lado da cama, cruzando os braços.
"O Pedro está a tratar da papelada da alta da Sofia. Ela está traumatizada, coitada."
Eu olhei para ela, a minha voz era um sussurro rouco.
"O meu filho morreu."
Clara deu de ombros.
"Acontece. És jovem, podes ter outros. Agora, o mais importante é não sobrecarregar o Pedro com os teus problemas. Ele já tem muito com que se preocupar com a Sofia."
"Preocupar com a Sofia?"
"Sim. O acidente foi feio. O carro dele ficou destruído. E ele estava a fazer um favor à irmã dele. Não podes culpá-lo por isso."
Irmã. Ela nunca foi minha irmã.
"Onde é que eles estavam a ir no nosso aniversário de casamento?"
Clara evitou o meu olhar.
"A Sofia não se estava a sentir bem. Ele foi um bom cunhado e foi ajudá-la. Devias estar grata."
A porta abriu-se e Pedro entrou.
Ele parecia cansado e irritado.
Quando me viu acordada, o seu rosto não se suavizou.
"Clara, podes deixar-nos a sós?"
Ela levantou-se e saiu, lançando-me um olhar de aviso.
Pedro ficou de pé junto à janela, de costas para mim.
"Como te sentes?"
A pergunta era fria, distante.
"O nosso filho morreu, Pedro."
Ele suspirou, um som longo e exasperado.
"Eu sei, Ana. É uma tragédia. Mas não podemos mudar o que aconteceu."
Ele finalmente virou-se para mim.
"Olha, a Sofia precisa de apoio agora. A perna dela está partida, vai precisar de meses de fisioterapia. Ela vai ficar connosco por uns tempos."
A minha cabeça girava.
"Ficar connosco? Na nossa casa?"
"Sim. Onde mais é que ela ficaria? A mãe dela tem de trabalhar. Eu sou o único que a pode ajudar."
"E eu? Eu acabei de perder o nosso filho."
Ele passou a mão pelo cabelo, frustrado.
"Ana, não sejas egoísta. O que queres que eu faça? Eu não posso trazê-lo de volta. Temos de ser práticos. A Sofia precisa de nós."
Naquele momento, eu soube.
O meu casamento, tal como o meu filho, estava morto.
"Eu quero o divórcio."