Contrato de Amor: Segredos e Promessas
img img Contrato de Amor: Segredos e Promessas img Capítulo 4 Um veneno doce
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Capítulo 6 Preso na língua img
Capítulo 7 Quando tudo desabar img
Capítulo 8 Ele sabia onde apertar img
Capítulo 9 Sem deixar uma cicatriz img
Capítulo 10 Assina o contrato img
Capítulo 11 Clara chega à mansão img
Capítulo 12 Primeira ceia juntos: tensão, sarcasmos, atração contida img
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Capítulo 4 Um veneno doce

O vestido que Clara usava era emprestado. Ainda cheirava ao perfume floral de Luísa, sua amiga, que insistiu para ir ao evento beneficente.

"Vai, Clara. Se não for para conseguir doações para sua campanha de páscoa, vai pelo menos para tirar a cara desse forno."

Ela tentou recusar. Tentou mesmo. Mas depois de mais uma madrugada de cálculos, dívidas e contas atrasadas, não teve forças para dizer não.

Assim, ali estava ela: num salão de festas de um hotel cinco estrelas, segurando uma taça de espumante que não ousava beber de verdade, com um sorriso educado, repetindo as mesmas frases: "Sou da Confeitaria Martins, sim, a da rua Augusta... claro, doces caseiros, receitas da minha avó..."

À sua volta, vestidos longos e ternos impecáveis. Risadas contidas, flashes de fotógrafos, garçons flutuando com bandejas prateadas. Clara se sentia deslocada, como um bombom perdido em uma vitrine de joias.

Passou os olhos pelo salão, procurando Luísa, mas só avistou cabeças desconhecidas. Apertou a bolsinha contra o peito, respirando fundo. Talvez fosse a hora de ir embora antes que percebesse que ninguém ali doaria um centavo para salvar uma padaria antiga.

- Perdida, Clarinha? - disse uma voz baixa, quase divertida, atrás dela.

O coração de Clara deu um salto que espalhou calor até a ponta dos dedos. Ela se virou devagar, como se temesse confirmar o pressentimento.

Enzo Albuquerque.

Claro que ele estaria ali. O anfitrião não oficial de qualquer evento onde houvesse dinheiro para mostrar ou poder para barganhar. O smoking caía nele como uma armadura feita sob medida. Gravata borboleta frouxa, o copo de uísque na mão esquerda, o sorriso preguiçoso nos lábios. E aqueles olhos, que pareciam acender toda vez que miravam nela.

- Eu poderia perguntar o mesmo -rebateu Clara, forçando uma calma que não sentia-. Não sabia que filantropos da sua espécie se misturavam com reles padeiras.

Enzo sorriu, inclinando-se para falar mais perto. O cheiro do seu perfume caro quase fez Clara fechar os olhos. Quase.

- Você não é reles nada, Clarinha -ele girou o copo na mão, sem tirar os olhos dela-. Aliás, desde a faculdade você sempre soube como se destacar num mar de iguais.

A menção à universidade a fez recuar meio passo. Não porque doía lembrar, mas porque doía admitir que ainda doía.

Os corredores da faculdade voltaram como um filme rápido: Clara correndo atrasada para a aula de economia, os livros pesando na mochila. Enzo encostado na mureta, rindo com amigos arrogantes, mas olhando só pra ela quando achava que ninguém via.

Ele a ensinou a jogar xadrez no jardim da biblioteca. Ela o ensinou a fazer café na máquina velha do grêmio. Entre as risadas, os beijos proibidos, o futuro parecia fácil -até o orgulho, as brigas, a diferença de mundos gritarem mais alto.

Ela saiu antes que ele dissesse fica. Ele deixou que ela fosse embora. E ali estavam de novo, como se nada tivesse mudado e tudo tivesse mudado ao mesmo tempo.

- Não tenho tempo pra revirar o passado -disse Clara, erguendo o queixo-. Vim pedir doações pros projetos da comunidade. Páscoa solidária, cesta de doces... essas coisas que você não entende.

Enzo sorriu de lado. - Me subestima tanto assim?

Clara deu um passo para o lado, mas ele a seguiu, como uma sombra.

- Não tenho nada pra conversar com você, Enzo. Já deixei claro na sua visita à confeitaria.

- Ah, Clarinha... -ele soltou uma risada curta, quase inaudível-. Você acha mesmo que consegue fugir de mim num salão desses?

Ela sentiu o estômago apertar quando ele se inclinou, sussurrando perto do ouvido:

- Aliás, achei... curioso... você estar aqui sem me avisar. Poderia ter me pedido ajuda. Eu teria comprado todos os seus ovos de páscoa, todo o seu chocolate -a voz dele era um veneno doce-. Ou poderia ter pedido um cheque em branco, como muitos aqui fazem.

Clara o empurrou de leve, sentindo o sangue ferver.

- Eu não sou "muitos". E não aceito esmolas de Albuquerque.

Ele riu de novo, recuando meio passo, erguendo as mãos como quem admite derrota - uma derrota que nunca é real, só ensaio para o próximo ataque.

- Então me diga, Clarinha... -ele ergueu o copo de uísque, apontando para a multidão de colarinhos brancos-. Algum deles já assinou o tal cheque pra sua páscoa solidária?

Ela mordeu o lábio, apertando a bolsinha com força. Ele percebeu, claro que percebeu.

- Eu achei -continuou Enzo, a voz mais baixa, quase suave-, que você fosse mais esperta. Pedir esmola pra essa gente rica que ri de você pelas costas? Você vale mais que isso.

- Não finge que me conhece -sussurrou Clara, ferina-. Você não sabe nada de quem eu sou hoje.

- Ah, mas eu sei, Clarinha... -ele se aproximou de novo, tão perto que Clara sentiu o calor subir pela nuca-. Eu sei que você ainda sonha em salvar aquele lugar. Eu sei que você ainda é orgulhosa demais pra admitir que precisa de mim. E eu sei que, no fundo, você ainda lembra.

Ela se obrigou a encará-lo. Tantas lembranças, tantos beijos não ditos, tantos segredos. A vontade de esbofeteá-lo misturava-se com a vontade de puxá-lo pra mais perto. E isso a enfurecia mais que qualquer dívida.

- Se acha que pode me dobrar só porque tem dinheiro, está enganado. -disse ela, entre dentes.

Enzo abaixou o rosto, tão perto que os lábios quase roçaram sua têmpora.

- E se eu não quiser dobrar você? -murmurou-. E se eu quiser... ficar do seu lado?

Clara prendeu a respiração. O salão girava devagar, luzes, flashes, música ao fundo. Ali, tudo parecia parado - só eles dois presos numa bolha de passado e promessas tortas.

Foi quando ouviu a voz de Luísa, chamando seu nome do outro lado do salão. Clara piscou, como se acordasse de um transe. Se afastou de Enzo, respirando fundo.

- Fica longe de mim, Enzo -disse, tentando soar firme-. E do meu negócio.

Ele ergueu a taça, brindando no ar, com aquele sorriso que misturava desafio e desejo.

- Não vai ser tão fácil, Clarinha. Você sabe disso.

Ela não respondeu. Apenas se virou, atravessando o salão, ignorando olhares curiosos, ignorando o aperto no peito.

Sabia que ele tinha razão. Nada seria fácil. Principalmente com Enzo Albuquerque tão perto.

E, por mais que quisesse negar, uma parte dela -teimosa, orgulhosa, ainda ferida-, sabia que a guerra estava apenas começando.

            
            

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