Quando a Dor Vira Arma
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Capítulo 2

Dois dias depois, saí do hospital.

A minha mãe, Marta, segurava o meu braço com força, como se eu fosse partir-me em mil pedaços.

O nosso apartamento estava silencioso e frio. As coisas de bebé que tínhamos comprado com tanta alegria estavam por todo o lado. O berço montado no canto. As pequenas roupas dobradas.

Cada objeto era uma facada no meu peito.

"Vou deitar isto tudo fora," disse a minha mãe, com a voz embargada.

"Não," respondi, a minha voz firme. "Deixa ficar. Eu preciso de me lembrar."

Pedro não apareceu. Não ligou.

Era como se eu e o nosso filho morto nunca tivéssemos existido.

Em vez disso, recebi uma mensagem de Clara.

"Sofia, sei que estás a passar por um momento difícil, mas não podes culpar o Pedro. Ele ama-te. Mas a família vem sempre em primeiro lugar. Eu sou a irmã dele. Espero que entendas."

Entender.

Peguei no meu computador portátil. As minhas mãos tremiam, mas a minha mente estava clara.

Pedro e eu tínhamos uma conta poupança conjunta. Era para o futuro do nosso filho.

Agora, tinha um novo propósito.

Transferi cada cêntimo para a minha conta pessoal. Não era muito, mas era o suficiente para começar.

Depois, comecei a procurar advogados. Precisava do melhor. Alguém implacável.

O meu telemóvel tocou. Era um número desconhecido.

Atendi.

"Sofia? Sou eu, o João. O amigo do Pedro da universidade."

A voz dele era hesitante.

"Lamento muito pelo que aconteceu. Não consigo imaginar a tua dor."

"Obrigada, João."

"Olha, eu não devia estar a dizer-te isto... mas o Pedro... ele não está bem. Ele está a dizer coisas estranhas."

Fiquei em silêncio, à espera.

"Ele continua a dizer que se livrou de um problema. Que agora pode finalmente ser feliz."

O meu sangue gelou.

"O que mais é que ele disse?"

"Ele... ele mencionou a Clara. Disse que agora nada os pode impedir."

Fechei os olhos. A verdade era mais feia do que eu imaginava.

Não se tratava apenas de negligência. Era um plano.

"Obrigada por me dizeres, João. Agradeço a tua honestidade."

Desliguei e respirei fundo.

A dor transformou-se em gelo nas minhas veias.

Abri o guarda-roupa do Pedro. As suas roupas caras, os seus sapatos polidos.

Comecei a empacotar tudo em sacos do lixo. Metodicamente. Sem pressa.

Cada camisa, cada par de calças.

Quando terminei, a minha mãe estava a olhar para mim da porta, com os olhos arregalados.

"O que estás a fazer, filha?"

"A limpar o lixo."

Levei os sacos para a rua e deixei-os ao lado do contentor.

Voltei para dentro e enviei uma mensagem a Pedro.

"As tuas coisas estão no lixo. Tal como tu."

A resposta foi quase imediata. Uma chamada.

Atendi e coloquei em altifalante.

"ESTÁS LOUCA? AS MINHAS ROUPAS! OS MEUS FATOS! SABES QUANTO CUSTA AQUILO?"

A voz dele estava distorcida pela raiva.

"Menos do que a vida do meu filho," respondi calmamente.

"Tu vais pagar por isto, Sofia! Juro por Deus, vais arrepender-te!"

"Não, Pedro. Quem se vai arrepender és tu."

Desliguei.

A minha mãe aproximou-se e abraçou-me.

"Estou aqui contigo," sussurrou ela. "Vamos passar por isto juntas."

Eu sabia que sim. Mas não íamos apenas "passar por isto".

Íamos lutar.

            
            

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