Quando a Morte Revela a Verdade
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Capítulo 3

Juliette ignorou a oferta de Hugo, levantando-se com os cacos da sua herança nos braços. Ela passou por ele como se ele não existisse, a sua dor um manto que a isolava de tudo.

"Eu disse que te compro outra!" gritou ele, frustrado com a sua falta de reação. Ele seguiu-a até ao quarto dela, vendo-a colocar os restos da guitarra cuidadosamente sobre a cama. O seu olhar caiu sobre a mesa de cabeceira dela, onde um frasco de comprimidos estava à vista.

"O que é isto?" ele perguntou, estendendo a mão.

O coração de Juliette parou. Eram os seus analgésicos.

"Hugo, querido, deixa-a em paz," a voz de Cecilia interrompeu, vinda da porta. Ela entrou, salvando Juliette sem o saber. "Vem, vamos deixar a rainha do drama com o seu luto."

Hugo hesitou, mas acabou por seguir Cecilia para fora do quarto, deixando Juliette a tremer de alívio e raiva.

Mais tarde, Cecilia confrontou Juliette no jardim. O sol de Lisboa brilhava, mas o ar entre elas estava gelado.

"Sabes, eu sempre te invejei," confessou Cecilia, sem rodeios. "O teu talento, a atenção que recebeste, a forma como Hugo olhava para ti. Eu queria tudo o que tu tinhas."

Juliette olhou-a, a magnitude da sua traição a assentar finalmente. "Então, destruíste tudo. Por inveja."

"Eu não destruí nada que já não estivesse partido," retorquiu Cecilia. "Eu só dei um empurrão. Fui eu que editei a gravação, Juliette. Fui eu que mostrei ao Hugo. Ele nunca confiou em ti, e eu só usei isso."

A confissão pairou no ar, cruel e definitiva. Cecilia sorriu, um sorriso que não alcançou os seus olhos.

"E agora, vou tirar-te tudo o que resta."

Com uma rapidez chocante, Cecilia agarrou num pequeno ancinho de jardim e arranhou o próprio braço, fundo o suficiente para sangrar. Ela soltou um grito agudo.

"Hugo! Socorro! A Juliette está a tentar matar-me!"

Hugo correu para o jardim, o seu rosto uma máscara de fúria ao ver o braço ensanguentado de Cecilia e Juliette parada ali, pálida de choque.

"O que é que lhe fizeste?" rugiu ele para Juliette.

"Eu não fiz nada," sussurrou ela, mas sabia que era inútil. Ele já a tinha condenado.

"Ela está com ciúmes porque eu estou contigo!" choramingou Cecilia, agarrando-se a Hugo.

Juliette olhou para o rosto de Hugo, para a desconfiança e o ódio nos seus olhos, e sentiu algo dentro dela a quebrar para sempre. Ela estava cansada de lutar, cansada de tentar provar a sua inocência a um homem que se recusava a acreditar nela.

Para se libertar, para o libertar, ela disse as palavras que sabia que o destruiriam.

"Ela tem razão. Eu odeio-a por estar contigo," disse ela, a voz fria e vazia. "Mas não tanto como eu te odeio a ti, Hugo. Eu nunca te amei. Foi sempre pelo dinheiro."

A dor no rosto dele foi instantânea e profunda. Foi a mesma dor que ele sentiu no dia do casamento, e vê-la de novo deu a Juliette uma satisfação amarga e vazia.

"Pede-lhe desculpa," disse Hugo, a voz a tremer de raiva contida. "Ajoelha-te e pede-lhe desculpa."

Juliette olhou para ele, depois para Cecilia, que sorria triunfante por trás do ombro de Hugo. Ajoelhar-se? Humilhar-se perante a mulher que lhe tinha roubado tudo?

Não.

Em vez disso, ela olhou para o chão, onde um caco de um vaso partido brilhava ao sol. Sem hesitar, ela baixou-se, pegou no caco e, com um movimento rápido e deliberado, cortou a palma da sua própria mão.

O sangue escorreu, vermelho e quente, sobre a sua pele. Ela olhou diretamente para Hugo, o seu olhar desafiador, a sua dor física um reflexo pálido do seu tormento interior.

"Estás satisfeito agora?" perguntou ela, a sua voz um sussurro.

Hugo olhou para a mão dela a sangrar, para o seu rosto apático, e o seu triunfo vacilou. Ele queria uma reação, queria ciúmes, raiva, lágrimas. Não esta calma assustadora, esta autodestruição silenciosa.

Ele ficou chocado, perturbado, e pela primeira vez, sentiu um pingo de medo.

            
            

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