O telefone tocou incessantemente, o som áspero ecoando pelo quarto silencioso do hospital.
Era o meu marido, Lucas.
Ele ligou-me vinte e três vezes.
Não atendi nenhuma delas.
A minha irmã mais nova, Eva, sentada ao meu lado, olhou para o ecrã a piscar e franziu o sobrolho.
"Mana, porque é que não atendes? O Lucas deve estar preocupado."
Sorri, um sorriso que não chegou aos meus olhos.
"Preocupado? Se ele estivesse preocupado, não estaria a ligar, estaria aqui."
A Eva ficou em silêncio, a sua lealdade dividida.
Finalmente, o telefone parou de tocar. Um segundo depois, uma mensagem de texto chegou.
Era do meu sogro, o Senhor Matias.
"Sofia, o que se passa contigo? O Lucas está a tentar ligar-te o dia todo. Ele está a organizar o funeral do avô, está exausto e ainda tem de lidar com o teu mau humor. Podes ser um pouco mais compreensiva?"
Compreensiva.
Essa palavra era uma piada.
No dia em que o avô do Lucas faleceu, eu estava no mesmo hospital, a um andar de distância, a fazer uma cirurgia de emergência.
A minha gravidez ectópica tinha rompido.
Quase morri na mesa de operações devido a uma hemorragia interna.
Liguei ao Lucas inúmeras vezes antes de desmaiar. Ninguém atendeu.
Mais tarde, soube que ele estava ao lado da sua ex-namorada, a Clara, a consolá-la porque o seu cão tinha sido atropelado por um carro.
O avô dele ainda estava vivo e de boa saúde nesse momento. Ele só faleceu subitamente de um ataque cardíaco na manhã seguinte.
Respondi calmamente ao meu sogro: "Eu também estou no hospital. Tive uma cirurgia."
A resposta dele foi quase instantânea, cheia de raiva.
"Que tipo de cirurgia poderias ter? Uma cirurgia plástica? Sofia, agora não é altura para as tuas birras. A família está de luto. Se não queres vir ajudar, pelo menos não causes problemas."
Olhei para a mensagem, o meu coração completamente dormente.
Não me dei ao trabalho de explicar mais.
Apaguei a mensagem e coloquei o telefone no modo silencioso.
A Eva observava-me, os seus olhos cheios de preocupação. "Mana, o que vais fazer? Tu e o Lucas..."
"Vou divorciar-me dele, Eva."
Disse-o com calma, como se estivesse a falar do tempo.
Não havia mais nada a que me agarrar. O bebé, a minha última esperança para este casamento, tinha desaparecido. E com ele, qualquer ilusão que eu ainda tivesse.
O Lucas não me amava. Talvez nunca tenha amado.
Eu era apenas uma esposa conveniente, alguém que cuidava da casa e parecia bem ao seu lado em eventos sociais.
O seu coração sempre esteve com a Clara.
Todos sabiam, mas eu era a única tola que se recusava a ver.
"Divórcio?" A Eva engasgou-se. "Mas... e a família? O que vão dizer os nossos pais?"
"Isso já não importa," disse eu, a minha voz firme. "Isto é sobre mim. Sobre a minha vida."
Fechei os olhos, a exaustão a pesar sobre mim.
A imagem do Lucas a segurar a Clara, a sussurrar-lhe palavras de conforto enquanto eu sangrava sozinha, estava gravada na minha mente.
Essa imagem era tudo o que eu precisava para seguir em frente.
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