De Gata Borralheira à Rainha
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Capítulo 3

Dois dias depois, no meu aniversário, a porta da frente se abriu e Pedro entrou com Clara. Eles tinham voltado de uma viagem curta. O sorriso dele era radiante, mas congelou um pouco ao me ver na sala.

"Sofia! Feliz aniversário, pequena," ele disse, se aproximando. Ele me entregou uma caixinha de veludo. "Isso é pra você."

Eu peguei a caixa, meu coração dando um solavanco involuntário. Abri e vi um colar de prata delicado, com um pequeno pingente em forma de nota musical. Era bonito.

"Nossa, Pedro, que lindo," consegui dizer.

Clara se aproximou, olhando por cima do meu ombro com um sorriso falso.

"Ah, Pedro, você deu pra ela o colar que a gente viu naquela vitrine em Búzios? Achei que você ia me dar de presente," ela disse, com uma voz manhosa que me deu náuseas.

O ar ficou pesado. Então o presente não tinha sido escolhido para mim. Foi algo que ele viu, provavelmente com ela, e comprou por impulso ou, pior, como um prêmio de consolação. A beleza do colar se desfez na minha mão, tornando-se apenas um pedaço de metal frio e impessoal.

Uma onda de lembranças me atingiu. Lembrei do meu aniversário de quinze anos, quando Pedro passou semanas procurando por um par de sapatos de dança perfeitos para mim, porque os meus estavam gastos. Lembrei de como ele preparou meu bolo favorito no ano passado, todo desajeitado na cozinha, porque sabia que eu estava me sentindo triste.

Aquele cuidado, aquela atenção aos detalhes... tudo isso tinha desaparecido. Agora, eu recebia um presente de segunda mão, uma sobra da atenção que ele dedicava a outra mulher.

Forcei um sorriso, fechando a caixa.

"Obrigada, Pedro. É lindo. Obrigada, Clara, por me deixar ficar com ele." Minha voz saiu com uma ponta de sarcasmo que só eu percebi.

Clara riu, se aninhando no braço de Pedro. Ela me ignorou completamente e olhou para ele com adoração.

"Amor, falando em presentes, já que a Sofia está aqui, podemos contar a ela a novidade?"

Pedro a beijou na testa. "Claro, meu bem."

Clara se virou para mim, o sorriso agora triunfante.

"Nós vamos nos casar! Marquei a data hoje mesmo. Vai ser o casamento do ano! Você tem que ir, Sofia! Quero que seja minha madrinha."

Cada palavra era uma punhalada.

"Que dia?" perguntei, a voz um fio.

"Daqui a duas semanas, no sábado, dia vinte e três," ela disse, radiante.

Meu estômago gelou. Dia vinte e três. O mesmo dia em que eu havia marcado de sair da cidade com Lucas para começar nossa nova vida. O mesmo dia em que eu planejava minha fuga. O universo parecia estar rindo da minha cara, com uma ironia cruel.

Eu senti uma dor aguda no peito, mas meu rosto permaneceu calmo.

"Parabéns. Fico muito feliz por vocês," eu disse, com a maior sinceridade que consegui forjar. "Mas, infelizmente, não poderei ir. Já tenho um compromisso nesse dia."

Pedro franziu a testa, seu olhar protetor aparecendo por um instante.

"Por que não? Aconteceu alguma coisa? Que compromisso é mais importante que o meu casamento?"

A preocupação dele era tardia e superficial. Antes que eu pudesse responder, Clara o puxou pelo braço.

"Deixa ela, amor. Deve ser alguma coisa da favela. Agora vem, me ajuda a levar as malas lá pra cima. Estou exausta."

A preocupação de Pedro se dissipou tão rápido quanto surgiu. Ele sorriu para Clara e a seguiu, deixando-me sozinha na sala com a caixa de veludo na mão e o gosto amargo da ironia na boca.

            
            

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