A Maldição de Ricardo
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Capítulo 3

As horas seguintes se passaram em uma névoa de dor e raiva. Ricardo ficou sentado no chão, no meio dos destroços de sua sala e dos papéis que provavam a traição de Sofia. Ele não se moveu. Apenas olhava para o vazio, a mente repassando cada mentira, cada sacrifício, cada palavra falsa. Cada "não temos dinheiro, meu amor" agora soava como um insulto, uma facada. Ele se lembrou de Felipe, estudando à luz de velas quando a energia foi cortada por falta de pagamento, enquanto Sofia, em algum lugar, comprava um relógio de luxo para Marcos. A dor era física, uma pressão esmagadora em seu peito.

O som da chave na porta o tirou de seu torpor.

Sofia entrou.

Ela estava vestida para o papel de viúva enlutada. Usava um vestido preto simples e barato, o cabelo preso de qualquer maneira, o rosto sem maquiagem e marcado por uma tristeza estudada. Ela olhou para a destruição na sala, os olhos se arregalando em choque fingido.

"Ricardo? O que aconteceu aqui? Meu Deus, você está bem?"

Ela correu em sua direção, os braços abertos para um abraço de consolo. Mas, pela primeira vez, Ricardo a viu de verdade. Ele a viu através do véu da mentira.

Enquanto ela se aproximava, ele sentiu. Não o cheiro familiar de sabonete barato que ela sempre usava em casa, mas uma fragrância sutil e cara, um perfume floral que ele nunca sentira nela antes. Estava impregnado em seu cabelo, em sua pele. Ele olhou para suas mãos, que tentavam tocar seu rosto. As unhas, que ela sempre mantinha curtas e sem esmalte, estavam perfeitamente lixadas, com um brilho discreto de base cara.

Seus olhos desceram para o vestido preto. Parecia simples, mas ele notou o corte, o tecido. Era de uma qualidade muito superior às roupas surradas que ela guardava em seu lado do armário. Era uma fantasia. Uma fantasia de pobreza para ele e Felipe.

"Meu amor, eu sinto tanto", ela sussurrou, a voz embargada de lágrimas falsas. "Eu não posso acreditar que nosso Felipe..."

Ela tentou abraçá-lo, envolver seus braços ao redor de seu pescoço. O toque de sua pele o encheu de repulsa. Era como ser tocado por uma estranha, uma impostora. O cheiro de seu perfume caro o sufocava, misturando-se com a memória do desinfetante do hospital e da bile em sua garganta.

Um tremor de nojo percorreu seu corpo.

Ele reagiu instintivamente.

Com uma força que ele não sabia que tinha, ele a empurrou. Não foi um empurrão suave. Foi um ato de repulsa violenta. Suas mãos se chocaram contra os ombros dela, empurrando-a para trás com força.

Sofia tropeçou, surpresa, os olhos arregalados com a rejeição inesperada. Ela quase caiu, conseguindo se equilibrar no último segundo. O choque em seu rosto era genuíno. Não pelo luto, mas pela quebra de seu controle, pela recusa dele em seguir o roteiro que ela havia escrito.

"Ricardo!", ela exclamou, a voz perdendo o tom de tristeza e ganhando uma nota de indignação. "O que deu em você?"

Ele não respondeu. Apenas a encarou, os olhos frios e vazios. Ele não precisava de palavras. Seu corpo já havia falado por ele. O toque dela era veneno. A presença dela era uma profanação à memória de seu filho. Naquele momento, o muro que a separava dele não era apenas emocional, era físico. Ele não conseguia mais suportar a proximidade da mulher que havia orquestrado a ruína de sua família.

            
            

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