Pedro, dentro de seu carro de corrida de um azul vibrante, era o centro das atenções. Ele era um piloto amador talentoso, e a corrida de hoje era um grande evento de caridade, atraindo a elite da cidade. Na primeira metade da corrida, ele dominou a pista, suas manobras eram precisas e ousadas. A multidão rugia a cada ultrapassagem, e o narrador gritava seu nome com entusiasmo. Ele era o herói do dia, o favorito indiscutível.
Luana observava tudo com um aperto no peito. Ela conhecia aquele olhar de concentração dele, a maneira como seus ombros ficavam tensos antes de uma curva fechada. E ela sabia, com uma certeza terrível, que tudo aquilo era uma performance.
Na última volta, com a vitória praticamente garantida, algo mudou. Pedro, que estava com uma liderança confortável, reduziu a velocidade de forma quase imperceptível. Em uma curva que ele normalmente faria com perfeição, ele errou a trajetória de propósito, permitindo que seu principal rival, um empresário com quem Sofia tinha uma recente e suspeita amizade, o ultrapassasse. Ele terminou em segundo lugar, um resultado que para qualquer outro seria uma decepção, mas em seu rosto, quando ele saiu do carro, havia um sorriso de satisfação mal disfarçado.
A multidão gemeu em decepção, mas logo começou a aplaudir seu "espírito esportivo". Ninguém percebeu o sacrifício deliberado. Ninguém, exceto Luana.
Seu celular vibrou no bolso. Era Sofia.
"Um presentinho para o meu novo amigo. O que você achou da performance do nosso garoto?"
O ar pareceu ficar mais rarefeito. O sacrifício não era por esporte, era por ela. Por Sofia.
Quase que instantaneamente, o telefone de Luana tocou. Era Pedro.
"Meu amor, você viu? Que pena, eu errei bem no final", sua voz soava falsamente arrependida. "Mas não se preocupe, o importante é competir. Você está bem? Estou indo aí te ver."
Luana respirou fundo, forçando a voz a sair calma. "Estou bem, Pedro. Foi uma ótima corrida."
Ela desligou antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa. A náusea subiu por sua garganta. Ela precisava sair dali. Com uma desculpa apressada para a mãe de Pedro, ela se afastou da multidão, buscando refúgio atrás das arquibancadas.
Longe dos olhares curiosos, ela finalmente se permitiu desabar. As lágrimas que ela segurou por tanto tempo vieram em uma torrente silenciosa. Ela se agachou, abraçando os próprios joelhos, o corpo tremendo com soluços que ela tentava abafar. A humilhação pública, mesmo que secreta, era esmagadora. Ele não apenas a traiu, ele a usou como fachada enquanto fazia favores para a amante dela.
Enquanto tentava recuperar o fôlego, ela abriu o Instagram por um impulso masoquista. E lá estava. Uma postagem de Sofia, feita minutos atrás. Era uma selfie dela com o vencedor da corrida. Na legenda, um agradecimento explícito: "Obrigada pelo presente, campeão! E um agradecimento especial ao cavalheiro que tornou tudo isso possível. 😉"
O emoji de piscadela era um tiro direto em seu coração já ferido. A prova estava ali, para quem quisesse ver, se soubesse onde procurar. A traição não era mais um segredo entre eles, estava sendo insinuada para o mundo.
Quando Pedro finalmente a encontrou, ela já havia enxugado as lágrimas e recomposto a máscara de normalidade. Ele a abraçou, o cheiro de suor e colônia caro a envolvendo, um cheiro que agora lhe causava repulsa.
"Eu sei que você está desapontada, meu amor", ele disse, a voz suave e manipuladora. "Mas pense pelo lado bom, é para caridade. E lembra quando eu queimei minhas costas para te salvar? Aquilo foi uma dor real. Isso aqui não é nada."
Ele estava usando o passado, o seu ato heroico, como uma arma para fazê-la se sentir culpada por estar chateada. Ele sempre fazia isso. Minimizava suas dores comparando-as a sacrifícios que ele fez, sacrifícios que agora pareciam ter um preço.
Luana se afastou dele, o toque de sua mão em seu braço queimando como fogo. Onde estava aquele homem que a olhava com uma adoração que parecia real? Aquele homem cujos olhos brilhavam de paixão? Olhando para ele agora, ela só via um vazio, um ator interpretando um papel que já não lhe servia.
Como o amor deles, que parecia tão forte e verdadeiro, pôde se deteriorar a este ponto? A pergunta ecoava em sua mente, mas não havia resposta. Apenas a constatação fria de que tudo o que ela acreditava ser verdade era uma mentira.
Ele tentou beijá-la, um gesto possessivo para reafirmar seu domínio. O contato de seus lábios foi a gota d'água. Um gosto amargo de bile subiu por sua garganta. Ela o empurrou com uma força que o surpreendeu.
"Não me toque", ela sibilou, a voz trêmula de raiva e nojo.
Ela se virou e correu para o banheiro mais próximo. Trancou-se em uma cabine e se curvou sobre o vaso sanitário, o corpo convulsionando. Quando não havia mais nada para colocar para fora, ela abriu a torneira e lavou a boca repetidamente, esfregando os lábios com as costas da mão, tentando desesperadamente apagar o vestígio do beijo dele, o gosto da traição.
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