Cem Tentativas, Um Divórcio
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Capítulo 1

Três anos de casamento, noventa e nove tentativas de divórcio.

Esta era a centésima vez.

Sofia Lima olhou para o homem sentado no sofá, Marcos Almeida, seu marido. Ele nem sequer olhou para ela, seus olhos estavam fixos na mulher bonita e delicada ao seu lado, cujas mãos estavam descaradamente pousadas em seu braço.

"Sofia, assine os papéis do divórcio. Eu te dou um apartamento e mais cinco milhões. É o suficiente para você viver o resto da sua vida confortavelmente."

A voz de Marcos era fria, sem um pingo de emoção.

Todo mês ele trazia uma mulher diferente para casa, cada uma mais bonita que a outra, todas com o mesmo propósito: forçá-la a se divorciar.

Sofia sentiu uma pontada no coração, uma dor familiar que já quase se tornara parte dela. Ela apertou a mão atrás das costas, o papel do teste de gravidez amassado em sua palma.

Positivo.

Ela estava grávida.

Ela respirou fundo, suprimindo as lágrimas que ameaçavam cair.

"Marcos, eu não vou me divorciar."

Ela levantou a cabeça, forçando um sorriso.

"Me dê mais um ano. Se em um ano, eu ainda não conseguir engravidar, eu mesma sairei de casa sem levar nada."

Marcos franziu a testa, irritado. Ele odiava a teimosia dela. Ele a via como um obstáculo, uma mancha em sua vida perfeita.

"Um ano? Sofia, você não se cansa disso?"

A mulher ao lado dele riu com desdém.

"Marcos, sua esposa é realmente persistente."

Sofia ignorou a provocação. Ela apenas olhou para Marcos, seus olhos cheios de uma súplica silenciosa. Ele finalmente cedeu, impaciente.

"Tudo bem, um ano! Mas que seja o último. Depois disso, desapareça da minha vida."

Ele se levantou, pegou a mão da outra mulher e saiu, sem sequer olhar para trás.

A porta bateu, e o silêncio na sala era ensurdecedor. Sofia finalmente soltou o ar, seu corpo tremendo. Ela olhou para o teste de gravidez amassado em sua mão. Um filho... talvez um filho pudesse salvar este casamento.

No dia seguinte, a notícia veio como um raio em céu azul.

Um grave acidente de carro. Marcos e seu irmão mais velho, Lucas, estavam no veículo.

Um morto, um ferido.

Sofia correu para o hospital, seu coração batendo descontroladamente. No corredor, ela viu sua sogra, Dona Helena, com o rosto pálido e os olhos vermelhos.

"Mãe, como eles estão?"

Dona Helena a olhou com uma expressão complexa.

"Lucas... Lucas não resistiu. Marcos está gravemente ferido, mas está fora de perigo."

O mundo de Sofia desabou. Lucas, seu cunhado gentil e amável, estava morto. E Marcos... o homem que a humilhara por três anos, estava vivo.

O funeral foi três dias depois. O céu estava cinzento, assim como o coração de todos. Sofia, vestida de preto, ficou em silêncio ao lado do caixão, disfarçando sua dor e a complexidade de seus sentimentos. O homem que a traiu estava morto, mas a dor era real.

Ela se sentiu tonta, o cheiro das flores e a atmosfera pesada a sufocando. De repente, tudo ficou escuro.

Sofia desmaiou no cemitério.

A escuridão não durou muito. Ela começou a ouvir vozes, abafadas, como se viessem de debaixo d'água.

"...Mãe, você tem certeza que ninguém vai descobrir? Fingir minha própria morte... assumir a identidade de Lucas... é loucura!"

Era a voz de Marcos.

Sofia congelou. Morto? Ele não estava morto?

"Cale a boca! Quer que alguém te ouça?", a voz de Dona Helena soou, áspera e ansiosa. "Foi a única maneira, Marcos! Você sempre amou a Ana, e Lucas nunca te daria uma chance com ela. Agora que ele está morto, você pode assumir o lugar dele. Você será o herdeiro da família Almeida, e terá a Ana ao seu lado."

Ana. A noiva de Lucas. O verdadeiro amor de Marcos.

O coração de Sofia se partiu em mil pedaços. A verdade era mais cruel do que qualquer traição que ela já havia sofrido.

"E a Sofia?", a voz de Marcos continuou, cheia de desprezo. "O que eu faço com ela? Agora ela é a 'viúva' do Marcos. Que piada."

"Isso é perfeito!", disse Dona Helena. "Deixe-a ser a viúva. Ela está grávida, não está? Esse filho será uma 'dádiva' sua para a família. Ela continuará na família Almeida, cuidando do seu filho, e você poderá ficar com a Ana sem nenhum obstáculo. Ninguém jamais suspeitará."

Grávida. Eles sabiam.

A náusea subiu pela garganta de Sofia. Não era apenas náusea da gravidez, era uma repulsa profunda por aquele homem e sua família.

O acidente... não foi um acidente. Foi um plano. Um plano para se livrar de Lucas, para se livrar dela.

Naquele momento, uma memória antiga veio à tona. O acidente que quase a matou anos atrás. Marcos a salvou, tirando-a do carro em chamas. Foi por gratidão que ela se casou com ele, ignorando todos os sinais de alerta, suportando três anos de humilhação. Ela sentia que devia sua vida a ele.

Mas agora, com o "desaparecimento" de Marcos, a dívida estava paga. Ele a salvou uma vez, e agora, ao "morrer", ele a libertou.

Ela não devia mais nada a ele.

A raiva, a dor, a traição... tudo se transformou em uma calma assustadora. Ela continuou de olhos fechados, ouvindo a conversa do lado de fora da sala de descanso do cemitério.

"Mas e o corpo no caixão?", perguntou Marcos.

"Não se preocupe, eu cuidei de tudo. Ninguém vai conseguir identificar. Agora, você é Lucas. Lembre-se disso."

Marcos riu, uma risada fria e cruel.

"Pobre do meu irmão. Ele sempre conseguia tudo o que eu queria. Agora, a noiva dele é minha. E aquela idiota da Sofia vai criar meu filho pensando que é uma lembrança do marido morto. É genial, mãe."

"Ela é uma tola leal. Sempre foi. Casou com você por gratidão, vai continuar sendo grata ao 'falecido' Marcos. E o tipo sanguíneo dela é raro, RH negativo. Se o bebê precisar, ela será útil."

Sofia sentiu o sangue gelar. Útil. Era isso que ela era para eles. Uma incubadora e um banco de sangue ambulante.

Ela apertou os punhos com tanta força que sentiu as unhas quebrarem contra a palma da mão. A dor física era um alívio bem-vindo para a agonia em sua alma.

Quando as vozes finalmente se afastaram, Sofia abriu os olhos. O teto branco do pequeno quarto parecia zombar dela.

Ela tocou sua barriga.

Este filho... o filho de um monstro.

Um símbolo de sua estupidez, de sua lealdade cega.

Não.

Ela não iria dar a Marcos a satisfação. Ela não seria a viúva sofredora, a mãe solteira dedicada a uma mentira.

Ela se levantou, sentindo uma tontura, mas sua determinação era mais forte. Ela caminhou até a porta, cambaleando.

No hospital, ela encontrou uma enfermeira. Sua voz estava rouca, mas firme.

"Eu quero fazer um aborto."

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