"Existe uma técnica que às vezes usamos em casos como este, a hipnose, ela pode nos ajudar a acessar memórias que foram reprimidas devido a um trauma extremo."
Hipnose.
A ideia me assustou, a ideia de abrir mão do controle da minha própria mente, especialmente quando eu já não confiava mais nela.
"E se eu vir... e se eu me lembrar de ter feito isso?", eu perguntei, minha voz um fio.
"Se for o que aconteceu, então sim, você se lembrará", ele respondeu com calma. "Mas se você for inocente, a hipnose também pode revelar a verdade, pode nos mostrar o que realmente aconteceu naquele acampamento, você está disposta a tentar? É a nossa melhor chance de encontrar respostas."
Eu estava desesperada, eu precisava de respostas, mesmo que fossem as piores respostas possíveis.
Eu concordei, tremendo.
A sessão foi marcada para o dia seguinte, na mesma sala cinzenta de interrogatório, mas desta vez, a atmosfera era diferente, mais silenciosa, mais intensa.
Eu me sentei em uma poltrona reclinável, o Dr. Morais sentou-se em frente a mim.
"Relaxe, Lívia", ele disse, sua voz suave e rítmica. "Apenas ouça o som da minha voz, sinta seu corpo ficando pesado, seus braços, suas pernas, relaxando profundamente."
Eu fechei os olhos, cética, mas disposta a tentar qualquer coisa.
Sua voz continuou, me guiando para um estado de relaxamento profundo, minha respiração ficou mais lenta, e o mundo exterior começou a desaparecer.
Minha mente, antes um turbilhão de pânico, tornou-se estranhamente calma, como a superfície de um lago espelhado.
"Agora, Lívia, vamos voltar para a manhã de ontem", disse a voz do Dr. Morais, ecoando na minha mente. "Você está deixando Leo no acampamento, o que você vê?"
E então, eu estava lá, a cena se desenrolou em minha mente com uma clareza vívida, o sol em meu rosto, o sorriso de Leo, o som das crianças rindo.
Mas algo estava errado.
Na minha memória hipnótica, eu não fui embora, eu fiquei, escondida atrás de uma árvore, observando.
Eu me vi sentindo uma onda de raiva, uma raiva que não fazia sentido, direcionada ao meu próprio filho por ser tão feliz, tão independente.
"O que você está sentindo, Lívia?", perguntou o doutor.
"Raiva", eu sussurrei, confusa. "Tanta raiva."
A cena mudou, eu estava me aproximando de Leo, que estava sentado em sua cadeira, brincando com sua nave espacial.
Em minha mão, havia uma faca, grande e fria.
Onde eu consegui aquela faca? Eu não me lembrava de tê-la pegado.
A mulher na minha visão, a mulher que era eu, mas não era, se movia com uma determinação fria e assustadora.
Ela não disse uma palavra, seu rosto era uma máscara de fúria silenciosa.
Eu, a observadora dentro da minha própria mente, gritei em silêncio, tentando parar, tentando acordar, mas eu era uma prisioneira em meu próprio pesadelo.
Eu assisti, horrorizada, enquanto minhas próprias mãos agarravam o cabelo do meu filho.
Leo olhou para cima, seus olhos se arregalando de confusão e medo.
"Mamãe?", ele sussurrou.
E então, a mão segurando a faca se ergueu.
O horror daquele momento foi absoluto, era mil vezes pior do que assistir ao vídeo, porque agora, eu estava sentindo.
Eu senti o peso da faca, eu vi o medo nos olhos do meu filho, eu ouvi seu último sussurro.
Eu estava vivenciando o ato, não como uma espectadora, mas como a perpetradora.
Uma dor excruciante atravessou meu coração, uma dor tão intensa que parecia física.
Eu estava matando meu próprio filho.