"Tudo bem, podemos só... ficar juntos um pouco? Sinto sua falta," eu sussurrei, tentando iniciar um carinho, um beijo.
Ele se encolheu, afastando meu toque como se fosse algo incômodo, "Sofia, agora não, eu realmente não estou com cabeça para isso."
A rejeição foi como um balde de água fria, mas era uma sensação familiar, a frieza dele era uma constante em nossos dias, e a esperança que eu ainda alimentava parecia cada vez mais tola.
Eu me levantei em silêncio e comecei a limpar a mesa, guardando a comida que ele nem provou, cada prato que eu colocava na pia parecia pesar uma tonelada.
Mais tarde, deitada na cama, fingi estar dormindo quando ouvi Ricardo atender uma ligação na varanda, sua voz era baixa, mas o vento da noite trazia suas palavras até mim.
"Não, ela não desconfia de nada, é ingênua demais para isso," ele riu, uma risada que me causou um calafrio, "Sim, a mesma chatice de sempre, tentando ser romântica, é patético."
Cada palavra era uma facada, a traição não estava apenas em suas ações, mas no desprezo em sua voz, na forma como ele me diminuía para outra pessoa. A raiva começou a queimar dentro de mim, uma fúria fria e clara que secou minhas lágrimas antes que pudessem cair.
Fiquei acordada a noite toda, olhando para o teto, a decisão se formando em minha mente com uma certeza assustadora, eu não podia mais viver assim, sendo um fantasma em minha própria casa, um objeto de pena e desprezo.
Na manhã seguinte, quando Ricardo desceu para o café, eu já estava com uma pequena mala pronta ao lado da porta, eu não gritei nem chorei, apenas o encarei com uma calma que o surpreendeu.
"Ricardo, acabou," eu disse, minha voz firme, "Estou indo embora."
Ele pareceu mais irritado do que triste, "Sofia, que drama é esse agora? Por causa de ontem à noite? Você sempre faz uma tempestade em copo d'água."
Eu não respondi, apenas peguei minha bolsa, a indiferença dele era a confirmação final de que eu estava fazendo a coisa certa, ele não me amava, talvez nunca tenha amado.
Quando saí do nosso prédio, pedi um carro por aplicativo sem um destino certo, apenas precisava de distância, mas o destino, irônico como sempre, tinha outros planos. O carro virou uma esquina e eu o vi, o carro de Ricardo estacionado em uma rua tranquila.
E dentro dele, Ricardo beijava outra mulher, Laura, sua colega de trabalho, ele a beijava com uma paixão que eu não via há anos, uma paixão que ele sempre me negou.
A dor foi física, aguda, me deixando sem ar, meu corpo inteiro gelou, e eu só consegui observar a cena, a traição se desenrolando bem na minha frente, em cores vivas e cruéis.
Ricardo me viu olhando, seu rosto se contorceu em raiva, não em culpa, ele saiu do carro bruscamente e veio em minha direção, enquanto Laura permanecia lá dentro, com um sorriso vitorioso no rosto.
"O que você está fazendo aqui? Está me seguindo, Sofia? Que patético," ele cuspiu as palavras, seu tom cheio de desprezo.
"Eu...", eu não conseguia formar uma frase, a humilhação era sufocante.
"Volte para casa e pare de fazer escândalo," ele ordenou, como se eu fosse uma criança desobediente, "Laura não tem nada a ver com isso."
A forma como ele a defendeu, a forma como me tratou como lixo, aquilo quebrou a última fibra de amor que eu ainda poderia sentir por ele, não havia mais dor, apenas um vazio gelado e uma resolução.
Eu olhei para ele, para o homem que eu amei por três anos, e não vi nada além de um estranho, me virei e comecei a andar, sem olhar para trás.
Cada passo para longe dele era um passo em direção a mim mesma, a tristeza ainda estava lá, pesada em meus ombros, mas misturada a ela, havia um fio de alívio, a guerra silenciosa e solitária que eu travava todos os dias finalmente havia terminado.