A palavra "divórcio" pairou no ar silencioso do quarto de hospital.
Pedro olhou para mim como se eu tivesse enlouquecido.
"Divórcio? Estás a falar a sério? Depois de tudo o que aconteceu?"
"Precisamente por causa de tudo o que aconteceu."
A minha voz estava surpreendentemente firme.
"Perdeste a cabeça, Ana. Estás em choque. Não sabes o que estás a dizer."
Ele aproximou-se da cama, a sua voz baixou para um tom falsamente apaziguador.
"Olha, eu sei que estás a sofrer. Eu também estou. Ele era meu filho também."
As suas palavras eram ocas, vazias de qualquer emoção genuína.
"Mas tomar decisões precipitadas agora não vai ajudar ninguém. Precisamos de nos apoiar um no outro."
Eu ri, um som seco e sem alegria.
"Apoiar um no outro? Tu nem sequer estiveste aqui. Estavas a apoiar a Sofia."
A sua paciência esgotou-se.
"Pelo amor de Deus, Ana! Ela é tua irmã! Ela partiu uma perna! O que querias que eu fizesse, que a abandonasse no hospital?"
"Ela não é minha irmã. E tu abandonaste-me a mim. E ao teu filho."
Ele recuou, a sua cara contorcida numa máscara de raiva.
"Isto é inacreditável. Eu tento ser uma boa pessoa, ajudar a família, e é isto que recebo. Acusações e egoísmo."
"Ajudar a família? No nosso aniversário? A levá-la para onde, Pedro? O acidente foi a quilómetros da casa dela e da nossa."
Ele ficou em silêncio, apanhado na mentira.
O seu rosto endureceu.
"Não te devo explicações. Se queres o divórcio, ótimo. Mas não penses que vais ficar com alguma coisa. A casa está em meu nome. O dinheiro é meu."
"Eu não quero nada teu. Só quero sair disto."
"Bem. Mas vais esperar. Eu não vou lidar com um divórcio enquanto a Sofia estiver a recuperar na nossa casa. Seria demasiado stress para ela."
Ele virou-se para sair.
"Vais ter de aguentar. Pelo menos por uns meses. Pensa nisso como o teu dever."
Ele saiu e fechou a porta, deixando-me sozinha com o eco das suas palavras cruéis.
O meu dever.
O meu dever era servir de enfermeira para a mulher que destruiu a minha vida, na casa que já não sentia como minha.
A raiva deu lugar a uma determinação fria.
Eu não ia jogar o jogo dele.