Cheguei em casa mancando, o tornozelo inchado e latejando. Minha avó, Helena, estava sentada na poltrona da sala, seu rosto pálido e vincado de preocupação. Sua saúde era frágil desde que se aposentou; qualquer choque poderia ser perigoso.
"Ana, querida! O que aconteceu com você? Por que demorou tanto?" , ela perguntou, a voz fraca.
"Eu... eu só precisava de um tempo para pensar, vovó" , menti, tentando esconder meu mancar enquanto ia para o meu quarto. "A audição não foi boa" .
Eu não queria que ela soubesse de toda a humilhação, e especialmente não da traição. O choque seria demais para ela.
Mas minha paz durou pouco. A campainha tocou. Era Sofia, com Pedro a reboque. Seus rostos eram máscaras de falsa preocupação.
"Ana! Nós ficamos tão preocupados! Você sumiu!" , disse Sofia, sua voz alta o suficiente para que minha avó ouvisse da sala.
Ela entrou sem ser convidada, seus olhos imediatamente caindo sobre o meu tornozelo. Um sorriso cruel e fugaz brilhou em seu rosto antes de ser substituído por horror fingido.
"Meu Deus, seu tornozelo! O que aconteceu?" , ela exclamou.
Minha avó apareceu na porta da sala, apoiada em sua bengala.
"O que houve com o tornozelo dela?" , perguntou Helena, alarmada.
"Eu não sei, Vovó Helena" , disse Sofia, com a voz pingando veneno. "Ela já estava estranha na audição. Fez uma cena terrível, dançou tudo errado. E agora aparece assim. Acho que a pressão foi demais para ela" .
"Não foi isso que aconteceu!" , eu disse, a raiva subindo pela minha garganta.
"Ana, por favor, não piore as coisas" , Pedro interveio, com seu tom de falso apaziguador. Ele se virou para minha avó. "Ela não estava focada, senhora Helena. Ela se desequilibrou feio durante a apresentação. Foi por isso que ela foi desqualificada. Foi vergonhoso" .
As palavras dele foram como socos. Ele não apenas mentiu, ele me humilhou na frente da minha avó.
O rosto da minha avó perdeu toda a cor. Seus olhos, que um dia foram os mais perspicazes do mundo da dança, agora estavam cheios de dor e confusão. Ela olhou para mim, depois para eles.
"Vergonhoso?" , ela sussurrou.
"Sim" , disse Sofia, implacável. "Todos no teatro estavam comentando. Que ela perdeu o talento. Que ela nunca deveria ter tentado a audição" .
Foi o golpe final.
Minha avó levou a mão ao peito, seu rosto se contorcendo de dor. Ela ofegou, seus joelhos cederam.
"Vovó!" , gritei, correndo em sua direção, esquecendo a dor no meu tornozelo.
Ela desabou no chão, inconsciente.
Pedro e Sofia ficaram parados na porta, seus rostos pálidos de choque. A crueldade deles havia ido longe demais, e agora as consequências estavam ali, caídas no chão da nossa sala. A sirene da ambulância, que eu chamei em pânico, parecia o som do meu coração se partindo.