Houve um silêncio do outro lado da linha. Um silêncio que pesava.
"Ah, isso", ela finalmente disse, com uma frieza que o assustou. "Eu matriculei o Pedro. Ele começa amanhã."
O mundo de João parou. Ele sentiu o ar faltar em seus pulmões.
"Você o quê? Por quê? Sem falar comigo?"
"Ele quebrou o relógio do Miguel, João. Um relógio caríssimo. Ele precisa aprender a ter limites, a respeitar as coisas dos outros. Foi um acidente, mas ele precisa de disciplina."
Miguel. O melhor amigo dele, que nos últimos meses parecia mais amigo de Maria do que dele. O relógio. Tinha sido um acidente estúpido, Pedro tropeçou enquanto corria.
"Maria, é só um relógio! Ele é uma criança! Você não pode mandá-lo para um lugar desses por causa disso!"
"Eu posso e já fiz", ela respondeu, a voz cortante. "A decisão está tomada. É para o bem dele."
"Traga ele de volta, Maria. Agora. Eu estou te implorando."
"Não seja dramático, João. Ele vai ficar bem. Pare de me ligar, estou com o Miguel resolvendo umas coisas."
Ela desligou.
O pânico tomou conta de João. Ele pegou as chaves do carro, o panfleto amassado na mão. O endereço era longe, em uma área rural. Ele dirigiu como um louco, o coração batendo descontroladamente no peito, uma premonição terrível o consumindo.
Ao chegar, a "escola" não parecia em nada com o panfleto. Era um prédio cinza, velho, com muros altos e arame farpado no topo. Um ar de abandono e tristeza pairava sobre o lugar.
Ele correu para a recepção, exigindo ver seu filho. Uma mulher de rosto severo tentou impedi-lo, falando sobre "protocolos" e "período de adaptação". João não ouviu. Ele a empurrou e correu pelos corredores, gritando o nome de Pedro.
Ele abriu uma porta e o encontrou.
Pedro não estava sorrindo. Ele estava deitado em uma cama de metal, pálido, com o corpo inerte. Fios estavam conectados à sua cabeça e braços. Ao lado da cama, um aparelho que João reconheceu vagamente de filmes antigos. Uma máquina de eletrochoque.
Seu filho estava em coma.
Um enfermeiro correu em sua direção, gaguejando desculpas. "Ele foi... resistente. Precisamos usar o protocolo de contenção... a dosagem foi um pouco alta demais."
João caiu de joelhos ao lado da cama do filho, o mundo desmoronando ao seu redor. Ele pegou a mãozinha fria de Pedro, as lágrimas queimando seus olhos. Ele pegou o celular, trêmulo, e ligou para Maria de novo. E de novo.
Caixa postal.
Desesperado, ele ligou para Miguel. A chamada foi atendida no primeiro toque.
"Alô?"
Ao fundo, João ouviu a risada de Maria. Uma risada leve, feliz.
"Miguel, cadê a Maria? O Pedro... o Pedro está no hospital!"
Houve uma pausa. Ele ouviu Miguel sussurrar para Maria: "É o seu marido idiota."
Então, a voz de Maria, abafada, mas clara: "Diz que eu não posso falar, amor. Estamos comemorando."
O estômago de João revirou. Comemorando o quê?
Antes que Miguel pudesse responder, uma notificação de mensagem brilhou na tela do celular de João. Era uma mensagem que Maria enviara para um grupo de amigas, mas que por engano, o incluiu.
Uma foto. Maria, sorrindo, abraçada a Miguel. A mão dela repousava sobre a própria barriga, e a legenda dizia: "Finalmente vamos ter nossa própria família! Grávida do homem da minha vida!"
João olhou para a foto, depois para o filho inconsciente na cama. Um grito de pura agonia rasgou sua garganta, um som desumano que ecoou pelos corredores frios daquele lugar infernal. Ele abraçou o corpo pequeno de Pedro e chorou, pedindo a Deus que aquilo fosse apenas um pesadelo.
Ele precisava tirar seu filho dali. Ele precisava acabar com aquele casamento. Precisava destruir o mundo de Maria como ela havia destruído o dele.