Vesti-me para a guerra, não para o jantar.
Um vestido preto simples. Cabelo apanhado. Maquilhagem mínima.
Queria que eles vissem o meu rosto. Queria que vissem a ausência de lágrimas.
Quando a minha mãe me viu, ela preocupou-se.
"Tens a certeza disto, filha? Não tens de ir."
"Tenho, mãe. Tenho de os enfrentar."
A casa dos Patterson era grande e imponente, num bairro rico. Cheirava a dinheiro antigo e a hipocrisia.
Ricardo abriu a porta, um sorriso forçado no rosto.
"Sofia, querida. Entra."
Pedro e Clara estavam na sala de estar. Pedro olhou para mim com uma mistura de raiva e cautela. Clara evitou o meu olhar, focando-se em afagar o seu cão, Trovão, que estava deitado aos seus pés.
A mãe deles, Laura, uma mulher com um ar permanentemente descontente, cumprimentou-me com um aceno de cabeça frio.
"Senta-te, Sofia. O jantar está quase pronto."
Sentei-me no sofá oposto a eles. O silêncio era pesado.
Ricardo quebrou-o.
"Olha, Sofia, o que aconteceu foi uma tragédia. Uma terrível tragédia. Estamos todos de coração partido."
Ele olhou para Pedro.
"Mas culpar o Pedro não vai trazer o bebé de volta. Ele fez o que qualquer irmão faria. A Clara estava em pânico."
"Um ataque de pânico," corrigi eu, a minha voz cortante como vidro. "Em casa, segura. Enquanto eu estava esmagada debaixo de metal, a dar à luz o vosso neto."
Clara estremeceu. Pedro cerrou os punhos.
"Não fales assim com a minha irmã!" rosnou ele.
"Porque não? É a verdade. Ou a verdade incomoda-vos?"
Laura interveio, a sua voz gélida.
"Tu sempre foste dramática, Sofia. A fazer uma tempestade num copo de água. O Pedro tem responsabilidades para com a sua família de sangue."
Família de sangue.
Então era isso. Eu era apenas uma peça externa. Descartável.
Sorri. Um sorriso lento, deliberado.
"Têm razão. A família é muito importante. É por isso que decidi honrar a memória do meu filho."
Tirei uma pequena pen USB do meu bolso e coloquei-a na mesa de centro.
"O que é isso?" perguntou Ricardo, desconfiado.
"É uma gravação. De uma chamada telefónica. Um amigo do Pedro, o João, foi muito simpático. Contou-me como o Pedro estava 'aliviado' por se ter 'livrado de um problema'."
O rosto de Pedro ficou branco.
"Ele também mencionou que agora, nada impediria o Pedro e a Clara de ficarem juntos."
Clara levantou a cabeça de repente, o pânico nos seus olhos.
"Isso é mentira! Ele está a mentir!"
"Estou?" perguntei, olhando diretamente para Pedro. "Então porque é que a tua irmã está a usar o colar que me deste no nosso aniversário de casamento?"
O silêncio na sala era agora absoluto. Laura olhou para o pescoço de Clara, onde o pequeno sol de prata brilhava. Os olhos dela arregalaram-se.
Ricardo olhou de Pedro para Clara, a compreensão a surgir lentamente no seu rosto.
"Pedro... o que é que isto significa?" a voz dele era um sussurro perigoso.
Pedro gaguejou, incapaz de formar uma frase.
Levantei-me. O meu trabalho ali estava feito.
"Eu não vim aqui para jantar. Vim para vos dar um vislumbre do inferno que vos espera."
Virei-me para a porta.
"O divórcio vai ser o menor dos vossos problemas. Eu vou expor cada mentira, cada segredo nojento. Quando eu terminar, o nome Patterson será sinónimo de vergonha."
Abri a porta e saí para a noite fria, deixando o caos para trás.
O primeiro tiro tinha sido disparado. E tinha atingido o alvo.