"Vamos começar de novo, Lívia", disse o Inspetor Alves, sua voz calma, mas firme. "Conte-nos sobre a sua manhã."
Eu respirei fundo, tentando organizar meus pensamentos fragmentados.
"Eu acordei... fiz o café da manhã para o Leo, preparamos a lancheira dele juntos, ele estava animado com o acampamento."
Minha voz falhou ao mencionar o nome dele, a dor fresca e crua.
"Eu o deixei no acampamento, dei um beijo de despedida e fui embora, foi isso."
A Detetive Costa bufou, impaciente.
"Só isso? Você espera que a gente acredite que você simplesmente foi embora e dez minutos depois seu filho aparece morto, decapitado, e a assassina no vídeo é idêntica a você?"
Seu tom era carregado de desprezo, cada palavra era uma acusação.
"Não fui eu!", eu insisti, minha voz subindo. "Aquele vídeo... é uma mentira! Alguém armou para mim!"
"Armou para você?", ela zombou. "Quem teria um motivo para fazer algo tão horrível e culpar você?"
O Inspetor Alves levantou a mão, silenciando-a.
Ele se inclinou para frente, seus olhos fixos nos meus.
"Lívia, vamos assistir ao vídeo novamente."
Ele gesticulou para um policial que estava no canto da sala, e a tela na parede ganhou vida.
Lá estava eu de novo, ou melhor, uma versão monstruosa de mim, o rosto contorcido em uma fúria insana, a faca em minha mão brilhando sob a luz do sol.
Eu vi "eu mesma" agarrar o cabelo do meu filho, eu vi a lâmina se mover, eu fechei os olhos, incapaz de suportar a visão, mas a imagem já estava gravada em minha mente.
"Pare! Por favor, pare!", eu implorei, as lágrimas escorrendo pelo meu rosto novamente.
"Eu não fiz isso! Eu juro! Eu amo meu filho mais do que tudo no mundo!"
Minhas palavras eram um grito desesperado por ajuda, por alguém que acreditasse em mim, mas seus rostos permaneceram impassíveis, convencidos da minha culpa.
"Onde está a faca, Lívia?", perguntou a Detetive Costa, sua voz fria como gelo. "E onde está a cabeça?"
"Eu não sei! Eu não sei!", eu repetia, sentindo a esperança se esvair.
Então, a porta se abriu e o diretor do acampamento, o Sr. Martins, entrou, seu rosto era uma máscara de falsa solenidade.
"Senhor Martins, por favor, nos diga o que você viu esta manhã", disse o Inspetor Alves.
O Sr. Martins olhou para mim com pena fingida antes de se virar para os detetives.
"A Sra. Lívia parecia... estranha quando deixou o filho dela, muito agitada, quase frenética, eu me lembro de ter pensado que algo não estava certo."
Mentira, era tudo mentira, eu estava calma, estava feliz, eu me lembrava de cada segundo daquela manhã.
"Ele está mentindo!", eu gritei. "Ele está envolvido nisso! Por que ele teria um vídeo pronto tão rápido?"
Mas minhas acusações foram ignoradas, a palavra dele, a de uma "testemunha ocular", contra a minha, a de uma "mãe assassina".
A porta se abriu novamente, e desta vez foi Ricardo, meu marido.
Seus olhos estavam vermelhos e inchados, ele parecia um homem quebrado, um homem consumido pela dor.
Ele se sentou ao lado dos detetives, recusando-se a olhar para mim.
"Ricardo, diga a eles", eu implorei. "Diga a eles que eu nunca faria isso, que eu não sou um monstro."
Ele finalmente olhou para mim, e o que eu vi em seus olhos me destruiu mais do que qualquer acusação.
Não havia dúvida, não havia confusão, apenas um ódio profundo e uma certeza absoluta da minha culpa.
Ele se virou para os detetives, sua voz tremendo de uma emoção que eu pensei ser tristeza.
"Ela... ela não estava bem ultimamente", ele começou, cada palavra uma facada em meu coração. "Ela tem um histórico de... problemas, ela fica obcecada, fica com raiva por coisas pequenas, eu nunca... eu nunca pensei que chegaria a isso."
Ele enterrou o rosto nas mãos e começou a soluçar, um som de partir o coração que encheu a sala silenciosa.
E naquele momento, eu entendi, eu estava sozinha, completamente sozinha.
A pessoa que deveria me defender, que me conhecia melhor do que ninguém, estava me condenando.
O Inspetor Alves suspirou, um som pesado e final.
"Lívia, com base no vídeo, no depoimento da testemunha e nas declarações do seu marido, você está sendo formalmente acusada do assassinato do seu filho, Leo", ele declarou, sua voz sem emoção.
"Você ficará detida enquanto continuamos a investigação, e se for condenada, enfrentará a pena máxima, o que significa o resto da sua vida na prisão."
O mundo parou, as palavras ecoaram em meus ouvidos, o resto da minha vida.
Presa por um crime que não cometi, assombrada pela imagem do meu filho morto, traída pelo homem que eu amava.
O desespero me engoliu, um buraco negro sem fundo, e pela primeira vez, uma pequena e terrível semente de dúvida começou a brotar em minha mente.
E se... e se eles estivessem certos?