Naquele instante, os quatro anos de relacionamento desmoronaram. Cada beijo, cada abraço, cada promessa, tudo se revelou uma farsa elaborada. Ele nunca me amou, ele sempre amou Sofia. E que males eu precisava redimir? Eu não fazia a menor ideia.
Uma raiva fria tomou conta de mim, substituindo a dor. Se a vida deles era uma peça de teatro, eu seria a diretora da cena final, a que destruiria tudo.
Peguei meu celular, o coração batendo descontroladamente. Rolei a lista de contatos até encontrar um nome que eu não discava há anos. Gabriel Silva. O noivo arranjado de Sofia.
A ligação completou. A voz dele era baixa e formal do outro lado.
"Alô?"
Eu respirei fundo, forçando minha própria voz a sair firme.
"Sr. Silva, você disse uma vez que esperaria por mim. Essa promessa ainda vale?"
Houve um silêncio do outro lado da linha, tão denso que eu podia sentir. Depois de uma eternidade, ele respondeu com uma única palavra, carregada de um peso que eu não compreendia.
"Sim."
Desliguei. As lágrimas que eu segurei finalmente caíram, silenciosas e amargas. Minha devoção, meu amor, tudo tinha sido em vão.
Saí de casa e me sentei no balanço do quintal, o mesmo que meu pai construiu para mim antes de abandonar a mim e à minha mãe. O ar frio da noite me envolveu, mas não era mais frio do que o gelo no meu peito.
Pedro me encontrou ali minutos depois. Ele trazia nos lábios o mesmo sorriso gentil de sempre, uma máscara que agora me causava nojo.
"Lívia? Por que está aqui fora? Vai pegar um resfriado."
Minha mente estava vazia. Eu apenas o encarei, sem expressão.
Ele se aproximou, tentando parecer preocupado.
"Vamos entrar. Está frio."
Meus olhos estavam vermelhos de chorar, e eu sabia que ele notou.
"Você me ama?" perguntei, a voz rouca.
A resposta dele foi automática, ensaiada.
"Amo, sim," ele disse com um sorriso, levantando a mão para tocar meu cabelo.
Eu me desviei. Foi um movimento sutil, mas ele percebeu. Ele riu, um som baixo e sem humor, e pegou minha mão. Desta vez, não resisti. Senti o calor da pele dele, mas meu corpo continuava gelado. Era como segurar a mão de um estranho.
Dentro de casa, ele agiu como sempre. Preparou um chá, colocou um cobertor sobre minhas pernas enquanto eu me deitava no sofá. Um namorado perfeito, uma atuação impecável.
Eu apenas assenti, o rosto obediente, o interior em ruínas.
"Gosta de atuar?", pensei comigo mesma, olhando para ele. "Então vamos atuar juntos."
No dia seguinte, era o aniversário de morte da minha mãe. Era o dia em que eu sempre visitava o túmulo dela. Pedro sabia disso. Ele sempre ia comigo, desde que meu pai parou de ir. Mas hoje, quando acordei, ele já tinha saído. Sem um bilhete, sem uma mensagem.
Fui ao cemitério sozinha.
Diante da lápide de mármore frio, a foto da minha mãe sorria para mim, um sorriso gentil que a vida lhe roubou cedo demais.
"Mãe, este ano só eu vim te ver."
Minha mãe e meu pai já foram o casal mais invejado da cidade. Ele, um empresário em ascensão, ela, uma artista talentosa. Durante a doença dela, meu pai foi a imagem da devoção. Ele corria do trabalho para o hospital, passava noites em uma poltrona desconfortável ao lado da cama dela. Quando ela morreu, ele pareceu envelhecer dez anos da noite para o dia. Todos diziam que ele a amava loucamente.
Mas um mês depois do funeral, ele trouxe para casa outra mulher, Ana, e a filha dela, Sofia. Foi quando descobri que o caso deles já durava anos.
Nos primeiros anos, meu pai ainda me acompanhava ao cemitério. Depois, começou a inventar desculpas de trabalho. Por fim, ele simplesmente parou de mencionar o nome da minha mãe.
Pedro, ao saber da minha solidão, me abraçou e prometeu solenemente.
"Não se preocupe, Lívia, você me tem. Todo ano eu irei com você ver sua tia."
Mas Pedro também falhou. Corações mudam, eu deveria saber disso.
Eu não sabia para onde ele tinha ido, mas descobri assim que abri meu celular. Sofia, minha meia-irmã, tinha acabado de voltar do exterior. Ela postou um vídeo no Instagram. Nele, Pedro a abraçava de forma protetora no meio da multidão do aeroporto, afastando as pessoas para abrir caminho para ela. A legenda dizia: "Meu cunhado é o melhor ❤️".
Silenciosamente, eu curti a postagem.
Cinco minutos depois, meu celular tocou. Era Pedro. A voz dele era dura, acusadora.
"Lívia, o que você está aprontando? Eu fui buscar sua irmã de bom coração, e você fica com essa ironia?"
Apenas um "curtir" se tornou ironia?
Ele continuou, a insatisfação clara em sua voz. "Você é inacreditável, Sofia é sua irmã, e você nem foi buscá-la no aeroporto!"
"Eu fui ver minha mãe," respondi, a voz sem emoção.
Houve um silêncio de alguns segundos do outro lado. Então, ele suspirou, como se estivesse lidando com uma criança teimosa.
"Pessoas vivas não são mais importantes que as mortas? Você não precisa ficar brava por uma coisa tão pequena, não é?"
Mas eu não estava brava. E para mim, minha mãe era a pessoa mais importante do mundo.
"Minha mãe é a mais importante!"
Desliguei na cara dele e coloquei o celular no silencioso. O mundo finalmente ficou em paz.